Em A Hora da Estrela (1977), Clarice Lispector escreveu: “enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever”. Apesar do cenário literário ter sido, por muito tempo, monopolizado pela figura masculina, é inegável que a arte deve ser democratizada sem fronteiras ou limitações, e isso inclui a escrita.
Lispector não se dedicou à poesia, mas muitas outras mulheres enxergaram a si mesmas diante de pontos de interrogação que as levaram à mesma conclusão: existem perguntas e escrever é o que dará as respostas. Ou ao menos tentará. Essas mulheres reformularam as regras do mundo e lutaram pelo seu direito de dizer o que precisava ser dito; de apresentar reflexões multifacetadas fundamentais que talvez não tivessem sido introduzidas senão através de suas perspectivas.
As autoras que hoje são pilares à literatura e representam sonhos e concepções anteriormente renegadas, de certa forma, ao seu gênero, buscaram transformar sua poesia — não apenas — em algo tão sublime, que deixou de ser vista como um subproduto do que a arte deveria ser — produzida por homens.
Conheça nomes da poesia mundial que não se amedrontam diante de suas perguntas, mas continuaram a escrever por uma espécie de necessidade irremediável por respostas.
Nomes de destaque na literatura poética
Audre Lorde
Nascida em 1934, nos Estados Unidos, Audre Lorde foi escritora, poeta e ativista. Suas obras se destacaram na área teórica relacionado aos seus estudos feministas, porém sua atuação na poesia foi consistente e marcante. Sua primeira obra publicada foi The First Cities (1968), repleto de poemas sobre suas origens, sua identidade e suas experiências como mulher negra e mãe.
Ao traçar um panorama por toda a obra poética produzida por Lorde, é possível observar que, em sua poesia, manifestam-se questões relacionadas à homossexualidade, raça, gênero, amor de modo amplo, entre outros. Por sua excelência, Audre foi laureada como poeta pela cidade de Nova York em 1991.
No Brasil, grande parte de suas obras, incluindo coletâneas de poemas, são publicadas pela Relicário Edições, mas podem ser lidas em sua língua original (inglês) na Poetry Foundation.
Cecília Meireles
A aclamada e inesquecível Cecília Meireles marcou a literatura brasileira. Contabilizou mais de cinquenta obras publicadas que a expuseram como a gloriosa autora que foi. Meireles é estudada em escolas de todo o país e elevou a imagem feminina na literatura nacional.
Sua poesia completa foi publicada pela Global Editora em dois volumes densos que contemplam um fragmento de sua história com a escrita.
Emily Dickinson
Emily Dickinson foi uma poeta estadunidense do século XIX. Seus poemas, quase que inteiramente, tiveram publicação póstuma, pois em vida estava inserida num ambiente social de domínio masculino.
Foco de estudo literário por todo o globo com mais de mil poemas escritos, Dickinson é considerada uma das mais importantes poetisas da história. No Brasil, tem publicação por diversas editoras. Na língua original (inglês), todos estão disponíveis na Poetry Foundation.
Hilda Hilst
A brasileira Hilda Hilst se tornou patrimônio da literatura nacional através de obras intensas e essenciais. Além da poesia, também se dedicou à escrita de peças de teatro e ficção, com êxito.
Alguns de seus poemas podem ser lidos no site de Hilst. Sua obra está disponível em diversas editoras, mas grande parte reside na Companhia das Letras.
Louise Glück
Louise Glück apresenta uma genialidade inigualável responsável por lhe garantir a gama de láureas de alguns dos mais visados prêmios literários, como o Prêmio Pulitzer de Poesia (1993) e o Nobel da Literatura (2020). Segundo a banca do Prêmio Nobel, Glück possui “inconfundível voz poética, que, com uma beleza austera, torna universal a existência individual”.
Na infância, em quem se é no mundo, na família, no trauma e na natureza residem as temáticas utilizadas pela poetisa para desenvolver suas obras. Foi publicada no Brasil pela primeira vez em 2021 através de uma coletânea de seus poemas entre 2006 e 2014, pela Companhia das Letras, em edição bilíngue.
Maya Angelou
Maya Angelou se tornou um dos maiores nomes da literatura contemporânea diante de todo o trabalho impecável que produziu. Com Eu Sei Porque o Pássaro Canta na Gaiola (1969), sua primeira e de maior notoriedade obra, e outras seis autobiografias, apresentou uma história de luta. No decorrer de sua vida, publicou 23 livros de poesia que a consagraram como uma dos nomes de maior peso na poesia.
Pela excelência, foi indicada ao Prêmio Pulitzer de Poesia em 1971 e, ainda, honrada com a Medalha Nacional de Artes, em 2000, e a Medalha Presidencial da Liberdade, em 2011, também recebida por artistas como Toni Morrison e Aretha Franklin.
No geral, a obra de Angelou é atemporal ao abordar questões como raça, família, luta de classes e gênero, além de muitos outros tópicos. Nacionalmente, tem exemplares em diversas editoras, mas é possível encontrar sua poesia completa publicada pela editora Astral Cultura. Na língua original, alguns deles estão disponíveis na Poetry Foundation.
Sophia de Mello Breyner Andresen
Vencedora do Prêmio Camões (1999), a maior honraria da literatura em língua portuguesa, a poetisa é de origem portuguesa, nascida na cidade do Porto. Versou, em sua obra poética, através de uma grande diversidade de temas que, de tão bem desenvolvidos e aprofundados, a distinguiram em relação à maioria dos outros produtores literários. Além disso, teve relação com a resistência ao cenário político português durante a ditadura salazarista, que também foi abordada em seus poemas.
Atualmente, é considerada um nome de peso da literatura portuguesa e foi publicada, no Brasil, pela Companhia das Letras nas edições Coral e Outros Poemas (2018) e Poemas Escolhidos (2004).
Sylvia Plath
A história de vida de Sylvia Plath transcendeu sua obra e intensificou, de certo modo, a busca pela sua obra. A Redoma de Vidro (1963) foi seu único romance publicado, ao considerar que sua escrita era direcionada à poesia. Apesar do livro ter se tornado um clássico contemporâneo, o trabalho poético de Plath foi igualmente aclamado pela crítica e lhe rendeu um póstumo prêmio Pulitzer de Poesia por The Collected Poems (1981), igualmente publicado postumamente.
Em vida, a poetisa lutou contra a depressão, que pôde ser externada com clareza na arte que produziu. Aos 30 anos, Plath tirou sua própria vida e deixou sobre a escrivaninha Ariel, cuja publicação ocorreu de modo diferente do desejado. Posteriormente, em 2004, a obra restaurada, organizada como originalmente requerido pela poetisa, foi publicada em respeito à memória de Sylvia.
Seus contos, diários e o romance unitário foram publicados no Brasil pela Biblioteca Azul, selo da Globo Livros, enquanto os poemas podem ser encontrados através de edições da Verus Editora, selo do Grupo Editorial Record, e da Editora Iluminuras. Na língua original (inglês), estão disponíveis para leitura na Poetry Foundation.
Wislawa Szymborska

A polonesa Wislawa Szymborska ganhou reconhecimento mundial após vencer o Prêmio Nobel da Literatura em 1966. Chegou a ter seus poemas censurados no país, porém não foi desencorajada pela ocorrência.
Com uma obra poética considerada de linguagem coloquial, objetiva e irônica, distribuída em onze livros, Szymborska foi publicada no Brasil pela Companhia das Letras em três edições bilíngues: Poemas (2011), Um amor feliz (2016) e, mais recentemente, Para o meu coração num domingo (2020).
Poesia e exclusão
Há, nos dias atuais, uma maior variedade de vivências na literatura. Decerto, a tendência é que muitas pessoas, com experiências particulares que por muito tempo foram apagadas, encontrem seu espaço para falar através do ambiente literário.
As mulheres demonstraram um furor determinante capaz de moldar a cultura à sua aceitação, mas isso precisará de tempo. Ainda que as nove poetas acima tenham alterado o curso e abandonado o marasmo do protagonismo masculino, sua participação ainda precisa ser reconhecida com coerência.
Para incentivar a literatura feita por mulheres, é necessário uma disponibilidade para ler o que elas têm a oferecer, seja um leitor ordinário que apenas lê por diversão, seja um grande crítico que está condicionado a oferecer holofotes ao mesmo arquétipo masculino sempre. A ausência de inserção feminina pode ser exemplificada através do próprio Nobel da Literatura, recebido por Szymborska e Glück, mas também por apenas outras 14 mulheres desde 1901. Ou seja, dentre os 118 prêmios entregues na categoria, um século inteiro foi usado para destacar a literatura produzida por homens.
Esses são alguns dos trabalhos de autoras com produções literárias que devem ser reconhecidas:






Para que a literatura feminina cresça e alcance gerações de meninas que vejam a si mesmas no que estão lendo, é necessário incentivar tal produção de modo intenso. Isso é feito através do consumo consciente das obras. Dessa forma, ao mesmo tempo que mais perguntas surgirão, mais respostas virão como consequência e, ao considerar a natureza feminina como desumanizada por um processo social arrastado, muitas mulheres ainda não conhecem a si mesmas como seres reais no mundo. A arte, em conceito amplo, entra em cena com o papel de colaborar com o autoconhecimento, seja no consumo, seja na construção.
As poetisas apresentam versos que são capazes de comportar a densidade de questões, sentimentos e existências inteiras que não poderiam ser melhor descritas; que servem como um abraço quente ou um choque de realidade. Confortável ou não, sua maneira de produzir literatura colabora pontos sobre a natureza feminina e humana, no geral, difundidas por todo globo e, cada dia mais, são responsáveis por oferecer a mulheres — ainda que não apenas — concepções sobre quem são, quem querem ser e quem podem ser.