A publicidade da beleza

A indústria da beleza no Brasil cresce ano a ano, sendo o país considerado o quarto maior mercado mundial de cosméticos e cuidados pessoais. Chegou a atingir R$34.718 bilhões em 2020, de acordo com pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Franchising (ABF).

Com as redes sociais e as influencers digitais ganhando força, meninas de todas as idades se deparam 24h por dia com uma variedade imensa de cosméticos, produtos e procedimentos estéticos, desde o preenchimento labial até a lipoaspiração. Essa venda desenfreada de produtos que deixam as mulheres “mais lindas”, acarreta na consequente problematização dos corpos femininos. Ao se olharem no espelho, as mulheres encontram diversos “defeitos” que fogem do padrão divulgado pela imprensa.

Kim Kardashian e sua influência na mídia fez com que o procedimento de lifting de glúteos aumentasse 256% de 2000 para 2018, de acordo com a American Society. Um estudo feito em 2019 na Aesthetic Plastic Surgery constatou que após Kylie Jenner confessar que fez aumento labial em 2015, as pesquisas por preenchimento labial aumentaram 3.233%.

Já no Brasil, Flávia Pavanelli e Virginia Fonseca, ambas influencers digitais, são conhecidas por promoverem um padrão de beleza que só pode ser alcançado através de cirurgias estéticas. Ambas contam com mais de 18 milhões de seguidores no Instagram.

Junto da venda desse ideal de beleza vem a promessa de que a mulher alcançará sucesso, felicidade e amor ao adquirir essa aparência estética impecável. A publicidade passou a exercer um poder sobre as mulheres, reforçando estereótipos e contribuindo para a expansão da indústria dos cosméticos, da dieta e das cirurgias plásticas. A aparência se tornou uma dimensão fundamental na configuração feminina.

(Novo logo e slogan da Clarins 2021, “viva lindamente”)

Mas você já se perguntou quem inventou que as mulheres deveriam modificar seus traços, seus corpos, se esconder atrás de maquiagem e passar por procedimentos que afetam sua saúde mental e física por ordem da beleza?

A CRIAÇÃO DO MITO

 Até a metade do século XX as mulheres eram apenas donas de casa e as revistas femininas cobriam matérias sobre como ser uma boa mãe, uma boa esposa e divulgavam diversos produtos domésticos. Mas com o início da Segunda Guerra Mundial e a necessidade da mão de obra feminina nas fábricas, iniciou-se um novo período na história.

Com o fim da Guerra, as mulheres não quiseram mais voltar para dentro de casa e abdicar da liberdade de conquistar o próprio dinheiro. Por isso, as revistas femininas sofreram uma grande queda de vendas e as mulheres pararam de comprar os produtos domésticos que sustentavam a renda dos anunciantes. A cultura patriarcal e os anunciantes das publicações se depararam com um problema.

A inserção de uma nova ideologia na vida das mulheres se tornou necessária, uma neurose portátil que andaria junto delas no trabalho. Uma cultura de substituição foi criada para evidenciar um “problema” que não existia até então: a indústria do emagrecimento e a do rejuvenescimento ganhou vez. Antes, a mulher não podia parar de ter filhos e cuidar da casa. Hoje, a mulher não pode parar de ser linda.

(Anúncio veiculado no ano de 1957)

As revistas femininas há mais de um século vêm sendo uma das forças mais atuantes no sentido de alterar os papéis das mulheres, e durante todo esse período – hoje mais do que nunca – elas sempre emprestaram charme àquilo que o sistema econômico, seus anunciantes e, durante a guerra, o governo precisavam obter das mulheres naquele momento.” (O Mito da Beleza, p.100)

A indústria passou a investir em matérias que problematizavam o corpo feminino. O rosto e o corpo ideal surgiram e permearam através da mídia. Foram criadas narrativas em filmes, séries e programas, nas quais apenas a mulher “linda” conquista o sucesso e o amor que almeja. A maquiagem e a boa aparência passaram a ser exigidas no trabalho e as mulheres começaram a ser apresentadas umas às outras como rivais.

O tom das publicidades passou a ser intimista, individualista e otimista, dizendo para a mulher que ela deve estar em sua melhor forma e nada deverá impedi-la. Os cosméticos para a pele e corpo foram e continuam sendo vendidos como um ato de amor próprio e cuidado com si mesma.

(Nivea / Reprodução Instagram)
(Jeunesse / Reprodução Instagram)

Mas será que as mulheres precisam gastar tanto em produtos para que se amem e pratiquem o autocuidado?

Hoje, em pleno 2021, quase 40 anos após a criação do mito da beleza, nos deparamos com uma realidade em que cresce (apenas num período de 10 anos) em mais de 141% o número de procedimentos estéticos realizados entre jovens de 13 a 18 anos, segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). Além disso, as mulheres têm 9 vezes mais anorexia e bulimia do que os homens e duas vezes mais compulsão alimentar. 

As mulheres estão cada dia mais insatisfeitas com seus rostos e corpos, comprando mais produtos e procedimentos para que se adequem a esse ideal e cada vez que chegam mais perto, ele muda.

Mas, será que as mulheres precisam mesmo apagar suas expressões e cortar seus corpos em nome da beleza, do sucesso e do amor? Ou será que todos nós devemos de uma vez por todas enxergar que a beleza não passa de um mito e que devemos nos unir e lutar pela liberdade do corpo feminino?!

3 comentários em “A publicidade da beleza

  1. Muito importante esse texto!! Precisamos cada vez mais de lugares para debatermos sobre os padrões estéticos atuais! É muito triste ver que o Brasil está no quarto lugar, mas acho que a conversa e a troca de informações é o início para podermos começar as mudanças e a “naturalizar” todos os corpos. Tem uma frase que li esses dias, que me lembrei lendo a matéria: “ A indústria da beleza depende da gente se sentir infeliz e envergonhada por causa da nossa aparência”.

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