
Não sei se isso fica óbvio só de olhar para a minha pessoa, mas morro de medo de ser alvo de uma crítica. Sei que quase todo mundo sofre com isso, mas no meu caso é um problema seríssimo que ultrapassa todos os limites da possibilidade. Quero que todo ser vivo no planeta pense apenas em coisas positivas sobre mim. A mera ideia de alguém não gostar da minha personalidade faz com que eu queira me esconder em um buraco e nunca mais sair. É por isso que sou tão tímida. Talvez seja por isso que tenho um senso de humor tão aguçado. Sei lá. Toda vez que falo isso para a minha terapeuta ela me diz que nem Jesus era amado por todo mundo. Eu não ligo. Eu quero ser amada por todo mundo.
Não estou sendo exagerada, esse é realmente um dos meus maiores medos. E, por causa disso, tento sempre não mostrar que julgo os outros. Não quero de jeito nenhum que o alvo do meu julgamento fique bravo, ou pior, CHATEADO. Odeio machucar pessoas. Não sei se é porque sou empática ou porque não quero que não gostem de mim.
Não vou mentir e falar que sou um anjo que nunca pensa nada negativo sobre alguém. Aquela mesma terapeuta já me contou que julgo os outros até demais por medo de que me julguem primeiro. Maaaaas faço isso silenciosamente. Eu julgo como se estivesse em uma missão hiper mega secreta do FBI.
Confio em pouquíssimas pessoas para abertamente compartilhar os meus julgamentos. Claro, posso às vezes soltar uns comentários que possam parecer como uma crítica alheia, mas é difícil me encontrar discorrendo com qualquer um sobre o que acho de tal pessoa. Nota: as minhas críticas e as críticas que aceito escutar dos outros são apenas sobre traços de personalidade e ações. Julgamentos da aparência ou história de vida de alguém são péssimos. É babaquice e odeio quem faz isso. Às vezes posso julgar uma escolha de roupa ou outra, mas apenas se estiver muito equivocada.
Voltando para o meu objetivo inicial: me desculpar. Ontem me senti bem maldosa. Não acho que a pessoa percebeu, mas fiquei culpada mesmo assim. Foi um momento bem vilã de um filme adolescente dos anos 2000, sabe? Vou pintar a cena.
Estava com uma amiga, que vou chamar de Z, no shopping. Tínhamos acabado de almoçar. Bom, não sei se almoçar é a palavra certa. Comemos entradinhas e sobremesas enquanto tomávamos Aperol. Depois disso, fomos para a livraria. Saímos as duas com exemplares do mesmo livro da Sally Rooney. Se você conhece as obras dela, vai entender o porquê do nosso julgamento ser tão contraditório.
A única coisa que podíamos fazer após toda essa aventura era tomar café. Ou melhor, mais um café. Já tínhamos tomado um expresso no restaurante, se minha memória não me falha. Conhecendo a gente, com certeza tínhamos tomado um expresso no restaurante. Fomos ao Starbucks.
No momento que chegamos, começou a cair um toró lá fora. Isso não é de nenhuma maneira importante para o pedido de desculpas, eu só gosto muito de chuva. Gosto do barulhinho (barulhão, nesse caso). Em um ato de extrema coragem e bondade com meu estômago, decidi não tomar mais um café. Z não teve o mesmo bom senso e pediu o mais novo drink do menu, Avelã Shaken Expresso. Foi nesse momento que erramos.
Na nossa frente, havia um casal. Já que estou tentando me desculpar aqui, só vou descrever eles como grudentos. No exato mesmo segundo, Z e eu nos olhamos com caras de puro desgosto. Sobrancelhas franzidas e nariz torcido, entende? Até com a máscara no rosto dava para claramente ver a expressão de nojo. Agora que acho importante lembrar que, ao mesmo tempo que isso estava acontecendo, ambas estávamos levando exemplares novinhos em folha de um romance da Sally Rooney na bolsa. Totalmente contraditório.
Bom, expressamos nosso julgamento pelas nossas faces e é isso. Ou melhor, pensei que ia ser só isso. O que não estava esperando é a menina do casal virando para gente alguns segundos depois. Achei que ela havia percebido, talvez sentido, nossa energia negativa. Estava errada. Ela abriu um sorriso que chegava até os seus olhos. Sabe aqueles tão amigáveis que te deixam até desconfortável? Pois é.
Aí, para piorar a situação, ela elogiou os nossos cabelos. A Z tem cabelos loiros avermelhados e eu estava com um penteado igualzinho da Pucca (tentativa falha do penteado da Princesa Leia). Enquanto Z contava que a sua inspiração foi Julia Roberts nos anos 90, começou quase um coro digno de tragédia grega na minha cabeça me chamando de babaca.
Poxa, fiz um olhar de NOJO para menina e ela é fofa comigo sem nenhum motivo. É foda. Me senti como a Regina George falsamente elogiando a saia de alguém. E como o balde de sangue de porco que foi despejado na Carrie bem depois de ela ganhar rainha do baile. E também como o Lando Calrissian quando ele entregou o Han Solo, a Leia e o Luke para o Darth Vader. Foi como se ela tivesse me carregado nas costas por uma colina só para a empurrar ladeira abaixo quando chegássemos no topo. Ou como se ela tivesse feito o trabalho em grupo inteiro sozinho e eu “esquecesse” de colocar o nome dela na hora de entregar para o professor. Péssimo. O que fiz foi péssimo e desnecessário.
E é por isso que venho aqui para pedir desculpas para a menina do casal grudento na fila do Starbucks. Te julguei cedo demais. É o seu namorado que é o cafona da relação, e não você. Espero que encontre o tom de tinta certo para também ter o cabelo da Julia Roberts nos anos 90 com um penteado da Pucca.
Texto maravilhoso e divertido.
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Sei como é me sinto assim também. Aquela arrogância da Grace em Dogville. Ótimo que compartilhou isso com a gente 🙂 leio tudooooooooo
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Caraca, me identifiquei com cada frase. Sinto o mesmo, odeio só de pensar que alguém fale uma vírgula sobre mim. Também me fecho em uma concha em várias situações. Apenas para poucos, mas muito poucos mesmo que eu saio da concha. Será que é a minha desconfiança extrema, ou a minha autoestima zuada? Para talvez me proteger de algo como “aqui não, nem vem que eu não coloco o dedo na sua ferida, sai fora da minha”…Eu não sei…sigo buscando.
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