Tragédia anunciada: tempestade no Litoral Norte de São Paulo mata 49 pessoas

  • O presidente Lula interrompeu sua folga na Bahia e sobrevoou as áreas afetadas;: ao visitar São Sebastião, anunciou ajuda;
  • Maior temporal da história deixou 40 mortos (39 em São Sebastião e 1um em Ubatuba);
  • Foi decretado estado de calamidade em 6 cidades e luto oficial de 3 dias. “Trechos da Rio-Santos podem não existir mais”, disse governador de SP;
  • Equipes seguem as buscas em São Sebastião;
  • Em todo estado são 1.730 desalojados e 766 desabrigados; ainda há previsão de chuva para a região.

Fonte: g1

O solo liquefado, que o deixou ainda mais saturado, trazendo muita lama, é apenas parte da destruição causada por 600mm de chuva que caiu entre sexta e sábado (18 e 19) no Litoral Norte de São Paulo. Pessoas desabrigadas, deslizamentos de encostas, rodovias bloqueadas e trechos de asfaltos que foram arrastados pela chuva, quedas de árvores, pessoas soterradas e desaparecidas, casas completamente destruídas, este é o cenário após a tempestade que arrasou o litoral paulista.

Em Ubatuba, uma criança de 7 anos morreu em um deslizamento. Em Caraguatatuba, a cidade se encontra alagada, sem luz e sem água. Na cidade de Ilhabela, água e transporte público foram interrompidos. A cidade mais atingida foi São Sebastião, onde ocorreuram a maioria das mortes e dos desaparecimentos. Em Juquehy, 2 pessoas ainda estão desaparecidas, além das ocorrências dee desabamentos e deslizamentos na cidade. Em Camburi, 1 pessoa está desaparecida e veículos foram submersos pela enxurrada., Em Boiçucanga, 1 pessoa também está desaparecida e a cidade está sem luz após os alagamentos. Em Toque-Toque Pequeno, carros foram destruídos e a cidade foi devastada pela força das águas. Em Topolândia, duas casas desabaram e outras estão em risco de desabamento. Em Bertioga, Santos, São Vicente e Itanhaém, a situação é de alagamentos, queda de luz, um naufrágio de uma escuna, e até a Rio-Santos chegou a ser interditada.

A alta da maré tem dificultado o acesso às áreas próximas à praias e, com isso, tem atrapalhado o resgate de pessoas desabrigadas. Barcos e lanchas têm sido utilizados nos trabalhos de busca, a fim de resistir à correnteza e à alta da maré. Até agora, crianças foram resgatadas por voluntários com a ajuda do Exército, uma corrente humana feita por voluntários para resgatar um bebê na lama e uma mulher em trabalho de parto conseguiu dar à luz em segurança. São muitos os relatos emocionantes de pessoas que perderam tudo, procuram por familiares e tiveram perdas na família. Turistas que se reuniam para o Carnaval nessas regiões relataram momentos de medo durante as inundações de pousadas e hotéis que estão hospedados.

Um repórter da Globo chorou ao vivo, ao anunciar que um litro de água estaria sendo vendido por 93 reais. A busca por mantimentos também tem gerado grandes filas nos estabelecimentos. Gerentes de supermercados avisam que alguns itens básicos já estão em falta. Mas com as mobilizações de voluntários, ao longo da semana, comida e água têm sido distribuídas de graça para quem deixou a própria casa só com a roupa do corpo. O PROCON tem fiscalizado os abusos de preços pelos comerciantes. Remédios e produtos de higiene, também são alguns dos exemplos de produtos que estão com preços superfaturados.

Quem tenta voltar para casa de ônibus, também pode ter que pagar mais. Por causa do bloqueio na rodovia Mogi-Bertioga, o trajeto entre Bertioga e Mogi das Cruzes ficou 100 quilômetros maior e o preço da passagem mais que dobrou.

O Instituto Verdescola, na Vila do Sahy, tem recebido as famílias resgatadas. Até agora, mais de 81 pessoas estão abrigadas na unidade escolar. Além disso, corpos também estão sendo reconhecidos e um hospital de campanha foi montado na organização. A situação é de calamidade pública.

As vítimas fatais do desastre, apuradas também pelo g1 — já que o Estado não providenciou a relação dos nomes das vítimas, são, Adrian José da Conceição Costa, de 11 anos, que morreu junto com os pais. Ana Vitória Cordeiro, de 7 anos, que foi ao litoral para conhecer a praia pela primeira vez, e morreu com a irmã de 16. Ângela Benício, que morreu com a filha, de 28 anos, e a neta, de 8 anos. Ariosvaldo Paes Landim, que foi soterrado com parentes, que ainda estão desaparecidos. Cristiano Olivares, de 9 anos, que faleceu com o pai, num desabamento. Dandara Vida Cazé, de 10 anos, que estava passando o final de semana com a família, morreu junto ao primo, Eduardo Lionel, de 11 anos. Donaria Santos, que passava o Carnaval com o marido Robério Lima Saldanha, e a cunhada, Rosângela Saldanha da Silva, todos morreram. Ednaldo Santos da Silva, que curtia o final de semana com a namorada e a enteada, também morreu.. Eliton Prado da Silva, de 32 anos, que passava o final de semana com amigos. Ellyza Nayanne Celestino de Lima, de 9 anos, faleceu depois da devastação da Vila do Sahy. Fabiane Freitas de Sá, funcionária pública da Prefeitura de São Sebastião, faleceu após uma árvore de grande porte atingi-la. Felipe Rocha, de 9 anos, morreu junto com a irmã Joina, os pais, e outro irmão, que continuam desaparecidos. Além de muitos outros nomes, que estão na triste lista de 49 falecidos.

Na noite da última terça (21), começaram os primeiros velórios das vítimas. Depois, todos os corpos foram levados ao cemitério municipal, onde foram sepultados. O governador de São Paulo afirma, que o número de vítimas pode aumentar bem mais.

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet (MDB), visitou um dos centros de acolhimento montados pela Prefeitura de Guarujá. O local recebe e dá suporte a 190 pessoas desalojadas. Ela garantiu todos os recursos necessários às vítimas:. “Não podemos deixar que pessoas e famílias fiquem em situação de risco. Agora temos que acomodar essas pessoas e, junto com a Caixa, ver o levantamento de verbas, agilizar e proteger da melhor forma cada um deles”, declarou.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nas redes sociais que a Receita Federal vai enviar mercadorias que foram apreendidas para as vítimas das enchentes: “Determinei que a Receita Federal identifique mercadorias apreendidas, que possam ser enviadas às vítimas das chuvas no Litoral Paulista. São mais de R$: 11 milhões em roupas, calçados, itens de cama, mesa e banho, higiene pessoal, material de limpeza e utensílios de cozinha.”

O Governador de SP, Tarcísio de Freitas, em coletiva, definiu a cena como assustadora, referindo-se à situação após as chuvas. Ele ainda diz que trechos da Rio-Santos podem não existir mais: “’a gente não sabe o que sobrou da rodovia”. E expõe: “A gente contabilizou mais de 10 pontos de bloqueio, alguns de grande extensão, em alguns pontos a gente não sabe exatamente o que sobrou da rodovia, porque é um volume de terra tão grande que se deslocou em uma extensão tão grande que a gente até levanta a hipótese de a rodovia ter sido arrastada junto, de a rodovia não existir mais”.

Lula e Tarcísio falam em união e trabalho compartilhado para recuperar o litoral paulista. Equipes já estão lançando cabos de fibra óptica para restabelecer internet e comunicação nas áreas atingidas por chuvas, disse ele à GloboNews. Segundo ele, também estão tentando retomar a energia elétrica nas áreas afetadas.

O Bolsa Família será antecipado para atingidos por chuvas no litoral de SP, disse o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias. O pagamento será unificado para o dia 30 de março e vale para todas as famílias dos municípios atingidos e com decreto de emergência e calamidade. A Caixa também vai liberar o saque calamidade do FGTS em municípios do litoral de SP atingidos pelas chuvas. O valor para retirada é de até R$: 6.220,00.

Segundo a BBC, a catástrofe atual ocorreu 56 anos após a maior tragédia ligada às chuvas na história de São Paulo, acontecida em 18 de março de 1967 no município de Caraguatatuba, quando as águas causaram o desmoronamento de encostas e centenas de casas foram soterradas.

Segundo a contagem feita na época, 487 pessoas morreram, mas estima-se que o número de óbitos tenha sido muito maior, já que muitos desaparecidos nunca foram encontrados.

A jornalista Adriana Carranca desabafou em sua página no Twitter. “Fiz há 20 anos reportagem sobre a exploração imobiliária predatória no litoral norte de SP que destruíra a vegetação costeira e empurrava caiçaras e trabalhadores migrantes morro acima, condenando-os a viver em habitações precárias. É onde estava a maioria dos mortos das chuvas.”

Fiscais da prefeitura de São Sebastião flagraram as novas construções — que são proibidas na área desde 2009. Em 2020, o Ministério Público Estadual já havia identificado o risco de deslizamentos de terra na comunidade. Em março de 2021, então, o Ministério Público entrou com uma ação civil pública para exigir a intervenção no local – –o que inclui ligação oficial de água, luz, urbanização e liberação das áreas de risco. Na época, já eram 650 imóveis na comunidade e ao menos 596 famílias.

Segundo a moradora de São Sebastião, advogada da ONG Instituto Verdescola, localizada na Barra do Sahy, “a “tragédia poderia ser evitada”. Em entrevista para o UOL, Fernanda disse: “Ver cenas como essas é algo muito triste, saber que existem pessoas soterradas e não poder fazer nada. A gente avisou tanto os órgãos responsáveis que ali era uma área de risco e nada foi feito. Foram muitos anos de omissão.”

O diretor do órgão nacional de monitoramento, o CEMADEN, disse que o Governo de SP e a Prefeitura de São Sebastião foram avisados do risco de desastre 2 dias antes. Moradores relatam, porém, que não foram alertados sobre o perigo de deslizamento. O Ministro da Integração e o governador de São Paulo reconhecem falhas no sistema; apenas a prefeitura ainda não se manifestou.

Para o colunista do UOL, Leonardo Sakamoto, a tragédia no litoral é fruto da desigualdade social com a mudança do clima. “Esse processo decorre da especulação imobiliária, que garante as melhores e mais seguras áreas do litoral a quem tem dinheiro, fazendo com que moradores tradicionais e trabalhadores migrantes se virem em outros locais. Processo que conta com o apoio do poder público. Em São Sebastião, por exemplo, há ocupações ilegais em áreas de risco que foram regularizadas sem a realização de mudanças estruturais. Isso gera voto, mas pode tirar vidas.

Tragédias causadas por fatores imprevisíveis chocam, mas deixam um gosto menos amargo do que aquelas que poderiam ser evitadas ou mitigadas pela ação do poder público municipal, estadual e federal. Afinal de contas, todo mundo sabe que o combo ‘chuva, especulação imobiliária e falta de políticas públicas’ vai matar anualmente. Menos as autoridades”, disse ele em sua coluna.

O jornal Esquerda Diário pontuou em sua reportagem: “Esse é mais um triste capítulo da barbárie capitalista que assola nossas cidades litorâneas. É preciso atacar os problemas desde a raiz, acabando com a especulação imobiliária e operando uma reforma urbana radical que garanta moradias com segurança para a população e saneamento básico para todos. Daí a importância de se ter independência política dos governos de plantão, que estão profundamente comprometidos com os interesses das grandes construtoras e dos tubarões do mercado imobiliário”.

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