Frenezi nas Semanas de Moda de Outono Inverno de Paris

Finalizando as coleções da temporada de Outono/Inverno de 2022 entramos na semana de moda de Paris, cidade conhecida por ter o mais extenso e completo calendário. Com mais de oito dias e sendo um epicentro da moda internacional, Paris conta também com as maiores marcas contemporâneas, com os grandes conglomerados de luxo — principalmente LVMH e Kering — apresentando a maioria de suas marcas durante a semana.

O governo francês também não deixa a desejar, impulsionando a moda nacional com o próprio sindicato de Alta-Costura e Moda que monitora e organiza as semanas de moda no país. Paris funciona como um termômetro econômico da temporada, analisando desde dos clientes da moda de luxo até mesmo os eventos que acontecem na cidade durante os dias.

Durante a Paris Fashion Week, a geopolítica internacional se virou para o conflito em território ucraniano, e apesar dos grandes esforços de muitos da moda em tentar parecer sentimentais e contemplativos durante esse período, a semana não foi pausada e os eventos e festas continuaram regularmente. Acredito que das homenagens que aconteceram em Paris, a mais genuína e verdadeira veio de Demna Gvasalia na Balenciaga, falando de sua própria experiência como refugiado de guerra. Depois disso, aqui vamos com a cobertura completa da editoria de Moda da Frenezi com o final das apresentações da temporada de Outono:Inverno 2022.

Você pode encontrar o calendário oficial da Semana de Moda de Outono Inverno de Paris aqui.

Foto retirada do Instagram Oficial de Anthony Vaccarello, diretor criativo da Saint Laurent.

Confira a cobertura completa da Semana de Outono Inverno em Paris:

DIA 1

Off-White, a marca que não reconhece limites criada em 2012 por Virgil Abloh, marcou o início da temporada de Outono/Inverno 22 em Paris. Pouco mais de um mês após a apresentação da última coleção de Abloh para Louis Vuitton, na qual era diretor-criativo, chegou a vez de sua upstart personal label, que agora já não é mais upstart e pode muito bem ser equiparada a gigantes da Couture.

A apresentação que ocorreu na segunda-feira, 28 de fevereiro, na Galeria Lafayette foi a primeira homenagem da marca ao seu criador desde sua repentina morte em novembro do ano passado. Essa também é a última coleção feita e supervisionada por Virgil.

Nomeada ‘Spaceship Earth, an imaginary experience’, a apresentação foi ao mesmo tempo um tributo ao designer, mas também um sneakpeak do que será a Off-White no futuro. A questão e o ar de dúvida surgiram quase que imediatamente após o público saber do trágico falecimento do estilista (nacionalidade). O que será agora? Agora que mais do que nunca marcas e designers precisam estar com os sentidos aguçados para todos e quaisquer acontecimentos, já que a indústria da moda é uma das efêmeras e populares indústrias da atualidade. Entretanto, o desespero e aflição não são sentimentos assim tão desconhecidos, o mesmo aconteceu seguindo a morte do lendário Karl Lagerfeld ou do icônico Alexander McQueen.

A resposta foi nada menos que sorte por Virgil Abloh ser de fato genioso e à frente de todos. A coleção foi desenhada por Abloh e completada pelo seu time criativo e colaboradores, que seguiram um de seus inúmeros inspiring quotes: “Question everything”.

O desfile foi apresentado em dois atos: ready-to-wear e ‘Couture’. O primeiro focado no que a Off-White foi tão famosa por nos seus primeiros passos como marca: o streetwear, mas desta vez com o tom mais ‘adulto’ que Virgil queria alcançar para a marca. O estilo invencível da marca foi combinado com uma alfaiataria elegante e até sóbria, nos padrões Off-White; E o segundo tema, o high fashion que a marca migrou (e ainda migra) para: couture ou streetwear couture.

Na coleção ready-to-wear pudemos ser testemunhas de um incrível jogo de proporções. Highs com lows. O clássico com o nada óbvio. Cargo gears acompanhadas por vestidos de cetim, volumosas saias de tule com camisetas estampadas, alfaiataria elegante, jaquetas de esqui com tons sóbrios, tênis com vestidos de festa…

Entre os modelos e convidados estavam diversas celebridades e amigos pessoais de Virgil: Pharrell Williams e sua família na primeira fileira, a tenista Serena Williams e a DJ Honey Dijon, para citar alguns exemplos. a

Já a segunda parte da coleção, que Virgil começou a desenhar meses após sua ‘aparição surpresa’ na semana de Alta Costura parisiense no ano passado, foi pensada para representar um ‘tipo de mulher’ a cada looks: a noiva (desfilada por Bella Hadid de tênis e saltos na mão); a empresária; a diva ou a skatista (vestindo uma varsity jacket com uma volumosa saia de tule). Misturando referências subculturais ou estampas (“no snitching”) nunca antes pensadas de serem usadas em Couture.

Couture é definitivamente o epítome da moda, mas Virgil parece trazer esse mesmo couture de forma mais descontraída ou até alcançável. Afinal, seu legado teve início quando começou a inspirar gerações e a dizer-lhes ‘tudo é possível’. 

“The ethos of Off-White is it’s not just clothes. My inspiration and motivation is more the humanity level”

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

O segundo dia da semana de moda de Paris começa com mais uma coleção da Dior sob a direção criativa de longa data de Maria Grazia Chiuri. Uma apresentação no Jardin de Tuileries em Paris com uma atmosfera assinada pela artista Mariella Bettineschi na grande instalação da coleção, com porta retratos em todo seu entorno com retratos femininos famosos na arte europeia datando do século XVI até XIX, removendo figuras dos seus contextos originais e todas em preto e branco.

A coleção foi batizada de ‘A próxima era’ com a inspiração bruta sendo como o mundo retrata e se envolve da condição moderna do papel da tecnologia em nossas vidas. Parece anos luz de distância da coleção de Primavera/Verão 2022, qual foi inspirada na Dior na década de 1960, assinada por Marc Bohan entre mini saias vibrantes e cortes retos, homenageando uma característica importante na história da marca.

Apesar do tema desta temporada parecer muito interessante e com diversas formas de ser estruturado, a próxima era parece muito com as antigas coleções de Chiuri para a marca, com um desenvolvimento confuso e até um pouco chulo do tema nas roupas em si. Rendas combinadas com tipos diferentes de armaduras, camisetas com slogans sobre o futuro feminista, apesar de ser uma visão diferente dos outros trabalhos da designer para a Christian Dior, acaba parecendo razo a interpretação do mesmo no desenvolvimento.

“Temos essa ideia de que a tecnologia é algo um pouco irreal”, disse Chiuri para a jornalista Sarah Mower. “Usamos mais a tecnologia para comunicação e pensamos menos em como ela pode nos ajudar a viver melhor. Estamos acostumados a esperá-lo em coisas muito práticas: máquinas de lavar, mas não moda.”

O desenvolvimento da Saint Laurent pela direção criativa de Anthony Vaccarello é uma experiência única de se acompanhar. O designer encontrou uma situação complicada na marca em sua estreia, uma clientela que era fiel demais a seu antecessor criativo, pois Slimane criou não só um cliente mas um estilo de vida para a Saint Laurent, sem contar com um conglomerado por trás com sede das vendas da marca.

Com paciência ele foi entendendo a mulher Saint Laurent aos poucos, trazendo para mesma a sua própria visão criativa para a marca, uma node um pouco mais sensual e uma alfaiataria mais fina e refinada ele foi conquistando seu lugar na marca, e hoje traz seus melhores trabalhos até então.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Se distanciando muito do que o Heidi Slimane apresentava, apreciando a história e os arquivos da própria marca, vemos o Outono/Inverno de 2022 assinado por Vaccarello como uma carta de amor à Alta-Costura de Yves Saint Laurent na década de 1980. Com ombros altos e estruturados e vestidos retos e longos, ele mostra a todos que ninguém faz o chic effortless como a Saint Laurent.

Ternos perfeitamente alinhados, formas de triângulos invertidos, cores sóbrias mas quentes, acessórios grande e prepotentes, tudo isso em conjunto com novas formas de texturas dentro da coleção, de um terno com detalhes em cetim até opulente peles durante toda a coleção — vale lembrar que o grupo Kering baniu as peles verdadeiras de animais — e longos vestidos de festas que inclui transparências segmentadas, assimetria e rouching em diversos pontos.

É uma nova era para a Saint Laurent de Vaccarello, uma que olha para o interior da marca como um todo e faz associações interessantes para o consumidor contemporâneo, ele consegue reviver a musa YSL em sua melhor e mais atual forma a cada temporada.

DIA 2

Intitulada Princípios da Nossa Geometria’, a coleção Outono/Inverno 2022 da Courrèges foi desenvolvida por Nicolas Di Felice (atual diretor criativo da casa) com base nos estudos de André Courrèges (fundador da marca e engenheiro civil) acerca da aerodinâmica. Capas, abas e trench coats unem formas orgânicas à silhuetas exageradas, em modelagens meticulosamente proporcionais. De forma menos literal, o estilo aviador foi explorado na coleção através de jaquetas em shearling, óculos esportivos e amarrações cruzadas, inspiradas em cintos de segurança.

Decotes e recortes geométricos foram os pontos-chave da coleção, que possuía uma sóbria cartela de cores, contrastando com metalizados prateados em acessórios, botas over the knee e pontuais peças de roupa.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Com inspirações — literalmente — nas alturas, Nicolas ‘manteve os pés no chão’, focado em peças usáveis; “fazer roupas para as pessoas é o meu trabalho, não pode ser apenas sobre minhas fantasias”, disse em entrevista concedida para a revista ‘i-D’. Criar peças “reais” também era a principal motivação de Courrèges, que revisitou os arquivos da marca.

O clubwear aparece como um símbolo de liberdade, os cut outs e comprimentos mini são perfeitamente equilibrados por materiais como tricô e alfaiataria, vestindo igualmente em termos de elegância e bom gosto, mulheres de 20 ou 60 anos.

A marca das irmãs Mary-Kate e Ashley Olsen, que costuma apresentar apenas looks em tons sóbrios, trouxe para a temporada de Outono/Inverno uma cartela diversificada, repleta de cores saturadas em peças pontuais — mas ainda assim uma novidade para a The Row, que segue uma linha minimalista.

O mix entre sportswear e alfaiataria, em modelagens oversized e aparentemente despretensiosas, é pensado para a volta ao trabalho presencial, tornando este momento marcante (e de certo modo, angustiante) mais confortável e divertido.

Ao invés de um desfile, Dries Van Noten preencheu uma mansão particular com sua coleção Outono/Inverno; assim, seus convidados puderam apreciar melhor as diferentes texturas de suas peças. O retorno experiencial de Dries, despertou novamente, a sensualidade da marca, perdida durante a pandemia.

O surrealismo setentista dos trabalhos do arquiteto e fotógrafo italiano, Carlo Mollino, serviu de inspiração para as peças ora simples, ora extravagantes. A geometria das peças também atraiu a atenção do público, volumes e formas deram vida às fantasias do designer.

A primeira experiência de Jonny Johansson, designer e fundador da Acne Studios, com a costura, foi ao customizar peças em jeans de seu guarda-roupa, durante a adolescência; esta inspiração foi traduzida pelo patchwork e upcycling. Elementos que o incomodavam, como desfiados, desbotados, bordados florais — grandma style — e amarrações, agora o confortam, afinal, precisou lidar com eles por tempo suficiente para aprender a combiná-los de forma cool.

O futurismo se fez presente através dos tecidos metalizados e do styling distópico (couro + layering + modelagens oversized + aparência destroyed + peças manchadas) e extravagante, mas também, sensual, expressando a essência da marca, em um cenário totalmente branco.

Roupas com estruturas que lembram armaduras, podem ser consideradas a assinatura de Olivier Rousteing, diretor criativo da Balmain. O motivo? O designer sofreu um grave acidente, no ano de 2020, onde teve 80% do seu corpo queimado; Olivier passou por um longo processo de recuperação, necessitando do uso de curativos e equipamentos de proteção, que o mesmo enxergava como armaduras, para enfrentar a luta diária.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

As peças também são associadas à necessidade de sentir-se protegido e confortável diante do momento de fragilidade em que precisou esconder-se, por vergonha (das cicatrizes) e medo do body shaming e tantos outros discursos de ódio, que tomam conta das redes sociais.

A ilusão de ótica criada através das estampas Trompe L’oeil aparece como alerta à dismorfia corporal — um transtorno psicológico que envolve o hiperfoco em uma característica física específica, onde a pessoa tenta a qualquer custo corrigir esse “defeito”, seja através de filtros, Photoshop, ou procedimentos estéticos. Também pode ser interpretada como uma crítica ao Metaverso, vidas ilusórias, que mascaram um descontentamento interno.

Ao longo do desfile, dividido em 3 atos, a estética distópica, com ar militar, finalmente deu lugar à leveza e fluidez dos vestidos de gala, que pareciam vestir verdadeiras deusas, simbolizando a esperança — vale ressaltar que qualquer semelhança com a situação geopolítica atual, é mera coincidência; ainda assim, o designer usou suas redes sociais para demonstrar repúdio a todas as formas de violência e fazer um apelo pela paz.

A estética sexy, poderosa e brilhante da marca foi adaptada ao estilo esportivo através de elementos do futebol americano e do motocrosssempre à la Balmain

O futurismo esteve presente nos mais de 100 looks da coleção, que apesar de extensa, foi bastante coesa; Olivier conseguiu, com maestria, equilibrar materiais delicados — como plumas e rendas — a um estilo pesado e desconstruído.

DIA 3

Com mais de 71.7 milhões de visualizações a trend ‘Euphoria High School’, no TikTok, brinca com os figurinos um tanto quanto ousados para ir à escola dos personagens da série. Vestidos com recortes, roupas curtas e maquiagem e cabelo impecáveis são alguns dos looks escolhidos por personagens como Maddy e Cassie — e que são reproduzidos de brincadeira pelos usuários após um corte no vídeo, que marca o momento de transição de um look “normal” para ir à escola para um look “euphorico”.

Mas e se essa brincadeira se tornasse realidade? Arnaud Vaillant e Sébastien Meyer, dupla à frente da Coperni, parecem ter atingido este feito com a coleção de Inverno 2022, apresentada ontem em Paris. Em um cenário repleto de lockers escolares, a trilha sonora anunciava o início do desfile após um sinal de recreio: “o sol está brilhando no campus da Coperni High. Estamos prontos para começar agora, aumentem os volumes.”

Não demorou muito para que um casting de peso — composto por nomes como Bella Hadid, Gigi Hadid e Lila Moss — começasse a desfilar as peças da marca: maxi casacos de pêlo colorido e mini saias com fendas e aplicações de ilhós foram algumas delas.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A coleção tem como base uma alfaiataria desconstruída tanto a partir de recortes quanto na extensão da própria modelagem. Alguns blazers ganham capuz e criam um visual à la Aläia, enquanto outros fazem parte de conjuntinhos em que o cinto é na verdade utilizado na barra do top, e não na da saia. Já os trench coats recebem recortes laterais e são torcidos no centro-frente, criando um visual contemporâneo e casual ao mesmo tempo.

Mas o destaque mesmo fica por conta dos vestidos O look 30, um modelo azul bebê com recortes vestido por Lila Moss, poderia perfeitamente ter saído direto do armário de Maddy Perez. Já os cinco últimos do line up, confeccionados em tecidos fluidos e decorados com flores no mesmo material, traduzem com maestria o DNA parisian-easy-chic da marca. Em um jogo de texturas, decotes e drapeados mil, é assim que a garota Coperni decide ir à escola.

Em outubro do ano passado a Chloé foi a primeira marca de luxo a conquistar um selo B-corp de sustentabilidade, que garante que a empresa tem impacto socioambiental positivo. Sendo assim, à primeira vista, a quantidade de peças em couro do Inverno 2022 da marca podem assustar. Mas Gabriella Hearst, diretora criativa da marca, explica: “Para mim o couro é um subproduto da indústria da carne. Então, desde que você saiba de onde ele vem e como é tratado, você está utilizando lixo.”.

Vestidos com mangas bufantes, calças em corte de alfaiataria e trench coats são algumas das peças confeccionadas no material, que dessa vez aparece mais envelhecido que em outras estações. A apresentação é, no geral, mais limpa e bem editada, com looks formais e bastante alfaiataria tradicional. Os clássicos ponchos e suéteres coloridos da designer também marcaram presença, desta vez com estampas de paisagens formadas através do entrelaçamento dos fios.

Um mini vestido de couro em estampa de cobra com aberturas laterais: esse foi o modelo escolhido por Bruna Marquezine direto das passarelas de Outono 2022 de Ludovic de Saint Sernin para curtir uma noite de balada em Paris. A coleção foi talvez uma das mais básicas do estilista, que é conhecido por seus designs super sexys e repletos de cristais.

Ludovic quis reinterpretar e explorar os códigos do daywear nesta temporada, produzindo maxi suéteres de tricô, camisas oversized e saias longas em linho. Vestidos longos e fluidos e conjuntos de saia e blusa em malha também marcam a apresentação e reforçam o caráter menos experimental da coleção.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Rick Owens já é, naturalmente, um designer que falava sobre o fim do mundo e estéticas distópicas muito antes da pandemia e da popularização deste tema. Roupas rasgadas, paleta de cores mais sóbria e silhueta oversized já se tornaram clássicos do estilista, que geralmente apresenta suas coleções com efeitos especiais de luz e fumaça.

Mas, surpreendentemente, sua temporada foge dessa estética: vestidos longos em paetê, silhuetas mais justas ao corpo e o uso de cores mostra que Owens, nesta temporada, parecia estar mais otimista. “Durante tempos sombrios, a beleza pode ser uma das maneiras de manter a fé” declarou o estilista, explicando que a apresentação é sim um respiro em meio ao caos que o mundo e principalmente a Europa vem vivendo.

“Eu quis fazer algo super evidente e super confortável, fácil de vestir e sexy sem esforços. Ela é bem discreta e ao mesmo tempo super poderosa.” declarou Isabel Marant sobre o seu Inverno de 2022. As apresentações da designer são um ótimo momento para prestarmos atenção nas futuras tendências da temporada e em como o público irá incorporá-las, já que Isabel é conhecida por fazer uma moda mais para o dia-a-dia e focada no vestuário em si.

Sendo assim, as botas over-the-knee e maxi suéters serão com certeza peças-hit da temporada — assim como a brincadeira de misturar peças mais arrumadas com outras em linguagem esportiva. Em um lineup ultra colorido já clássico, a designer deixou claro que, acima de tudo, o conforto persiste como tendência em tempos pandêmicos.

DIA 4

No dia 4 de março, Issey Miyake apresentou uma coleção de Outono/Inverno 2022 em Paris que celebra e destaca a beleza da natureza, “Esta coleção é inspirada em plantas – e principalmente vegetais”, disse Satoshi Kondo. Nomeada de ‘Sow It and Let It Grow’, a paleta de cores foi inspirada em cores reais de frutas e legumes. Os looks da coleção são animados e exploram o crescimento de texturas em tecidos, cores fortes e silhuetas irregulares.

Nina Ricci é conhecida por seus famosos perfumes. Contudo, desde a saída dos diretores-criativos Lisi Herrebrugh e Rushemy Botter, Nana Baehr desenvolveu para essa coleção de outono-inverno 2022 looks para a nova mulher da marca. Resgataram arquivos e estéticas da marca com looks de peças ‘simples’ com muita extravagância. Estampas diversificadas, sem recorrer ao arquétipo floral, mas com flores em spray como camuflagem. A tradição de alfaiataria da casa foi desenvolvida com materiais tecnológicos, como nylon acolchoado. Um pequeno vestido preto tinha um tecido de tule no corpete que era pura extravagância. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Yohji Yamamoto desenvolveu para sua coleção de outono inverno 2022 looks que inicialmente começaram com jeans e foram levados até o fim do desfile como grande destaque, seja cortado, drapeados ou assimétricos. Os looks jeans fizeram parte de looks inteiros e também como peças únicas como terceira peça. Não é dessa temporada que as jaquetas puffers tem aparecido, dessa vez, eram jaquetas oversized com mangas grandes. Muitos looks tiveram a participação de camisas brancas de algodão, que de início eram destaque que depois foram apenas parte de outras composições. A alfaiataria de Yamamoto chegou de forma expressiva, desconstruída e todas diferentes. 

VTMNS é um projeto de Guram Gvasalia, irmão do diretor criativo da Balenciaga – Demna Gvasalia, ramificado da marca Vetements. O primeiro desfile da marca aconteceu nesta temporada de outono-inverno 2022. Gvasalia desenvolveu uma coleção streetwear com uma alfaiataria despojada e com um logo incomum, mas que reflete a personalidade do diretor criativo: um código de barras. Jaqueta, jeans, agasalhos puffers completavam a coleção do projeto. O streetwear é uma característica forte da família Gvasalia, Guram não apresentou indícios de que sairia longe deste caminho. 

Por mais que muitos da indústria da moda nessas últimas semanas não tenham reagido de maneira significativa a respeito dos recentes acontecimentos como a Guerra na Ucrânia, o desfile teve um minuto de silêncio a todas as vítimas afetadas pela guerra. Para essa coleção de outono- inverno 2022, Marine Serre, diretora-criativa da marca, desenvolveu uma coleção upcycling como de costume. Contudo, não apresentou a estética de logomania de meia lua como tem estado presente em todas as últimas coleções da marca. 

A coleção faz parte do projeto Hard Drive da marca, e fica em exibição nos dias 5 e 06/03 no centro de artes Lafayette Anticipations, em Paris. Na loja criada para a exibição, os visitantes podem trazer qualquer material de tecido e customizá-lo com o famoso logo clássico da marca, uma meia lua. Parte das vendas será destinada à ong Médicos Sem Fronteira para os refugiados da Ucrânia.

A diretora criativa optou por trazer diferentes estéticas na coleção. Uma delas, que tem estado muito presente nas semanas de moda, é a punk rock. O xadrez vermelho com preto esteve fortemente presente em looks como saias, casacos e em cachecóis azuis e pretos. Outra, foi o patchwork que é o upcycling que Marine sempre faz questão de inserir em suas coleções. Um trabalho manual e sustentável feito através de retalhos de tecido em diversos formatos e cores, foi desfilado com a inserção de diferentes cores, logos e frases, representada em um vestido longo com luvas em calças e casacos. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Trench coats e casacos de frio com pelos na gola e manga em couro azul com duas cores de azul, o marinho e um mais claro. Além de, recortes quadrados em tons de azul e marrom. O famoso hippie chic com toque refinado veio em tons terrosos e em estampas astrólogas, uma estética apurada e um ar romântico, mas não jovial. 

Marine sempre faz questão de reforçar a importância de seus discursos ambientais e comportamentais, como o uso de  tecidos reciclados ou técnicas de upcycling, destacando o compromisso com a sustentabilidade. Marine pensa em cenários apocalípticos para a construção das peças, como guerras climáticas, civilizações ameaçadoras e extinção em massa. 

A marca tem crescido e se destacado mostrando sua capacidade na indústria. Apesar de seu logo de meia lua não ter estado presente nesta coleção, outros já familiarizados foram vistos, como astrológicos. Marine tem conquistado fortemente fãs da moda e artistas da cultura pop. Ela faz seus designs com naturalidade e de forma orgânica, e sua trajetória parece estar bem encaminhada. 

J.W Anderson desenvolveu para a coleção de outono-inverno 2022 da Loewe formas de automóveis delineadas em bainhas de vestidos, sapatos de salto alto sob camadas transparentes de malha, além da tendência de tecidos transparentes. 

O designer apresentou uma estética surrealista, facilmente referencial a Salvador Dalí, René Magritte ou a própria estilista surrealista original, Elsa Schiaparelli, com looks de lábios em contorno dos braços e mãos e na frente dos vestidos. Anderson se concentrou em roupas mais simplistas. Continuou experimentando linhas e formas volumosas (ambas vistas em temporadas passadas na Loewe e em sua marca homônima, J.W. Anderson). Suéteres com golas circulares levantadas como travesseiros e cardigãs esvoaçantes com mangas acolchoadas estavam presentes nesta coleção. 

Anderson mencionou que ele também estava olhando para a arte feminista. Havia referências à surrealista Meret Oppenheim e Lynda Benglis. Uma série de squashes de Anthea Hamilton foi apresentada ao público no show. O escultor e o diretor criativo já se reuniram nas apresentações de arte de Hamilton na Tate. 

A paleta de cor dos looks eram mínimas. Tom sobre tom e tons terrosos, nada muito estampado e colorido. Como indica o comunicado de imprensa que acompanhou o desfile, esta coleção foi concebida para destacar uma ‘moda que provoca uma reação, despida de primitivismo cru com emoção e fantasia’. De fato, é difícil não ver a dimensão sensual na coleção do designer: como as leggings de látex, tweed, seda e malha foram combinados; às peças-chave foram vestidos de couro moldado, tops de látex que revelavam os seios das modelos, jaquetas enroladas no pescoço ou na cintura e outras peças reveladoras. 

Anderson sabe fazer looks ousados e que realçam o lado sexy e exuberante da mulher. Dessa vez não foi diferente. O toque surrealista incorporou suas criações gerando ainda mais desejo e valor.

DIA 5 

Desde a saída de Alber Elbaz, Lanvin enfrentou crises estruturais e financeiras no mercado de moda, e desde a nomeação de Bruno Sialelli, que tem se mantido no cargo há 3 anos, o destino aparenta estar sorrindo novamente para a maison francesa, fundada por Jeanne Lanvin.

A temática dos anos loucos de 1920 e do Art Deco parece ter sido o ponto de partida para um grande número de designers durante a temporada de Outono/Inverno 2022 e com Bruno Sialelli, diretor criativo da Lanvin, não foi diferente.

O designer francês revisitou os arquivos antigos da fundadora da marca, que viveu de fato nesse período, como fonte de estudos durante seu processo criativo. “Há algo nesses momentos entreguerras que parece preocupante, mas otimista ao mesmo tempo, mas são estes os momentos em que nossa criatividade e cultura devem levantar suas propostas de ideais como um ‘remédio’ para essas preocupações”, disse Sialelli.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A coleção foi apresentada em formato digital como um filme de art noir, justamente com o objetivo de ambientar os espectadores nessa temática dos anos de 1920. Sialelli teve uma atenção muito focada em traduzir as silhuetas da época para um consumidor contemporâneo. O designer focou nas silhuetas em linha ‘Í’ resgatando as roupas de formas secas tão características da época, “silhuetas do passado ao presente” de acordo com o próprio designer.

Peças em veludo molhado, rendas, vestidos bordados com miçangas, looks com muita transparência com telas de tule e a transição de uma silhueta mais seca para silhuetas mais volumosas ao final do desfile, mostraram bem a interpretação da moda do período entreguerras para uma linguagem mais contemporânea e não necessariamente literal.

A cartela de cores da coleção contou com tons de azul, rosa, vermelho, amarelo, nudes e preto; que circulavam entre os looks em peças lisas ou em estampas de motivos geométricos, motivos inspirados na fascinação de Jeanne Lanvin pelas formas do Egito Antigo, como as esfinges.

Logo próximo ao final do tempo de passarela, o francês introduziu looks que exploravam os babados e os tecidos telados, esmiuçando o potencial de textura e o efeito volumoso que estes causam nas formas finais das peças.

Com a direção criativa de Bruno Sialelli, a Lanvin gradualmente retorna aos seus tempos de glória sob os holofotes da moda de luxo. As impressões do designer combinadas com o histórico da marca com certeza dão motivos suficientes para acompanhar com maior atenção o trabalho da marca nas próximas temporadas de moda.

Andreas Kronthaler mergulhou sua criatividade no universo do teatro ao desenvolver a coleção de Outono/Inverno 2022 para Vivienne Westwood. O parceiro de vida e de trabalho de Vivienne Westwood deixou emergir sua ‘musa particular’ durante a apresentação e teve como maior objetivo ser fiel a si mesmo. “Sempre fiz as coisas com ela [Vivienne Westwood] em mente….. e isso sempre me colocou em crise e percebi que não, você deve achar a ‘musa’ de inspiração em você e ser verdadeiro consigo mesmo”, disse Kronthaler.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A maior parte da coleção pode ser descrita por um só adjetivo: leveza. As formas de Kronthaler e os materiais escolhidos pelo designer austríaco denotam uma leveza que nada contra a correnteza de corpetes modeladores tão familiares à marca de Westwood. Tecidos acetinados, lamê, plumas, e malhas de moletom tiveram a responsabilidade de trabalhar essa sensação de suavidade das peças.

Inspirado pelo universo teatral, Kronthaler desenvolveu uma infinidade de estampas e toda essa mistura reflete esse mundo fantasioso e criativo dos palcos de teatro, além da estética nômade e multicultural imprimida nesses motivos, arriscando trabalhar vários signos ao longo da coleção.

O trabalho de alfaiataria continuou sendo o ponto forte de Andreas e esse esforço do designer é explorado ao longo da apresentação. A variedade de símbolos clássicos da marca em conjunto com a “nova” e livre estética de Kronthaler revela uma confiança mútua entre os designers que lideram a direção criativa de Westwood, em parceria. 

Ao contrário de outros públicos, o consumidor Hermès busca sempre por um produto impecavelmente bem feito em detrimento de um artigo ou peça que siga as tendências da temporada. É por isso que, desde que assumiu a direção criativa da marca em 2014, Nadège Vanhee-Cybulski entrega coleções cujo tema central são sempre as roupas e a qualidade dos produtos.

Seu Inverno 2022 então não poderia ser diferente: em uma cartela de cores minimalista (um clássico de Nadège) a estilista desfilou peças clássicas que exalam elegância e um luxo discreto que é a cara da Hermés. Saias plissadas em couro, macaquinhos e macacões em malha firme e casacos em cortes e aplicações impecáveis são alguns exemplos.

Nadège ainda, como de costume, traz referências do universo equestre para as passarelas em razão do histórico da marca: mini vestidos em matelassê com enchimento fino, fivelas clássicas e abas em formato de selaria são as mais visíveis. Para equilibrar e tornar a coleção contemporânea, ela adiciona toques de sexy nunca vistos antes em seu trabalho para a casa, como a transparência de algumas camisas e o encurtamento dos shorts e saias.

Dois anos após a mega explosão que assolou a população libanesa de Beirute em 2020, Elie Saab decide voltar às passarelas físicas e reviver sua marca para os olhares presenciais de seus consumidores e admiradores, mesmo ainda se recuperando da tragédia que afetou seu lar e seu ateliê. O inverno 2022 de Saab é direcionado inegavelmente para mulheres com força e autenticidade. “É sobre mulheres fortes, com um forte caráter e um pouco de rock n’ roll”, disse o designer libanês.  

Saab traduz toda sua expertise em vestidos de alta costura para uma temporada ready-to-wear. Vestidos de noite recheados de elegância e glamour, com acabamento em bordados de paetês, muita renda, bordados de cristais, plumas que por si só já requerem um olhar especial de observação. A alfaiataria de Saab também ganhou sem momento de destaque na passarela, em formato de blazers bem cortados com ombros avantajados e  calças cigarretes;  além disso as peças em veludo, couro e tules esvoaçantes terminaram por revelar o guarda-roupa dessa mulher forte de Saab

Vencedor do prêmio LVMH de 2018, o estilista coreano Rokh Hwang comanda sua marca própria desde 2019. Discípulo e ex-aluno de Louise Wilson, prestigiosa professora da CSM que guiou nomes como Mcqueen e Kane, Rokh possui um trabalho que mescla desconstrução e jogo de texturas.

Sua estética particular e talento o fazem um dos nomes mais interessantes de se acompanhar atualmente – e sua coleção de inverno de 2022 prova isso. De conjuntos de alfaiataria envoltos por cintos de couro até trench coats em vinil azul royal, Rok entrega uma coleção que mais uma vez reforça seu design disruptivo e elegante ao mesmo tempo. O grande diferencial das peças de Rokh parece ser justamente o equilíbrio entre experimentação e usabilidade, que rende assim peças fashionistas e formais na medida certa.

O Inverno de 2022 de Ann Demeulemeester se manteve fiel às suas origens e traz à tona na passarela a estação fria para os góticos, boêmios e melancólicos de plantão. Apresentada no Réfectoire des Cordeliers a coleção sob não estava tão distante de suas raízes e nem de sua criadora em termos de distância física, a própria Ann Demeulemeester garantiu sua presença na plateia do desfile, após sua saída da marca de nome homônimo em 2013.

Longas casacos, vestidos e coletes de uma alfaiataria bem cortada, foram se repetindo constantemente do início ao fim da passarela. Peças sóbrias e secas de gola V em diferentes materiais como o crepe e o couro, que ganhou destaque por reviver a identidade gótica de Demeulemeester. Pequenas aparições de bordados com miçangas pretas tiveram seu momento no vasto mar de looks pretos e cinzas, que surgiram no decorrer de uma discreta graduação ao passo que o desfile avançava. 

DIA 6

A mais recente apresentação de Demna Gvasalia para Balenciaga foi um tributo direto para o conflito que ainda continua entre Rússia e Ucrânia. Demna que já sentiu na pele o que é ter que sair de seu país natal e se tornar um ‘refugiado para sempre’, dedicou este show à bravura, resistência e a vitória da paz e do amor. 

Essa apresentação se mostra de longe a mais pessoal e tocante para o estilista. Nascido na Geórgia — um país na intersecção entre a Europa e a Ásia — Gvasalia fugiu de seu país durante uma guerra civil e lembrou que ‘um fashion week (nas condições atuais) parece uma absurdidade e em tempos como esse, a moda perde sua relevância’. Apesar de ter sido assombrado por espíritos e traumas passados, Gvasalia não cedeu e prosseguiu com seu show, que se mostrou afinal de conta extremamente necessário e relevante. 

Num palco 360° isolado por uma redoma de vidro, os modelos desfilavam contra uma tempestade de neve e vento. Fazendo críticas ao aquecimento global, a guerra na Ucrânia e também, ao desperdício e a negligência a bens materiais — vide os convites aos convocados para o show, era um velho iPhone 6s, quebrado, que não funcionava, esquecido e desprezado. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Também aos convidados, foram dadas no total 525 camisetas com as cores da bandeira da Ucrânia, posicionadas nos assentos juntamente com uma declaração pessoal escrita pelo próprio designer. 

A coleção seguia uma paleta de cores sóbrias: preto, cinza e marrom, com toques de branco, estampas florais e seguido pelas cores amarelo e azul. A silhueta arrojada e forte — uma marca já registrada de Demna — fez sua aparição, tracksuits, jaquetas bomber, macacões, moletons, couro e jeans. A coleção parece ter sido criada por ‘peças staples’, ou essências, acompanhadas das bolsas que lembravam sacos de lixo — seria mais uma crítica ao consumo e ao desperdício? — os vestidos que se fundiam com luvas e leggings e sapatos. 

Ao final, o show foi menos sobre as roupas em si, mas sim a poderosa alusão criada e a mensagem que era transmitida. “De algum modo, moda não importa agora nesse momento, para mim” declarou Gvasalia, “Pessoalmente, eu já sacrifiquei muito por guerras. Essa última semana tem trazido de volta todas as memórias que eu e minha mãe colocamos de lado numa caixa e nunca mais olhamos. Nós nunca superamos.” 

Think pink! Pierpaolo Piccioli tomou um gesto radical em sua última coleção para a maison Valentino, desfilada hoje, 6.  Apesar da íntima relação da grife com a cor vermelha — Red Valentino é inconfundivelmente a marca registrada da maison, Valentino Garavani tinha uma profunda afeição pela cor e a usou para distinguir a mulher normal da ‘mulher Valentino’. 

Agora, no entanto, testemunhamos a nova coleção intitulada Pink PP, inteiramente na cor rosa — acompanhada de algumas singelas interrupções de um preto profundo. 

Buscando as possibilidades envoltas na cor rosa, o mais recente show da Valentino não deixou nada que não fosse ‘Valentino pink’, desde a passarela, as paredes, até as roupas e as ‘Valentino muses’ — Zendaya usava um look cor de rosa dos pés a cabeça enquanto acompanhava o desfile da primeira fileira.  

As capas e luvas sempre marcantes nas apresentações estavam presente, vestidos curtos e longos que brincavam com diferentes cortes ou aplicações, decotes em onda, transparência, alfaiataria (sempre) precisa, longos de festa, lantejoulas, casacos oversized…  Por trás dessa coleção quase monocromática, salvo os looks em preto, Piccioli declarou que desse modo ‘as atenções poderiam ser voltadas no seu trabalho com diferentes tipos de tecidos, aplicações e bordados, silhuetas, cortes estratégicos’. Ou seja, sem a ‘distração’ das cores somos forçados a perceber as texturas, os materiais e as superfícies. Um trabalho de reflexão que Pierpaolo propôs ao seu público e, mesmo fugindo do tradicional, conseguiu cativar a atenção e deixar a cor rosa ainda mais viva em nossas mentes.

Kenneth Ize definitivamente tem um novo look para chamar de seu: o aso oke. O tecido ‘aso oke’ usado pelo designer nigeriano, no qual Naomi Campbell fechou o desfile no debut do diretor criativo em Paris (antes da pandemia), agora é oficialmente o centro das atenções das coleções de Ize. 

Trata-se de um material tradicional da Nigéria no qual Ize usa e reusa cores mas mantém as inconfundíveis listras. Na sua passarela vimos inúmeras variações do asooke: terno com saia, jaquetas de zíper, tricô, blazer e calças. 

A coleção que foi desenhada em Nova York traz muitas referências da cidade como ‘Taxi Driver’ ou a ‘vibe 70′ s’ que a cidade um dia já carregou. E que também fez uso de tecidos e materiais reciclados. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

O designer vem cada vez mais se elevando e trazendo identidade para a marca. Com suas silhuetas elegantes, longínquas e, por vezes, alegre — vide a estampa aso oke. De uma forma eclética e despretensiosa, Kenneth Ize vem nos mostrando seu caminho de como ganhar os holofotes e as atenções.

Matthew Williams vem ainda pavimentando sua identidade e visão para a Givenchy— visão a qual torna a Givenchy mais para a frente, franca e honesta. O interesse de Williams em sua nova coleção para outono-inverno ready-to-wear era realmente ‘criar roupas que as pessoas fossem usar e a facilidade disso’. 

Focado, principalmente, numa pegada streetwear, Matthew usou suas cores predominantes: preto e verde escuro. As consequências dessa inspiração no streetwear foram: muita sobreposição, logos e moletom com estampas gráficas, tracksuits, peças ‘baggy’. 

Williams, que era anteriormente diretor criativo no ramo musical, trouxe essas ‘raízes’ para seus shows como head-designer. Desde a passarela e o trabalho de luzes LED à soundtrack do desfile. 

Matthew descreve seu trabalho na Givenchy como ‘muito instintivo e presente’. Espelhando a cultura do dia a dia num muito mais elevado nível na passarela. No entanto, sem esquecer as origens da marca: Williams, como inspiração, fez inúmeras menções para os ‘arquivos’ da grife francesa e trouxe isso na sua nova coleção.

DIA 7

Ao som de ‘Give Peace a Chance’ de John Lennon e Paul McCartney acompanhada do discurso pacifista ‘A Strategy for Peace’ de John F. Kennedy, a coleção de Outono/Inverno 2022 de Stella McCartney abre espaço para a conscientização e para se posicionar em prol da população ucraniana que vem sofrendo ataques de guerra do governo russo nos últimos dias.

Stella McCartney se reuniu em parceria com o artista plástico Frank Stella durante o planejamento da coleção. Stella e McCartney trabalharam lado a lado principalmente no que diz respeito às silhuetas e estampas desenvolvidas para a passarela. “Amo o maximalismo e o minimalismo dele [Frank Stella]. É um paralelo para nossa marca: o lado masculino simples em conjunto com um lado mais explosivo. Quando você observa o trabalho de Frank, ele realmente acompanha isso muito bem”, disse a estilista britânica.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Como era de se esperar, McCartney continua a aumentar seu acervo com looks provenientes de materiais ‘eco-friendly’, que dialogam com seu discurso sustentável. Peças em algodão orgânico, nylon reciclado, lã regenerativa, lãs RWS de fontes rastreáveis foram alguns dos insumos usados pela estilista nesta temporada. Por outro lado, seu verdadeiro protagonista foram os restos de cascas de uvas transformadas em couro falso.

A parceria entre McCartney e Stella foi um harmonioso casamento de traçados e criações, onde os motivos e linhas de Frank Stella dançavam e pulavam de peça em peça, entre os conjuntos de alfaiataria, os vestidos de malha de elastano e os acessórios de Stella McCartney.

McCartney não se limitou somente em trabalhar com materiais novos para sua marca, mas também se aventurou com pares de jeans desbotados, camurça e pele falsa, tecidos acetinados em um cartela comum, mas forte na forma como a estilista a disponibilizou ao longo da passarela. Tons de roxo, laranjas e marrons terrosos, vermelho vinho, amarelo mostarda, tons azulados e muito preto fizeram parte do Inverno da designer.

Em mais uma coleção Stella McCartney não deixa de mostrar aos seus contemporâneos que é sim possível planejar e criar um raciocínio de moda ética baseado na clareza das suas fontes de materiais e em um produto final de sofisticação e qualidade.

Ao celebrar o seu retorno à Paris e às passarelas, Chitose Abe alavanca o patamar de sua marca nessa coleção e foca em entregar ao seu consumidor produtos que carregam sua assinatura mas com o máximo de sofisticação possível. As famosas combinações imprevisíveis de Sacai volta junto aos desfiles presenciais, mas com uma linguagem mais extravagante e festiva para essa temporada de Outono/Inverno 2022.

A silhueta oversized foi mais uma vez a palavra de ordem na mente da designer japonesa durante seu processo criativo. Saias volumosas com cós em acabamento de elastano, jaquetas esportivas de nylon encapuzadas, trench coats e blazers transformados em vestidos, casacos de pele e couro terminam por acentuar a imagem de poder e força dessa consumidora de Abe que necessita de novos looks para os eventos pós pandemia. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Mesmo com um cartela limitada, Abe soube explorar todas as possibilidades de combinações entre o vermelho vinho, o vermelho amaranto, preto, branco, os beges, além disso as estampas de risca de giz e de onça pintada souberam usar seu tempo de passarela com muita sabedoria para quebrar as sequências de peças lisas que dominaram a apresentação. 

Juventude foi a premissa do desfile de Outono/Inverno 2022 da Louis Vuitton nesta temporada. Com uma coleção inteiramente influenciada pelas manifestações juvenis atuais, não só o streetstyle mas também as redes sociais, Nicholas Ghesquière trabalha simultaneamente as estéticas da sua adolescência e os estilos de hoje. 

Movido pelas suas observações dos jovens de hoje e como eles se comunicam via TikTok, Instagram, seus ídolos, e estilos; Ghesquière aproveitou a volta da estética dos anos de 1990 e dos anos 2000 e reinterpreta esse estilo preppy escolar misturado com referências do grunge e dos skateboarders para uma nova leva de consumidores da moda de luxo.

O desfile da Louis Vuitton ocorreu no interior do Musée D’Orsay, tornando-se a primeira marca a conseguir permissão para desfilar sua coleção num dos museus mais respeitados do mundo em termos de arquivos de Belas Artes.

Focado em captar a fase transformadora da juventude, a passagem da vida infantil para a adulta, Nicholas Ghesquière compilou vários signos e estilos que um jovem em período de transição e liberdade estaria disposto a testar para se descobrir. “A coleção é uma verdadeira excursão a um momento perceptível, fugaz e decisivo em que tudo vem à tona, em toda sua inocência e perspicácia. A impermanência e a bela volatilidade da adolescencia”, disse o designer francês. 

O ápice dos designs de Ghesquière nessa temporada foi, sem sombra de dúvidas, o seu foco na alfaiataria. Calças estilo ‘Annie Hall’, camisas sociais, gravatas, blazers e casacos oversized ‘boyfriend’, e a androginia presente nas combinações foi extremamente forte nessa coleção. Além disso, as camisas esportivas de rugby, calças e botas de cano longo de couro e as camisas polo com a impressão gráfica de um retrato do fotógrafo de moda David Sims, dão o toque final nessa excursão de novas descobertas pelo seu próprio estilo que o jovem de Ghesquière passa. 

Ao sair um pouco dessa androginia, Ghesquière trabalha a feminilidade na coleção por meio de formas que lembram as silhuetas das crinolinas – armação que aumentava o quadril da mulher nos vestidos do século XIX – em vestidos de tweeds bordados. Nos suéteres, camisas e vestidos, com o intuito de se aproximar ainda mais da realidade jovem, o designer implementa uma mistura psicodélica de motivos localizados gráficos em padronagens também figurativas.

Na tentativa de se aproximar dessa nova leva de consumidores jovens, a Louis Vuitton sob a direção de Nicholas Ghesquière ao lado Virgil Abloh, que estava responsável pela linha masculina da marca até seu abrupto falecimento no ano passado, tem lançado coleções que sabe se comunicar comercialmente com esse novos consumidores e atingir esse objetivo. O mergulho de Ghesquière nas inconstâncias da juventude logo logo vai comprovar mais uma vez a maestria com que a Louis Vuitton sabe se comunicar com os fashionistas da Geração Z.

Inspirado pela moda dos anos 60, Giambattista Valli revela o lado mais ousado e rebelde de sua consumidora na coleção de Outono/Inverno 2022. Valli se deixou levar pela autoconfiança da mulher parisiense e isso transpareceu em seus looks. “As mulheres aqui são muito feministas, são muito complexas. Elas não se importam com nenhuma crítica. Elas só querem ser elas mesmas e é isso que eu amo sobre as mulheres francesas. Elas são muito livres, muito fiéis a si mesmas”, afirmou o designer italiano.

Logo de cara os espectadores do desfiles foram seduzidos pela silhueta de linha ‘trapézio’ e as mini saias clássicas dos anos de 1960, com peças em branco e grandes óculos redondos, também característicos da época, revivendo o período do Space Age. No decorrer da passarela, Valli aos poucos trabalhava em alternância os códigos tão característicos de sua assinatura com os ícones da Era dos Beatles; como os casacos de inverno de gola alta, botas de cano alto de couro, vestidos em tule e renda e recheados de babados, muitos laços e estampas florais. 

Além das referências florais, Valli trabalha com as estampas de motivos de ‘pois’ e o animal print em sobretudos longos, vestidos curtos e minissaias Os tons de branco e off white, o preto brilhante e o fosco, os azul Tiffany, os rosas e vermelhos conseguiram de maneira sucinta equilibrar a mensagem final do Inverno 2022 de Valli, a mensagem de que seu trabalho se destina e presta homenagem às mulheres autênticas e seguras de sua feminilidade acima de tudo. 

Assim como todos os profissionais da indústria da moda e do mundo, Olivier Theyskens foi profundamente influenciado pela pandemia da COVID-19 e sua coleção de Outono/Inverno 2022 é um honesto reflexo dessa influência. Além de uma mudança em seu olhar criativo, Theyskens parece ter reestruturado toda sua cadeia produtiva e seu raciocínio de negócios. “O que aconteceu no mundo é tão importante que eu realmente queria redimensionar o meu negócio”, afirma Theyskens. 

Theyskens decide abandonar todo o padrão de negócios de costume das marcas e segue em direção a uma reestruturação livres de pressões e regras corporativas por um crescimento sem precedentes que visa somente o lucro.  O designer belga orquestrou toda sua coleção ‘à moda antiga’, a partir de um trabalho minucioso da combinação de retalhos têxteis e patchwork, Theyskens teve como resultado uma coleção etérea, cheia de espírito e um convite ao passado. 

Looks cortados no viés, combinações e maquetes têxteis que misturavam vários tecidos ricos em motivos, como o crochê e as muitas rendas de diferentes padronagens cortadas no fio reto. O belga continuou a trabalhar com uma paleta reduzida e bem sombria com seus tons de preto, roxos, verdes, marrons e off white, ele aproveitou e trabalhou com o  envelhecimento dos tecidos e de suas cores, valorizando o ‘ar’ sublime e vintage que seus vestidos e inspiração pede. Theyskens soube aproveitar muito bem seu período de isolamento não só para ouvir seu tino criativo nesse momento de mudança mas perceber também que é necessário um giro de 180 graus  para reavaliar o que o mercado necessita nesse momento introspectivo. 

DIA 8

Na terça-feira (08), Virginie Viard 一 atual diretora-criativa da maison francesa 一 repetiu um ato icônico feito anteriormente por seu ex-chefe (e também diretor-criativo frente a Chanel) Karl Lagerfeld: apresentar uma coleção que fizesse diversas referências à Escócia, uma região bastante visitada e amada por Gabrielle Chanel, mais conhecida como Coco Chanel e fundadora da marca.

Em contrapartida, enquanto a coleção apresentada por Lagerfeld em 2012 (Pré-Outono 2013) comportava uma atmosfera mais melancólica e altamente ambientada às raízes escocesas, a coleção de Outono/Inverno 2022 一 dirigida por Virginie 一 busca referenciar uma das paixões de Coco Chanel de maneira mais otimista e vibrante, o que consequentemente contribui para que a marca consiga atrair os olhares de uma geração mais jovem, seguindo a pegada brilhante da nova coleção. 

Um outro detalhe que ainda capta bastante atenção nesta nova exposição da Chanel é a devoção aos clássicos tweeds 一 marca registrada da maison 一 em diversos tons, em destaque aos tons mais claros (pastéis) em rosa e azul, por exemplo, fazendo uma grande menção e homenagem ao guarda-roupa tradicional de Coco Chanel e às vestimentas populares durante a década de 1920, além da Londres de 1960. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Os shorts de tweed, também presentes nesta nova coleção da Chanel, ainda são componentes que aplicam ao desejo de Viard em apresentar peças que também pudessem reproduzir o conceito de roupas urbanas, além da própria inspiração no guarda-roupa inglês e escocês. 

A coleção como um conjunto é apresentada de maneira sóbria, apontando de maneira explícita toda a assinatura da Chanel, além de, claro, homenagear a fundadora da casa francesa com suas produções e peças mais clássicas. Apesar de ainda não corresponder ao anseio da comunidade e dos fãs da marca em sair da zona de conforto das criações da marca, como por exemplo o uso ‘’abusivo’’ do tweed 一 que apareceu na coleção não somente em ternos ou nos tradicionais conjuntinhos, mas também em vestidos, cardigãs, meia-calças, sobrepostos, entre outros 一, esta nova apresentação proposta por Virginie Viard na nova coleção da Chanel é um grande convite para que a nova geração possa conhecer um pouco da história da maison e deliciar as referências ao otimismo e brilho da juventude, além de comportar peças que reforçam e mencionam a feminilidade da mulher Chanel. 

Na temporada apresentada no dia 8, Miuccia Prada, diretora-criativa da Miu Miu deu a cartada e última palavra final para esta Semana de Moda de Paris. A coleção de Outono/Inverno 2022 apresentada para a Miu Miu comporta-se como um storytelling magnífico através da continuação da narrativa contada na última apresentação da casa.

Miuccia buscou contar um pouco de sua infância 一 traduzida em roupas 一 e de suas paixões em sua nova coleção. Em uma coletânea reunindo 53 looks, a garota Miu Miu assume uma postura menos workaholic e mais apaixonada por esportes e aventuras, e isso pode ser facilmente captado através da composição das vestimentas 一 através de casacos e blazers oversized, peças mais finas e composições sobrepondo lingeries, o que acaba por substituir a imagem ‘menininha’ por uma mulher mais feroz, determinada e sensual. 

Essa proposta ainda é reafirmada através da aparição de peças que utilizaram da técnica da transparência, além de, como já se era esperado, da presença de vestimentas que explorassem o ‘’uso’’ da pele, como as minissaias, por exemplo, que foram um grande marco e impactaram a coleção passada da Miu Miu. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Os acessórios da nova coleção da casa ainda chamam a atenção por sua praticidade e cores mais convidativas. Além disso, à medida que a nova temporada Miu Miu continuasse a narrativa iniciada anteriormente, foi inevitável a presença de peças em couro, casacos em shearling, estampas de pele de cobra, dentre outros.  

Conforme outras marcas passaram a abordar questões como peças andróginas e genderless, não foi diferente com a Miu Miu nesta temporada de 2022. Os detalhes e conjuntos que tomaram conta desta nova coleção comportam-se como uma maneira de expressar a diversidade de gênero, a partir da silhueta mais acanhada que também funciona para demonstrar como esta funciona com não-binários. A tentativa proposta por Miuccia foi abordada de forma que os modelos masculinos também usassem a malha fina e jaquetas mais curtas. 

Deixando de lado a busca por produzir vestimentas arcaicas de escritório, a nova coleção inspirada nas quadras de tênis criada por Miuccia Prada e apresentada para esta temporada é extremamente acolhedora aos entusiastas de uma moda clássica, livre, moderna e altamente contemporânea. O impacto da coleção de Primavera/Verão 2022, apresentada em outubro, foi extremamente assombroso e parece querer ecoar por um longo tempo. 

2 comentários em “Frenezi nas Semanas de Moda de Outono Inverno de Paris

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