Oscar 2023: quem leva o prêmio de “Melhor Canção Original”?

Com a cerimônia do Oscar 2023 se aproximando, as expectativas para conhecermos os vencedores em diversas categorias aumentam, incluindo a de Melhor Canção Original. Este ano, com uma variedade de filmes aclamados pela crítica e favoritos pelo público sendo indicados, a premiação promete ser histórica.

A categoria de Melhor Canção Original premia as músicas criadas, especificamente, para um filme, incluindo a letra e a melodia. Ela é importante na premiação pois as músicas, muitas vezes, se tornam um componente crucial na construção da atmosfera do filme, transmitindo emoções e complementando a narrativa.

A 95° edição da cerimônia de entrega dos Academy Awards acontece dia 12 de março de 2023, em Los Angeles, Califórnia. É importante destacar que é o compositor que recebe a indicação, tendo um limite de até três participantes na composição das faixas. Os intérpretes só são considerados na categoria se tiverem contribuído na letra das canções.

Lift Me Up – Rihanna

Lift Me Up foi lançada em 28 de outubro de 2022, como lead single do álbum de trilha sonora de Pantera Negra: Wakanda Forever. O anúncio da música foi muito comentado por marcar a primeira canção solo de Rihanna em mais de 6 anos. Classificada como uma balada R&B, a canção é um tributo ao falecido ator Chadwick Boseman, que interpretou o personagem T’Challa, protagonista do primeiro filme.

A faixa foi produzida e escrita por Ludwig Göransson, com adições de Ryan Coogler, da cantora nigeriana Tems e de Rihanna na composição. Em sua crítica, a Pitchfork elogiou os vocais da cantora barbadense, mas considerou a música e a letra uma adição genérica para a trilha sonora.

O single estreou em segundo lugar na Billboard Hot 100 e permaneceu por duas semanas não consecutivas no Top 10. No Reino Unido, Lift Me Up debutou em terceiro lugar na Official Single Charts. A canção foi indicada no Golden Globes Awards, Critics’ Choice Movie Awards e no Oscar deste ano. Apesar disso, até o momento, só ganhou o prêmio no Hollywood Music in Media Awards.

Rihanna não colocou a música na setlist de sua performance no Super Bowl, mas é inegável que nos últimos meses ela foi um dos nomes mais comentados no mundo, e isso pode ser levado em consideração pelos votantes na corrida para ganhar a estatueta. A representatividade também pode ser uma questão forte para a premiação, que tenta trazer maior diversidade nas indicações nos últimos anos.

Hold My Hand – Lady Gaga

Hold My Hand é o lead single do disco da trilha sonora de Top Gun: Maverick. A canção, lançada em 3 maio de 2022, conta com composição e produção de Lady Gaga e BloodPop. Essa é a terceira vez que a cantora é indicada nessa categoria, sendo anteriormente nomeada por Til It Happens to You, do documentário The Hunting Ground, e Shallow, de Nasce Uma Estrela.

Para a crítica, Hold My Hand evoca as poderosas baladas dos anos 80, com uma ótima mensagem de esperança. Além disso, o single possui semelhanças com Take My Breath Away, música original feita para o primeiro filme Top Gun, em 1986. A música interpretada pela banda Berlin ganhou a categoria de Melhor Canção Original em 1987 e conseguiu o primeiro lugar na Billboard Hot 100.

O videoclipe da faixa foi dirigido por Joseph Kosinski, mesmo diretor de Top Gun: Maverick. No filme, a música toca durante uma cena no bar entre a personagem Penny e sua filha e, depois, se repete na cena final, em que o protagonista Maverick e Penny desaparecem no pôr do sol. 

Por ter sido lançada em uma terça-feira, Hold My Hand só entrou na Billboard Hot 100 em sua segunda semana, em 17° lugar. Além da indicação no Oscar, a canção recebeu indicações no Globo de Ouro, Grammy Awards por Best Song Written for Visual Media e no Critics’ Choice Movie Award na categoria de Best Song.

Naatu Naatu – M.M. Keeravaani e Chandrabose

Naatu Naatu é uma música indiana em telugu feita para a trilha sonora do filme RRR (Revolta, Rebelião, Revolução). A faixa foi composta por M. M. Keeravani e Chandrabose, e é interpretada por Rahul Sipligunj e Kaala Bhairava. Ela se tornou a primeira música de um filme indiano a ser indicada ao Oscar por Melhor Canção Original

Apesar disso, não é a primeira música com compositores indianos a ser nomeada na categoria. No Oscar 2009, a canção Jai Ho, do filme Quem Quer Ser um Milionário?, venceu o prêmio. Porém, o longa era uma produção britânica, apesar da história ser situada na Índia. 

Naatu Naatu já tem o favoritismo da crítica e ganhou o Globo de Ouro e Critics’ Choice Movie Awards. No Golden Globe Awards, fez história por ser a primeira música indiana a ganhar a categoria. 

O interessante é que o filme RRR ganhou a curiosidade do público americano após um trecho do longa com a produção musical viralizar no TikTok. A coreografia feita pelos protagonistas do filme ganhou as redes sociais e virou trend no aplicativo de vídeos. Com a chegada do longa nos cinemas americanos e no streaming, várias pessoas puderam assistir a performance na íntegra.

Applause – Diane Warren

Applause, do filme Elas por Elas, é escrita por Diane Warren e interpretada por Sofia Carson, atriz e cantora. Lançada em 9 de dezembro de 2022, a faixa tem uma mensagem de empoderamento feminino que conversa com o longa antológico.

A canção é a 14° indicação de Diane, que ainda não conseguiu vencer a categoria. Esse é o sexto ano consecutivo que Warren tem uma de suas composições na premiação. A marca de 14 indicações em Melhor Canção Original só foi alcançada por sete artistas na história. Por esse motivo, em novembro de 2022, a compositora ganhou um Oscar honorário pelo conjunto de sua obra e contribuição para o cinema.

This Is A Life – Ryan Lott, David Byrne e Mitski

Trecho do filme Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo. [Imagem: Reprodução]

This Is A Life faz parte da trilha sonora do filme Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo e é composta por Son Lux, um projeto pop experimental de Ryan Lott. Lançada em 8 de março de 2022, a canção é uma balada clássica e lenta com destaque para os vocais de Byrne e Mitski, também compositores da faixa.

A música é a que menos recebeu atenção nas apostas da categoria, pois não foi indicada em nenhuma das premiações usadas como termômetro do Oscar. Apesar disso, o longa Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo é um dos favoritos da edição e tem o maior número de indicações, 11 ao todo.

Pré Lista

Com a divulgação dos pré-selecionados, muitas expectativas surgiram, mas nem sempre os favoritos do público entram na lista de indicados. Um dos grandes “esnobados” desta edição é a música Carolina, de Taylor Swift, para o filme Um Lugar Bem Longe Daqui.  A artista americana ganhou indicações do Golden Globes, Critics’ Choice e Grammy Awards pela sua composição. Todavia, foi ignorada pela Academia e não garantiu sua primeira nomeação ao prêmio.

Algumas outras canções muito comentadas foram Nothing Is Lost (You Give Me Strength), de The Weeknd, para Avatar: O Caminho da Água, Ciao Papa, de Gregory Mann, para a animação Pinóquio de Guillermo del Toro, My Mind & Me, de Selena Gomez, para o documentário Selena Gomez: My Mind & Me e Stand Up, de Jazmine Sullivan, para Till – A Busca por Justiça.

Mesmo assim, os fãs de cinema e música podem esperar por uma noite emocionante e inesquecível na cerimônia do Oscar deste ano, onde a música e o cinema se unem para celebrar e honrar os talentos mais impressionantes e inspiradores do ano. 

[Crítica] ‘This Is Why’ traz o isolamento, maturidade e o autêntico punk rock

Após um hiatus de 5 anos e meio, a banda Paramore fez seu esperado comeback na última sexta-feira (10) com seu sexto álbum de estúdio, This Is Why. O projeto repete pela primeira vez a mesma formação do disco anterior do grupo, com Hayley Williams nos vocais, Taylor York na guitarra e Zac Farro na bateria.

This Is Why começou a ser produzido durante a pandemia e retrata emoções vividas nessa época pela banda, além de reflexões dos 20 anos de história do grupo. No anúncio do álbum, Paramore diz “Se você sentiu sensações de agorafobia, isolamento, dissociação, desconexão e nostalgia por coisas que você ainda não experimentou e nem sabia que queria. Então nós temos um álbum para você”.

O disco conta com 10 faixas e tem como produtor principal Carlos de la Garza. A mixagem é assinada por Manny Marroquin e a masterização é feita por Emerson Mancini e Michelle Mancini. O álbum tem como escritores principais os três integrantes da banda e resgata a sonoridade do punk rock autêntico de projetos anteriores.

A primeira música é This is Why, faixa que deu nome ao projeto e lead single do álbum. Lançada em 28 de setembro de 2022, a canção foi a última adição na tracklist do disco e explora as emoções de ter passado pelo período de isolamento social e suas consequências. A falta de humanidade e empatia da sociedade e opiniões não solicitadas são algumas das razões usadas para exemplificar o sentimento.

A faixa alcançou o terceiro lugar na parada musical da Billboard Rock e Alternative Airplay e ficou em oitavo na Bubbling Under Hot 100, também da Billboard. O videoclipe foi gravado em uma mansão em Malibu, na Califórnia, e foi dirigido por Brendan Yates, da banda punk Turnstile.

The News, o segundo single do disco, lançado em 8 de dezembro de 2022, resgata o melhor do punk rock, desde sua sonoridade até a letra com sinais claros de insatisfação com o que está acontecendo no mundo. A canção é um bom exemplo da intenção do álbum, que traz reflexões sobre os acontecimentos dos últimos 5 anos de hiatus da banda.

A música ficou em 34° lugar na Billboard Hot Rock & Alternative Songs por apenas uma semana. O videoclipe mostra Hayley Williams em isolamento sendo absorvida pelas notícias enquanto se transforma em uma forma mais bizarra. O vídeo foi inspirado em cenas do gênero de terror e é dirigido por Mike Kluge e Matthew DeLisi.

A terceira canção é Running Out Of Time, escolhido como quarto single da era This Is Why. A faixa explora a falta de tempo como o último álibi e as famosas desculpas e pequenas mentiras que acompanham um atraso. Em entrevista para a Genius, Hayley afirmou que a música é inspirada em situações que aconteceram com ela e na sua tendência à procrastinação.

A amizade da vocalista do Paramore com Taylor Swift também ajudou a dar vida a canção, já que foi em uma visita ao closet de presentes de Taylor que Hayley pode ver sua falta de organização na vida. O destaque de Running Out Of Time vai para o refrão que traz a estética do funk rock, a mistura dos dois gêneros eleva ainda mais a faixa.

O projeto segue com C’est Comme Ça, terceiro single do álbum, lançado em 12 de janeiro. A expressão em francês que dá nome a música pode ser traduzida em português por “É assim que é”. A temática é semelhante a da faixa anterior, só que em C’est Comme Ça, a banda aceita que é necessário algum tipo de caos para sobreviver. 

A canção traz alguns versos mais falados, nunca antes vistos na discografia do grupo. Em entrevista ao The Zane Lowe Show, Paramore admitiu que a influência na sonoridade e estilo da música vem de bandas como Talking Heads, Dry Cleaning e Yard Act.

Big Man, Little Dignity é a quinta e a mais longa música do disco. Apesar do ritmo mais tranquilo, a letra é mais ríspida por relatar o sentimento de impunidade masculina. A faixa ressalta a falta de consequências para os homens na sociedade, que não se responsabilizam por suas ações.

A sexta canção é You First, que reflete sobre o paradoxo de poder ser o herói e o vilão na mesma história. Em versos como “Turns out I’m livin’ in a horror film, Whеre I’m both the killer and the final girl”, a faixa exemplifica esse conceito. A sonoridade remete ao rock alternativo e tem como destaque a ponte e o refrão.

O álbum segue com Figure 8, música que contempla estar perdido na imensidão, pois a “figura 8” se refere ao símbolo do infinito. A canção tem um liricismo interessante sobre a ideia e chama a atenção pelo solo de guitarra no pré-refrão. 

Liar é a oitava faixa do disco e a primeira a utilizar a temática da paixão, mas especificamente o medo de se apaixonar. A canção super intimista e pessoal marca, possivelmente, a fase inicial do relacionamento entre dois integrantes da banda. Hayley Williams e Taylor York confirmaram, em setembro de 2022, os rumores de que estariam namorando, e fãs logo associaram a música à história dos dois.

Ensaio para a revista Billboard [Imagem: Reprodução/Billboard]

A penúltima faixa é Crave, que fala sobre nostalgia tanto na letra como no ritmo, e se assemelha com algo já feito em trabalhos anteriores. Mesmo assim, a canção não deixa de ser interessante por trazer nos versos provocações importantes sobre o tema.

O projeto se encerra com Thick Skull, uma das músicas que mais surpreendem no disco. Ela começa devagar e vai crescendo, até explodir no refrão em uma experiência catártica da vocalista. Na letra, é possível identificar a escolha de encerrar This Is Why com a canção, que é de fato uma maneira de calar acusações injustas sobre a carreira do grupo.

Com o lançamento do álbum, Paramore alcançou o primeiro lugar no Top Albums Debut Global no Spotify e tem projeções de estrear no topo da UK Album Chart pela primeira vez em uma década. This Is Why também conseguiu ficar em 1° lugar no Itunes dos Estados Unidos. 

No Metacritic, o disco recebeu nota 85 com 18 críticas consideradas positivas. A revista NME atribuiu nota máxima e considerou o projeto um retorno triunfal da banda. Já a Rolling Stones, destacou a maturidade atingida no álbum, mostrando que ser adulto também traz suas angústias. A Pitchfork deu a nota 6.3, elogiando o uso do ritmo post-punk, mas não considerou que o Paramore chegou no nível de projetos anteriores.

Photoshoot para a capa da revista NME  [Imagem: Reprodução/NME]

É importante lembrar que This Is Why marca o último álbum do contrato da banda com a Atlantic Records. Assim, o disco marca o fim de uma era muito importante na carreira do Paramore. Em diversas entrevistas, Hayley Williams deixou claro o valor simbólico do projeto como o fim de um acordo assinado quando ainda era adolescente. 

Agora, como adultos, a banda finalmente pôde deixar para trás algumas polêmicas e se dedicar a projetos mais íntimos para o trio. Esses podem ser um dos motivos que levaram This Is Why a ser um álbum mais curto. Ele se afasta bastante sonoramente de seu antecessor, After Laughter, mas está longe de ser um álbum completamente nostálgico. 

Para os fãs, o disco pode soar familiar a projetos como Riot!, mas o ponto-chave da nova era vem na maturidade das composições. Por motivos óbvios, a agonia, raiva ou insatisfação da juventude não têm mais espaço na discografia do grupo. Os sentimentos agora dão lugar a problemas mais “reais” do mundo adulto, como perder a noção de passagem do tempo e aceitar aspectos imutáveis de sua personalidade. 

O movimento emo e o gênero pop-punk viraram tendência nos últimos anos, principalmente, por novos nomes na indústria musical. Quando ele é feito por quem não apenas experimenta do gênero, mas viveu o início dos anos 2000, é possível notar algumas diferenças. Hayley mostra constantemente o porquê é uma grande vocalista e compositora, e Zac e Taylor dominam seus instrumentos para trazer um senso de coesão e harmonia. Dessa forma, This Is Why se torna uma adição interessante ao catálogo do Paramore e evidencia a importância da banda no gênero.

Gal Costa: a eterna musa da Tropicália e MPB

Nesta quarta-feira (9), o país acordou com a notícia da morte de uma das suas maiores cantoras, Gal Costa, aos 77 anos. Um dos ícones da música popular brasileira, Gal tinha 57 anos de carreira e mais de 40 álbuns lançados. Em outubro de 2021, a cantora iniciou uma grande turnê que revisitava grandes sucessos dos anos 80 na MPB que entrou na lista de festivais no Brasil e tinha planos para se expandir na Europa. Infelizmente, a agenda de shows foi interrompida há alguns meses para a artista realizar uma cirurgia.

Maria da Graça Costa Penna Burgos nasceu em 26 de setembro de 1945 na cidade de Salvador. O apelido Gal foi criado pelo produtor Guilherme Araújo, que preferiu trocar o nome Maria da Graça que foi apresentado no início de sua carreira. A artista conheceu Caetano Veloso em 1963, aos 18 anos, apresentada por sua amiga e vizinha Dedé Gadelha, futura esposa de Caetano. Assim, se iniciou uma grande amizade e profunda admiração entre os cantores que colaboraram várias vezes em suas carreiras.

Gal estreou no espetáculo Nós, Por Exemplo em agosto de 1964, na inauguração do Teatro Vila Velha, em Salvador. Ao lado de grandes nomes como Gilberto Gil, Maria Bethânia e Caetano, a artista também estrelou o show Nova Bossa Velha, Velha Bossa Nova. A primeira aparição em um álbum foi no disco de estreia de Maria Bethânia, irmã de Caetano, na faixa Sol Negro em 1965. Em seu primeiro compacto (disco de vinil que só tinha duas canções) regravou as faixas Eu vim da Bahia, de Gilberto Gil, e Sim, foi você, de Caetano Veloso.

O primeiro LP oficial foi Domingo com seu bom amigo Caetano, lançado em 1967. A música de destaque do disco foi Coração Vagabundo, um dueto entre os cantores. Em 1968, Gal participou do álbum Tropicália ou Panis et Circencis com Gilberto Gil, Nara Leão, Caetano Veloso, Os Mutantes e Tom Zé. Esse disco foi o manifesto musical do movimento do tropicalismo, que mesclava elementos tradicionais da cultura brasileira com as tendências estrangeiras da época.

Gal no IV Festival da Música Popular Brasileira, em 1968. [Imagem: Acervo Estadão]

A revista Rolling Stones Brasil, considera Tropicália como o segundo dos 100 maiores discos da música brasileira. O álbum que moldou o futuro da música popular brasileira que contrastava com a formalidade da bossa nova teve como maior hit a faixa Baby, escrita por Caetano e interpretada por Gal. Esse foi o primeiro grande sucesso solo da cantora, que se tornou um grande clássico da MPB.

Em 1969, ela lançou seu primeiro disco solo intitulado Gal Costa que contava com três novos grandes hits, Divino Maravilhoso, Que pena (Ele já não gosta mais de mim) e Não identificado. No mesmo ano gravou já o segundo disco solo, chamado Gal, que foi a obra mais conceitual e psicodélica de sua carreira. O destaque do álbum vai para as canções Meu nome é Gal e Cinema Olympia. Em 1981, protagonizou uma das cenas mais icônicas da TV brasileira com Meu nome é Gal, em especial inédito da série Grandes Nomes na TV Globo. Nela, a cantora duelava com um solo de guitarra, atingindo vocais cada vez mais agudos com sua conhecida afinação invejável.

Gal realizou em 12 de outubro de 1971 um dos show mais importantes de sua carreira e da música brasileira, no Teatro Tereza Rachel, em Copacabana. A série de espetáculos Fa-tal foi dirigida por Waly Salomão e gerou o disco ao vivo Fa-Tal / Gal a Todo Vapor, com os sucessos inéditos Vapor barato, Como 2 e 2 e Pérola negra. A performance se tornou icônica exatamente pela época em que foi realizado, com Caetano e Gil exilados em Londres, Gal desafiava a ditadura militar e se tornava porta-voz da contracultura do tropicalismo.

Dessa irreverência, foi lançado o álbum Índia em 1973 como o sexto álbum de estúdio da artista. Produzido por Gilberto Gil, o disco era vendido coberto de plástico, depois das imagens da capa e contracapa serem alvo dos censuradores na época. A capa é estampada por um close em Gal com biquíni vermelho e a contracapa mostrava parte dos seios da cantora. Na ditadura, foi a primeira vez em que um disco saiu com a embalagem lacrada e acabou despertando a curiosidade de todos.

Gal Costa também fez muito sucesso ao gravar músicas para as aberturas de novelas da Rede Globo. Em 1975, lançou Modinha para Gabriela, escrita por Dorival Caymmi para o enredo de Gabriela. Na segunda versão da novela, em 2012, Gal interpretou a canção mais uma vez. Em 1988, gravou a canção Brasil, escrita por Cazuza, Nilo Romero e George Israel para a telenovela Vale Tudo. Para a produção Deus nos Acuda, lançou Canta Brasil em 1992, e para Torre de Babel, gravou Pra Você em 1998.

Ao lado de seus conterrâneos e grandes amigos Gilberto Gil, Caetano e Maria Bethânia, Gal reuniu o grupo chamado Doces Bárbaros para uma turnê pelo país em comemoração aos 10 anos de carreira deles. O conjunto de artistas rodou o Brasil em 1976 com o espetáculo, que resultou em um disco ao vivo de mesmo nome e um documentário dos bastidores. Doces Bárbaros foi um dos mais importantes grupos da contracultura dos anos 70 e até virou enredo da escola de samba Estação Primeira de Mangueira em 1994.

O quarteto Doces Bárbaros. [Imagem: Reprodução]

Em 1978, Gal Costa apresentou seu álbum Água Viva, o primeiro disco de ouro de sua carreira (ultrapassando a venda de 40 mil cópias). Desse projeto foi criado o espetáculo Gal Tropical, a virada de chave para a cantora no mainstream. Já que amadurecia sua imagem de musa hippie do tropicalismo para uma cantora solo mais estabelecida. A apresentação foi sucesso de crítica e gerou outro disco de mesmo nome, em que cantava seus grandes hits e faixas inéditas, como Força estranha, escrita por Caetano Veloso, Balancê e Noites Cariocas (Minhas Noites Sem Sono)

Em seguida vem o álbum Profana, lançado em 1984, e outro ponto alto da discografia da artista. As canções fenômeno do projeto foram Chuva de prata, com participação do grupo Roupa Nova, e Vaca profana. No ano seguinte, Gal seguiu desafiando os limites da liberdade feminina e posou nua para a revista Status, quando estava prestes a completar 40 anos. Outro momento marcante aconteceu em 1994 na apresentação da música Brasil no Rio de Janeiro, onde ela apareceu de camisa aberta e os seios à mostra para o choque do público.

A cantora foi homenageada pela Academia Latina das Artes e Ciências da Gravação em 2011, na cerimônia do Grammy Latino. Gal Costa recebeu o grande Prêmio à Excelência Musical, pelo conjunto de sua discografia. O último projeto com faixas inéditas foi A Pele do Futuro, em 2018. Esse que foi seu quadragésimo álbum de estúdio, contou com participações de Maria Bethânia e Marília Mendonça. Em 2021, foi lançado o último disco da cantora, Nenhuma Dor, com regravações de seus maiores clássicos. O elenco de participações contava com artistas masculinos da nova geração, como Zeca Veloso, Seu Jorge, Silva e Rubel.

Parte da capa do álbum comemorativo, Nenhuma Dor. [Imagem: Reprodução]

Em sua homenagem, o filme Meu Nome é Gal que conta a vida da cantora  já estava em produção e chega aos cinemas na primeira semana de março de 2023, no Dia Internacional da Mulher. Gal será interpretada no longa pela atriz Sophie Charlotte. A cantora sempre foi discreta quanto a sua vida pessoal, mantendo a vida da família e relacionamentos na esfera privada. 

Gal era assumidamente bissexual e manteve namoros com homens e mulheres anónimos e famosos. Em entrevistas revelou nunca ter conseguido engravidar por um problema físico e realizou o sonho da maternidade através da adoção. Em 2007, adotou um menino de dois anos de idade, após visitar um abrigo no Rio de Janeiro, e o batizou de Gabriel. 

A importância de Gal Costa para a música brasileira é inestimável, graças a seu timbre de voz, afinação e vocais impecáveis. A cantora se tornou a musa da tropicália e da MPB em um cenário em que o público precisava de música para sua luta. Gal trabalhou com os maiores artistas brasileiros, carregando composições de seu amigo Caetano Veloso, de Tom Jobim, Chico Buarque e Milton Nascimento.

[Imagem: Reprodução]

Sua sensualidade profana durante a ditadura, lhe rendeu o título de ídola da contracultura nos anos 70 e seu trabalho nesse tempo foi inovador com ruídos e misturas não típicas da música brasileira. A cantora nunca se prendeu a um gênero musical específico, o que a permitia sempre estar atenta ao que havia de novo e incorporar essas novidades ao seu trabalho. 

Gal sempre soube se atualizar para as próximas gerações, suas performances eram atemporais e sempre arrancava alguma reação do público, seja positiva ou negativa. Ela sempre será lembrada como uma das maiores cantoras brasileiras e seu impacto é percebido até hoje na música nacional e internacional. Gal Costa é e sempre será a maior musa da indústria fonográfica do Brasil.

[Crítica] ‘Midnights’: os sonhos e pesadelos de noites em claro

Para a felicidade dos fãs da loirinha, Taylor Swift lançou seu décimo álbum de estúdio, Midnights, na última sexta-feira (21). O disco conceitual passa por histórias de 13 noites sem dormir ao longo da vida da artista e transita pelas madrugadas, tendo a meia noite como o maior símbolo do projeto.

No anúncio do álbum, Taylor o descreveu como “uma coleção de música escrita no meio da noite, uma jornada através de terrores e sonhos doces. Para todos nós que lançamos e viramos e decidimos manter as lanternas acesas e ir em busca – esperando que apenas talvez, quando o relógio bater às doze… nós nos encontraremos.”

O disco conta com 13 faixas (e 7 faixas bônus), divididas em lado A e B, e com uma única colaboração especial de Lana Del Rey. O projeto tem 6 produtores principais, Jack Antonoff, Jahaan Sweet, Keanu Beats, Sounwave e Taylor Swift. A masterização é feita por Randy Merrill e a mixagem assinada por Șerban Ghenea.

Além de Taylor como escritora creditada, o álbum tem como participações nas letras Jack Antonoff, Jahaan Sweet, William Bowery (pseudônimo do namorado da artista, Joe Alwyn), Keanu Beats, Lana Del Rey, Sam Dew, Sounwave e a atriz Zoë Kravitz.

A primeira faixa de Midnights é Lavender Haze, marcando a entrada do disco como um álbum pop. A música é inspirada na expressão “lavender haze”, que nos anos 50 era associada ao sentimento de estar apaixonada. A artista declarou que viu a frase em um episódio da série Mad Men e achou uma definição muito bonita do amor. A canção fala sobre não abandonar esse sentimento e o proteger a todo custo, ignorando os aspectos negativos que vem com ele. Taylor também cita seu relacionamento de 6 anos com o ator Joe Alwyn e todos os esteriótipos e rumores que teve que ignorar.

A segunda música é Maroon, uma faixa pop que estabelece conexão com a metáfora de cores usada na canção Red, do seu quarto álbum de estúdio. Em Red, a cor vermelha intensa é usada para descrever o fervor do amor, já em Maroon, o tom de vermelho ganha mais complexidades e descreve um relacionamento mais maduro e que de alguma forma foi perdido. 

Anti-Hero é a terceira faixa e lead single do projeto, a canção que aborda as inseguranças da artista tem uma abordagem bem honesta e quase satírica sobre o que ela mais odeia em sua vida. A música ganhou um clipe no mesmo dia do lançamento do álbum que foi escrito e dirigido pela artista. 

Na produção, a persona popstar de Taylor a assombra de várias maneiras e o vídeo contém inúmeras ironias sobre a carreira e vida da cantora. Além disso, Anti-Hero fez mais de 17 milhões de streams no Spotify, debutando no topo do chart global da plataforma e quebrando o recorde maior estreia de um single na história da plataforma.

Seguimos com Snow on The Beach, a canção com a participação de Lana Del Rey. A faixa fala sobre duas pessoas se apaixonando ao mesmo tempo, sentimento que parece tão surreal e mágico que se assemelha com a sensação de ver neve caindo na praia. Snow on The Beach é uma música pop moderna mais calma que mostra os vocais das duas artistas, mesmo com a colaboração de Lana sendo mais discreta do que o esperado. 

You’re on Your Own, Kid é a quinta música do projeto, que acompanha uma pessoa mais jovem em busca do amor. A faixa que vai crescendo sonoramente, debate a solidão da juventude e o destaque vai para a letra na ponte da canção. Nos versos, “You’re on your own, kid; You always have been.” (Você está por conta própria, garoto. Você sempre foi; em português) é possível resumir a intenção da canção.

A sexta música é Midnight Rain, uma faixa pop que apresenta o uso de sintetizadores em seu início e refrão, uma produção bem diferente na carreira da artista. A letra da canção fala sobre se lembrar de um amor passado, em que algumas noites Taylor contempla essa relação que já acabou por suas incompatibilidades.

A sétima faixa é Question…? , que inicia com uma interpolação de Out Of The Woods, do álbum 1989. A canção pop com melodia bem definida, traz na produção elementos diferentes como sintetizadores e palmas. Os versos são a incansável busca de respostas para algumas questões de um relacionamento passado que parecem assombrar a artista.

Vigilante Shit é a oitava música, com a sonoridade mais obscura do projeto, ela aborda o lado da vingança, que lembra muito seu disco Reputation. Na letra escrita unicamente por Taylor Swift, o eu-lírico se vinga de um amor passado e ajuda outras mulheres a fazer o mesmo. A faixa tem tudo para se tornar queridinha pelos fãs, já que vários versos tem potencial para viralizar nas redes sociais. 

Continuamos com Bejeweled, a canção mais animada e com uma óbvia mensagem positiva de Midnights. Nela, a artista sabe muito bem o seu valor e após situações frustradas em seu relacionamento, vai atrás do que realmente merece. O recado é claro, Taylor sabe que pode brilhar em qualquer espaço e qualquer interesse romântico deve entrar na fila pela sua atenção. A produção acompanha a ideia da letra, transportando o ouvinte para um mundo que parece estar cheio de brilho e glitter.

A décima canção é Labyrinth, uma faixa sobre o medo de se apaixonar. Seja por não ter superado um amor antigo ou pela velocidade em que se inicia um novo relacionamento, Taylor exibe seus medos e inseguranças em ter uma nova paixão pelo medo do fim. A produção da música brinca com os vocais da cantora, o que traz elementos interessantes à canção.

O disco segue com Karma, conceito conhecido pelos fãs da artista. A expressão indiana que simboliza que toda ação tem uma consequência, pode ser associada a uma vingança feita pelo universo. Taylor mostra sua versão de karma, que para ela é um sentimento divertido e tranquilizante, mas pode ser para os desafetos de sua carreira um grande problema.

Sweet Nothing é a décima segunda faixa, que mostra um pouco da dinâmica do relacionamento entre Swift e Joe Alwyn, além de ser escrita pelos dois. O namoro deles é mantido em torno de muita privacidade, exatamente pelo caos e curiosidade acerca da vida amorosa da cantora. A canção aborda a tranquilidade e facilidade da relação, além de enfatizar que Joe nunca teve alta cobranças em relação à artista.

A última faixa é Mastermind, que traz o encerramento do projeto com uma canção definidora da personalidade da artista. Na letra, as habilidades de Taylor em controlar e planejar o futuro são usadas para encantar uma nova paixão, mas os fãs sabem que a cantora é conhecida por ser uma verdadeira gênia em planejar sua carreira. Os easter eggs ou pequenas referências em seus clipes e músicas são essenciais e os fãs adoram decifrar todos os enigmas.

Para o lançamento do álbum, Taylor Swift lançou várias versões do disco com capas alternativas e faixas bônus. Midnights (3am Edition) foi a edição para as plataformas de streaming e download digital, que adicionou mais 7 músicas à versão standard. The Great War apresenta teclados sintetizadores bem característicos enquanto descreve um casal enfrentando a “guerra” e dificuldades no relacionamento, Bigger Than  The Whole Sky é uma balada pop que discute a perda de alguém importante e Paris é um pop raiz que fala sobre amor e a cidade do romance.

High Infidelity descreve um relacionamento instável e cercado de infidelidades dos dois lados, Glitch é uma das faixas mais sensuais do projeto e aborda uma amizade que evolui para o amor, assim como o relacionamento da cantora com Joe Alwyn, e Would’ve, Could’ve, Should’ve expressa o arrependimento de um relacionamento passado, tendo muitas referências com a faixa Dear John, escrita para o cantor John Mayer em seu álbum Speak Now. A última faixa bônus é Dear Reader, que como encerramento do disco deluxe tenta dar ao ouvinte alguns conselhos e lições de vida.

Todos os lançamentos de Taylor Swift estão acompanhados de muito sucesso e quebra de recordes, com Midnights não foi diferente. O álbum fez 185 milhões de streams no Spotify em seu primeiro dia, se tornando a maior estreia de um álbum na plataforma. Todas as 13 faixas da edição standard registraram 161 milhões de streams no Spotify, alcançaram o top 13 do chart global do streaming e se tornaram as 13 maiores estreias femininas na história do Spotify.

Midnights também se tornou o primeiro álbum de Taylor a alcançar o topo da Apple Music em mais de 100 países e quebrou o recorde de disco com maior streaming no primeiro dia de lançamento na plataforma. De acordo com Hits Daily Double, o projeto tem a previsão ser o disco mais vendido em uma semana nos Estados Unidos, depois da era dos bundles.

No Metacritic, o disco alcançou a nota 85 com 23 críticas, sendo só duas delas medianas em relação ao álbum. A revista Rolling Stones atribui ao Midnights nota máxima e o descreveu como um “deslumbrante synth-pop”, com letras sobre uma história de amor e um enredo de vingança. Já o New York Times, com a resenha de nota mais baixa para o álbum, apontou a familiaridade da sonoridade com outros projetos da carreira de Taylor e que Midnights seria uma aposta segura na discografia da artista.

[Imagem: Reprodução]

Depois de uma temporada experimentando em outros estilos musicais com Folklore e Evermore, Taylor Swift finalmente abandona o folk alternativo e volta para uma aguardada era pop. Midnights não era um lançamento esperado para tão cedo, já que a cantora vem regravando seus discos nos últimos anos. Mas traz uma boa surpresa para os fãs e movimentação na indústria musical.

Em geral, o destaque do disco vai para o liricismo, habilidade reconhecida no catálogo de Taylor. As letras são o ponto alto da maioria das canções, seja pela ironia ou genialidade nas rimas. Como tema central, a cantora explora a autocrítica, suas inseguranças e sua imagem pública. Mas deixa espaço também para vingança, autoconfiança, paixão e o fim dos relacionamentos. 

Midnights pode ser considerado um álbum de confissões pop, abordando as histórias das melhores e piores noites de Taylor. Na produção, os elementos são sutis, mas suficientes para deixar os ouvintes intrigados. O disco é uma boa adição a sua discografia e age como um check-in de onde a artista se encontra atualmente. O resultado é um projeto pop maduro e honesto, cheio de bons momentos.

Fanatismo: quando o amor de fã sai do controle

Ser fã é dedicar o seu tempo para admirar uma pessoa, grupo, ideia ou até mesmo um objeto. O sentimento que move as pessoas é muito difícil de decifrar e colocar em palavras. Muitas delas concentram suas vidas em torno de seus ídolos, seja criando fãs-clubes, fazendo mutirão de votação nas redes sociais ou acampando por meses nas filas dos shows e nas portas dos hotéis.

Os fãs amam o artista de forma intensa e o consideram uma pessoa próxima, assim os transformando em sinônimo de refúgio ou recompensa. Mas é preciso ter cuidado, há uma linha tênue entre amor e obsessão que pode ser cruzada com muita facilidade. Quando há o abandono da sua individualidade em prol de um artista, essa relação não se torna mais saudável. 

O fanatismo vem desse conceito, quando um limite é cruzado se desperta um estado psicológico de fervor excessivo, irracional e persistente por qualquer pessoa ou tema. Esse estado é perigoso e pode levar simples fãs a pessoas doentes e perigosas.

Outro ponto importante é que as celebridades e artistas, apesar de serem pessoas públicas, não estão a disposição a todo tempo de seus admiradores. Quando há a invasão desse espaço de privacidade, casos de assédio podem surgir. Ninguém pode tentar encostar e agarrar seu ídolo, só porque ele é seu ídolo. Esse é um dos limites frágeis que tornam o simples amor de fã em obsessão.

Desde os anos 60, quando se fala em fanatismo por estrelas da música, uma personalidade logo vem à cabeça: Elvis Presley. O artista sempre carregava hordas de fãs ao seu redor e sua casa, batizada de Graceland, atraia milhares de adoradores de seu trabalho. 

O filme Elvis (2022) de Baz Luhrmann representou em diversas cenas como era o caos provocado pelos fãs, seja em sua primeira apresentação até uma das últimas, dezenas de mulheres gritavam e enlouqueciam pela maneira que Presley dançava e cantava.

Trecho do filme Elvis (2022). [Imagem: Reprodução]

Outro fenômeno da música que provocou o frenesi entre os fãs foi a banda Beatles. Durante suas turnês mundiais que contaram com 18 países, 116 cidades e 250 shows, havia milhares de garotas gritando por eles. Em muitos momentos, os gritos delas chegaram a se sobrepor ao as vozes do quarteto, que na época não contava com equipamentos que amplificam suas vozes tão bem quanto acontece com as bandas atuais. 

A loucura foi tão grande que foi apelidada pela imprensa de Beatlemania, definida com a histeria e gritos agudos dos fãs, tanto em shows quanto durante as viagens do grupo. Há rumores, que os Beatles tipicamente viajavam para esses shows de carro blindado e a banda chegou a adotar clipes promocionais para seus singles para evitar as dificuldades de fazer aparições pessoais em programas de televisão na época.

Fenômeno conhecido como Beatlemania. [Imagem: Reprodução]

John Lennon, um dos integrantes da banda, chegou a se envolver em uma das maiores polêmicas de sua carreira na época. Quando durante uma entrevista ao jornal britânico Evening Standard, o músico disse: “Nós somos mais populares do que Jesus neste momento”. A afirmação, apesar de fazer sentido pela Beatlemania, provocou a ira das comunidades cristãs e até algumas estações de rádio mais tradicionais dos Estados Unidos pararam de tocar músicas dos Beatles.

Infelizmente, Lennon acabou sendo assassinado em 8 de dezembro de 1980 por um fã obcecado. O homem identificado como Mark Chapman, apesar de gostar dos Beatles, teria ficado indignado com as letras de canções como God e Imagine, principalmente por conta das relações feitas com a religião, onde o artista afirmava não crer em Jesus e na Bíblia.

No dia do atentado, o fã chegou a pedir um autógrafo para John Lennon antes de cometer o assassinato. O criminoso foi condenado a uma sentença de pelo menos 20 anos até prisão perpétua e teve todas as oportunidades para pedir sua liberdade negadas.

Memorial em homenagem a John Lennon em Nova York. [Imagem: Reprodução/Globo]

Nas décadas seguintes, muitas agitações de fãs foram comparadas com a Beatlemania, especialmente de boy bands como o One Direction, banda formada no reality show musical The X Factor, em 2010. O grupo que surgiu na época das redes sociais, foi um instante sucesso e quebrou vários recordes, colocando os singles nas paradas de sucesso.

O quinteto original era seguido por admiradores onde quer que fossem, fazendo com que alguns integrantes da banda tivessem dificuldade em lidar com a fama. Na maioria das vezes, tinham que evitar sair dos hotéis em turnês e ficavam trancados a maior parte em suas suítes privadas.

Em 2015, um dos integrantes do One Direction, Zayn Malik, anunciou sua saída da banda e acendeu um importante alerta para os limites da dependência emocional dos fãs. As directioners, como são chamadas as amantes da boy band, colocaram no Trending Topics mundial do Twitter a hashtagcut4zayn”

Os admiradores mais fanáticos se mutilaram e postaram fotos nas redes sociais para chamar a atenção do artista, pedindo desesperadamente o retorno de Zayn ao grupo. A reação extrema desses fãs foi motivo de preocupação de familiares e especialistas, que colocam os adolescentes como um público muito vulnerável quando são obcecados por alguma celebridade.

Directioners é o nome do fandom da boy band, One Direction. [Imagem: Reprodução/Vox]

Na mesma época em que One Direction foi um fenômeno, o cantor canadense, Justin Bieber, também chamava atenção por suas inseparáveis fangirls. A histeria ganhou até o nome de Bieber Fever, caracterizado por ser o estado em que os fãs ficavam obcecados pelo jovem artista.

Atualmente, os conhecidos por seus fãs enlouquecidos são os grupos de K-Pop. Graças a internet e às redes sociais, o ritmo coreano começou a fazer sucesso em todo o mundo e conquistou um verdadeiro exército de fãs para suas turnês. Em premiações, shows lotados e em fancams nas redes sociais, você pode encontrar algum apaixonado pelos grupos BTS, BLACKPINK, EXO, Twice e NCT.

ARMY é o nome do fandom do grupo BTS. [Imagem: Reprodução]

É cada vez mais comum ver essa cultura de fanatismo crescer entre os fandoms, mas é preciso ter cuidado pois esse comportamento pode ter “tendências viciantes” e “ações de perseguição”. A todo tempo os fanáticos por um artista tentam provar sua devoção às celebridades sem se lembrar que os famosos podem errar, como qualquer um, e isso causa um desequilíbrio nos fãs por isso.

Antigamente, era mais difícil para o fã acessar o artista, mas isso mudou com as mídias sociais. Essas plataformas podem se tornar barris de pólvora para a radicalização e fazer com que admiradores ultrapassem os limites. É saudável ser fã, desde que o carinho e admiração pelo artista e seu trabalho não prejudiquem a sua individualidade e rotina para tornarem-se uma dependência.

[Crítica] Renaissance: os hinos de positividade iniciam uma nova era

O tão aguardado comeback da Beyoncé finalmente chegou! Renaissance, o sétimo álbum de estúdio da artista, foi lançado na última sexta-feira (29). O projeto, que é o primeiro ato de uma trilogia, vem sendo muito aguardado pelos fãs após um hiatus de 6 anos da cantora desde seu último disco solo, Lemonade.

Renaissance conta com 16 faixas e participações especiais de Beam, Grace Jones e Tems. Nas redes sociais, Beyoncé compartilhou o significado do projeto feito durante três anos na pandemia, onde a artista declarou na dedicatória do disco que foi uma época em que mais se achou criativa.

Criar este álbum me permitiu um lugar para sonhar e encontrar fuga durante um momento assustador para o mundo. Isso me permitiu sentir-me livre e aventureiro em uma época em que pouco mais estava se movendo. Minha intenção era criar um lugar seguro, um lugar sem julgamento”, contou a cantora.

O projeto tem doze produtores principais, A. G. Cook, Boi-1da, Guilty Beatz, Jahaan Sweet, Labrinth, The Neptunes, S1, Skrillex, Tate Kobang, The-Dream, Tricky Stewart e a própria Beyoncé. A masterização é feita por Colin Leonard e a mixagem assinada por Stuart White.

A primeira faixa do Renaissance é I’m That Girl, que usa o sample da música Still Pimpin de Tommy Wright III, Mac T-Dog e Princess Loko, lançada em 1994. A canção dançante inicia o álbum com uma mensagem bem simples do poder feminino. 

Nos versos, “It’s not the diamonds, It’s not the pearls, I’m that girl, It’s just that I’m that girl” (Não é os diamantes, não é as pérolas, eu sou aquela garota, é que eu sou aquela garota; em português) a artista exemplifica que não é necessário coisas de valor para lhe agregar poder.

Cozy é a segunda música do álbum e ela fala sobre estar confortável, sendo em ser quem você é, com seu próprio corpo e com sua cor. Com uma batida mais relaxada, a artista entrega novamente uma mensagem positiva para seus fãs. A canção usa como samples as faixas Get With U de Liddell Townsell e M.T.F. e Unique de Danube Dance e Kim Cooper.

Além disso, Cozy usa trechos do vídeo Bitch I’m Black da TS Madison, personalidade americana muito conhecida por ser a primeira mulher trans negra a produzir e apresentar um reality show.

Seguimos com Alien Superstar, uma faixa com batida eletrônica sensual e que se inicia com um sample da canção Moonraker do Foremost Poets, lançada em 1998. A música explora toda a sensualidade da artista e comunica com o público o poder de ser única ao som da faixa perfeita para se ouvir na pista de dança.

O destaque de Alien Superstar vai para a interpolação de I’m Too Sexy do grupo Right Said Fred no refrão da música, que destaca a genialidade da artista em usar uma canção muito conhecida de maneira tão revigorante. O sample de Unique de Danube Dance e Kim Cooper se repete e ao final da faixa é possível ouvir parte do discurso Black Theater da escritora e atriz Barbara Ann Teer.

Ensaio de divulgação do álbum Renaissance. [Imagem: Reprodução/Beyonce.com]

Cuff It é a quarta faixa, com sonoridade disco e synth funk (a mistura do uso de sintetizadores com a batida rítmica do funk), a música se desenvolve de maneira divertida e romântica. Essa é uma Beyoncé que só quer se divertir e não tem nada que irá prendê-la. A canção tem interpolação de Ooo La La La da Teena Marie e sample de Square Biz da mesma cantora.

A quinta música do álbum é Energy com participação de BEAM, cantor jamaicano e americano. A faixa com sonoridade dancehall e eletrônica, mistura as partes melódicas cantadas por Beyoncé e os versos de BEAM com o afrobeat. Na letra pode ser encontrar um incentivo para dançar e se divertir, mantendo sempre a energia alta.

Energy tem sample de Milkshake e Get Along With You da cantora Kelis e Explode de Big Freedia, que faz a transição com a próxima canção do disco. Seguimos com Break My Soul, lead single do álbum, que conta com o samples do hit dance dos anos 90, Show Me Love, da cantora Robin S. e novamente a canção Explode de Big Freedia, lançada em 2014. 

A música alcançou o 7° lugar na Billboard Hot 100 e permaneceu por 5 semanas no chart. Break My Soul que chegou para anunciar a volta da artista, agora na sonoridade dance-pop, se manteve na proposta de ser um hino de positividade em tempos confusos.

Capa alternativa do disco. [Imagem: Reprodução/Beyonce.com]

Church Girl é a sétima faixa do Renaissance, onde a artista explora nos versos da música sua religiosidade e suas raízes do sul dos Estados Unidos. Com batidas animadas do bounce é celebrado a liberdade em todos os seus sentidos. A canção usa os sample de Center of Thy Will das The Clark Sisters, Drag Rap dos The Showboys e interpolações de Where They At do DJ Jimi e Think (About It) da Lyn Collins.

Seguimos com Plastic Off The Sofa, a música mais lenta e R&B, mas sem abandonar o upbeat eletrônico. Nela, Beyoncé fala sobre amor e as qualidades de seu interesse romântico, podendo ser até uma faixa dedicada ao seu marido, Jay-Z. Pelo caráter mais intimista da música, os vocais da cantora se sobressaem e são o grande acerto de Plastic Off The Sofa.

A nona canção é Virgo’s Groove, um clássico disco com letra mais romântica  dedicada ao amor da vida da artista. Com vocais e melismas arrepiantes, por mais de seis minutos podemos ouvir Beyoncé brincar com sua técnica vocal em uma faixa mais tranquila e pop.

Move é a próxima canção com a participação de Grace Jones e Tems. A faixa tem influência do afrobeat e bounce e explora os dois significados do termo “move”, em inglês, que pode significar o ato de se mexer e dançar, ou de sair da frente e abrir espaço para alguém mais importante. 

Seguimos com Heated, uma música mais R&B que conta uma menção e homenagem a uma das pessoas que inspiraram o Renaissance, Uncle Johnny. Ele, que era sobrinho da mãe de Beyoncé, teve participação na criação da artista e no início da sua carreira ajudava a criar designs e vestidos para serem usados por ela.

Em 2019 no GLAAD Awards, a cantora também dedicou o prêmio ao tio que morreu por complicações do HIV nos anos 90. No encarte do disco, Beyoncé agradece e explica a importância de Johnny. “Ele foi minha ‘madrinha’ e a primeira pessoa a me expor a muita música e cultura que servem de inspiração para este álbum.”, declara a artista.

Foto que aparece no encarte do álbum com agradecimentos ao Uncle Johnny.  [Imagem: Reprodução/Beyonce.com]

A décima segunda canção é Thique, uma faixa mais pop e trap, mas sem perder a sonoridade eletrônica. Nos versos se encontram rimas sobre dinheiro e sensualidade, com a exaltação do corpo da artista.

O álbum segue com All Up In Your Mind, uma das músicas mais diferentes do projeto e que coloca a cantora no universo ainda não explorado por ela, o hyperpop. Com letra bem pop falando sobre amor, o destaque vai para os vocais e performance de Beyoncé que combinam muito com o gênero.

America Has a Problem mistura a sonoridade de sintetizadores com o rap e usa o sample de America Has a Problem (Cocaine) de Kilo Ali, lançada em 1990. A faixa, apesar do nome, não tem nenhuma crítica política e deixa espaço para a cantora rimar de maneira divertida e interessante.

A penúltima canção é Pure/Honey, a faixa que é dividida em duas fases e gêneros. Na primeira parte, Pure, a artista apresenta rimas rápidas acompanhadas de uma batida perfeita para as boates. Já na parte Honey, Beyoncé se envolve completamente no soul e funk seguidos de vocais de outro mundo. A música tem os samples de Cunty da Kevin Aviance, Miss Honey de Moi Renee e Feels Like de MikeQ e Kevin JZ Prodigy.

O álbum termina com Summer Renaissance, a faixa que tem no refrão uma interpolação de I Feel Love de Donna Summer, um clássico do disco dos anos 70. A música encerra o álbum mais experimental da carreira da artista como o fim de um sonho. Levando os ouvintes a outras camadas da voz de Beyoncé em um ritmo que ninguém esperava vê-la dominando.

[Imagem: Reprodução/Beyonce.com]

Horas após o lançamento, Renaissance alcançou o topo do Apple Music em mais de 100 países, se tornando o primeiro disco feminino a conseguir o feito em 2022. No Spotify, o projeto teve a maior estreia de um álbum de uma artista feminina na plataforma este ano, com mais de 43 milhões streams

De acordo com o Hits Daily Double, o álbum tem previsão de vender entre 275 e 315 mil unidades, colocando o Renaissance em primeiro lugar nas paradas musicais americanas. Se conseguir chegar ao topo, Beyoncé se tornará a primeira artista feminina a colocar um disco nessa posição em 2022.

No metacritic, o projeto está com nota 93, acumulando 15 avaliações positivas e superando a avaliação de seu álbum anterior, Lemonade, que tem a nota 92. Na review da revista Rolling Stones, a artista foi aclamada por sua habilidade de dar aos ouvintes novos hinos pop e as faixas lentas e sensuais que todos amam e esperam nos projetos da cantora. 

A faixa Virgo’s Groove ganhou o selo de ‘Melhor Nova Música’ do site Pitchfork, destacando a música disco-funk como uma das melhores na carreira da Beyoncé. Na crítica de Renaissance, o álbum conquistou a nota 9 e a atribuição de ‘Best New Music’, dando ênfase no disco como uma rica celebração da música das boates e seu espírito emancipatório.

Em geral, o novo álbum se reinventa do que esperávamos no futuro da discografia da cantora. Após Lemonade, um dos projetos mais pessoais da artista, Renaissance reúne diversão, leveza e sensualidade nas faixas. Beyoncé aposta em um novo gênero musical e o mistura com outros ritmos, tornando o disco uma extensão de sua personalidade.

O uso correto de samples também merece destaque, pois demonstra a habilidade da cantora em transformar as interpolações e trechos de outras músicas em algo tão original e criativo quando aparece em Renaissance. Quem imaginou que após a faixa Way 2 Sexy de Drake e Young Thug o refrão da música I’m Too Sexy poderia soar de fato sensual e não cafona com em Certified Lover Boy? Só com os vocais de Beyoncé mesmo.

E falando em voz, a produção vocal do álbum está entre um dos melhores da artista, levando o ritmo eletrônico do house e disco a outros níveis. As faixas são conectadas não só pela sonoridade coesa do projeto, mas também em belas transições que o colocam na estética de um DJ unindo músicas para uma pista de dança.

Renaissance se estabelece como o início de uma trilogia animada e empolgante. É impossível ouvir o projeto e não se sentir contaminado ao dançar e melhorar o humor de quem está ouvindo. Assim, o álbum mais experimental de Beyoncé cumpre a promessa de nos levar a um lugar de exploração e liberdade.

O Auto-Tune como ferramenta criativa na música

Desde a estreia do programa TVZ com a apresentação de Pedro Sampaio, o artista começou a sofrer críticas por suas performances com o uso da ferramenta de Auto-Tune que deixam sua voz mais robotizada. Em entrevista para a revista Rolling Stones, Pedro se abriu sobre como enxerga o uso do efeito.

Muita gente ainda demoniza o auto-tune, mas são pessoas que não entendem do que estão falando, porque ele é usado mundialmente e eu uso de forma escancarada desde o início da minha carreira, faz parte da estética da minha voz“, afirma o DJ e produtor.

O Auto-Tune nada mais é do que um plug-in comumente usado por produtores dentro do estúdio, criado em 1997, a ferramenta inicialmente tinha o propósito de corrigir a afinação de cantores e instrumentos musicais. Mas não demorou muito para que outros propósitos para o recurso surgissem, quando a ferramenta é usada de forma exagerada ela gera um efeito robótico na voz parecido com o uso de sintetizadores.

Um ano após o lançamento do auto-tune, a cantora americana Cher lançou uma das primeiras músicas comerciais em que é possível identificar o efeito mais robotizado. A faixa Believe foi pioneira em usar a ferramenta de maneira criativa e a distorção de voz que foi imitada por outros artistas ficou conhecida como o “Efeito Cher”.

O single da cantora americana atingiu o topo das paradas americanas e se tornou uma das canções mais vendidas fisicamente de todos os tempos, com mais de 11 milhões de cópias. Além disso, a técnica usada na faixa mudou a história da música pop e os gêneros do rap e trap.

Nos anos 2000, diversos artistas da cena hip-hop aderiram ao uso do auto-tune, o destaque entre eles foi o rapper norte-americano T-Pain. Com o lançamento de seu álbum de estreia, Rappa Ternt Sanga, em 2005, o artista ficou conhecido pelo seu uso da ferramenta e criou sua própria estética vocal única no cenário do rap.

Devido ao T-Pain, o auto-tune caiu nas graças de grandes artistas, como Snoop Dogg, Lil Wayne e Kanye West, que até dedicou o álbum 808s and Heartbreak para explorar o efeito. No pop, a cantora Britney Spears também usou a ferramenta para modular sua voz em seu álbum Blackout e a banda Black Eyed Peas investiu pesado no auto-tune na canção Boom Boom Pow para atingir uma sonoridade futurista.

Mas se engana quem pensa que o auto-tune foi bem recebido por todos os artistas e a maioria do público. Em 2009, o rapper Jay-Z lançou a faixa D.O.A (Death of Auto-Tune) criticando exatamente o uso exagerado da ferramenta e a popularização da técnica no hip-hop. No trecho “Get back to rap, you T-Pain’n too much” (Volte para o rap, vocês estão como o T-Pain demais; em português), o rapper chega a citar o artista que iniciou o movimento e critica quem usava o auto-tune de forma não criativa.

Além disso, muitas críticas se somam ao fato de que quem usa a ferramenta não sabe cantar. Por ser uma ferramenta de afinação, em teoria, qualquer pessoa poderia gravar uma canção e soar com vocais perfeitos. Nessa época, surge ainda mais uma valorização por cantores que não usavam a ferramenta e eram publicamente contra o auto-tune.

Christina Aguilera foi uma dessas pessoas e chegou a passear pelas ruas de Los Angeles com uma blusa escrito “Auto Tune is for pussies” (Auto Tune é para covardes, em português). Anos depois, em entrevista para a rádio SiriusXM, a cantora admitiu que a ferramenta poderia ser usada de forma criativa, tendo inclusive experimentado com o auto-tune em seu álbum futurista, Bionic.

Christina Aguilera usando blusa contra o uso de Auto-Tune. [Imagem: Reprodução/Reddit]

De maneira geral, o uso do auto-tune se consolidou uma prática geral na música quando se fala de afinação. A maioria das músicas mainstreams passam pelo plug-in, o que constrói na indústria da música pop a meta de vocais perfeitos e a minimização de qualquer erro natural.

Até porque é importante lembrar que em faixas gravadas, bem antes da criação do Auto-Tune, já existiam técnicas que mudavam e melhoravam sutilmente a voz dos artistas.The Beatles duplicavam seus vocais nas músicas para deixar a voz mais encorpada nas canções, John Lennon mudava seu timbre de voz natural ao diminuir a velocidade das gravações e reproduzi-las por um amplificador específico e  Elvis Presley usava o eco e delay ao seu favor nas músicas.

Os tais vocais “naturais” são dificilmente encontrados e não são sinônimo de sucesso. O uso do auto-tune não invalida talento de nenhum artista e há quem diga que com a menor preocupação de atingir notas extremamente perfeitas, sobra mais tempo para se dedicar a outros elementos da música ou na entrega de uma performance.

O que foi uma tentativa de T-Pain para soar diferente de outros rappers anos atrás, se tornou atualmente uma das técnicas mais usadas no trap, subgênero musical do hip-hop e rap. Os artistas que fazem parte do gênero,  usam o auto-tune para criar melodias e unir as rimas com partes mais cantadas.

Travis Scott em estúdio com o cantor James Blake. [Imagem: Reprodução]

Quavo, Future, Migos e Young Thug são alguns dos rappers que montaram suas estéticas vocais usando os efeitos da ferramenta. Os vocais do Travis Scott conhecidos por soarem bem robóticos ou como de algo de outro mundo unem o auto-tune com outras técnicas de delay, phasing e outros plug-ins que modulam a voz. Esses efeitos formam o estilo único do artista e caracterizam o gênero musical em que atuam.

É inegável afirmar que o Auto-Tune mudou o jeito de fazer música desde sua criação e popularização. Poucas invenções na indústria fonográfica foram tão icônicas e discutidas pelos artistas e público depois de tantos anos. Seja pelas críticas do caráter artificial trazidos pela afinação perfeita ou pelo seu uso exagerado na modulação vocal, a ferramenta encontrou novas maneiras de ser usada e ainda tem fãs no mundo dos cantores.

Se o auto-tune cair em desuso na próxima década, o que parece bem improvável, com toda certeza vai ter marcado uma geração de músicas nos anos 2000 e no hip-hop, assim como os teclados sintetizadores são lembrados nas canções dos anos 80 e até imitados atualmente.

[Crítica] ‘Twelve Carat Toothache’ mostra os altos e baixos de Post Malone

Na última sexta-feira (03), foi lançado o quarto álbum de estúdio do rapper Post Malone, intitulado Twelve Carat Toothache. O projeto conta com 14 faixas e participações especiais de Roddy Ricch, Doja Cat, Gunna, Fleet Foxes, The Kid LAROI e The Weeknd

Após três anos do seu último disco, Hollywood’s Bleeding, Malone volta com o álbum mais curto de sua carreira, mas nas palavras do mesmo, com menos faixas fillers que podem ser encontradas em seus projetos anteriores. Em entrevista à revista Billboard, o rapper afirma que as novas músicas falam mais sobre como ele está se sentindo no momento. “É sobre os altos e baixos, a desordem e essa bipolaridade de ser um artista hoje no mainstream”, conta Malone.

O disco conta com 8 produtores principais, Andrew Bolooki, Brian Lee, Charlie Handsome, Jasper Harris, Louis Bell, Omer Fedi, Watt e o próprio Post Malone. A masterização é feita por Mike Bozzi e a mixagem é assinada por Louis Bell e Manny Marroquin.

Capa e tracklist do álbum Twelve Carat Toothache. [Imagens: Reprodução/Genius]

A primeira faixa do disco é Reputation, sendo a música mais melancólica e que tem como elementos principais o piano acompanhado dos vocais de Malone. A canção que introduz o projeto discute sobre a reputação do rapper e, principalmente, sua relação com a fama. 

Em versos como “You’re the superstar, entertain us” (Você é o superstar, nós entretenha; em português), não fica claro se ao longo da música o desabafo é para os seus fãs ou um antigo amor. Mas mesmo assim, é possível ver que ele coloca toda a sua vulnerabilidade na música e acerta o tom para o resto do disco. 

Seguimos com Cooped Up com participação de Roddy Ricch, lançado como segundo single do álbum. A faixa mais hip-hop com refrão viciante segue o tema da fama e como o rapper se sente engaiolado nessa situação. Post Malone e Roddy Ricch já trabalharam anteriormente no remix da música Wow. Em Cooped Up, o verso de Roddy não impressiona, deixando o destaque para o refrão e ponte cantados por Post. 

A música atingiu a posição 29 em sua estréia na parada musical Billboard Hot 100 e permaneceu somente duas semanas no chart. O videoclipe de Cooped Up foi lançado em maio desse ano e tem como espaço principal apenas um cômodo em que Post Malone canta seus versos, evidenciando a ideia de se sentir enclausurado em sua vida de superstar.

A terceira música do disco é Lemon Tree, outra faixa mais vulnerável do artista. Acompanhada de violão, o rapper discute com a vida a falta de sorte que parece estar enfrentando. Nos trechos “Life is pretty sweet, I’m told; I guess I’m shit outta luck, growin’ a lemon tree” (A vida é bem doce, me disseram; Acho que estou sem sorte, cultivando um limoeiro, em português), Malone brinca com a ideia de como a vida deveria ser doce para ele, mas ultimamente ele se sente com a vida bem azeda.

Wrapped Around Your Finger é a quarta faixa com elementos mais pop e animados do disco. Nela o artista admite como estava completamente envolvido em um relacionamento do passado e expõe toda sua personalidade de apaixonado. Seguindo o álbum, passamos para I Like You (A Happier Song) com participação de Doja Cat

A música como diz o título é bem animada e com uma batida contagiante, e a repetição do refrão “I like You, I do” é daqueles de ficar grudado na cabeça por dias. A dinâmica dos dois artistas na música é bem legal, com cada um cantando de sua perspectiva nesse possível relacionamento apaixonado. I Like You (A Happier Song) começou a ser promovida nas rádios, seguido do lançamento do disco, e se caracteriza como o terceiro single da era.

A sexta faixa de Twelve Carat Toothache é I Cannot Be (A Sadder Song) com participação do rapper Gunna. A música que representa o oposto da anterior, fala sobre um relacionamento que a outra pessoa está atrasando e segurando o artista de maneira negativa. Apesar da letra mais triste, a faixa é um hip-hop animado com a cara do Post Malone.

Seguimos com Insane, a canção com orientações mais trap do projeto e que tem grandes chances de virar o próximo single. Nela o rapper rima sobre dinheiro e mulheres sem maiores preocupações em cima de uma batida rápida e viciante.

Love/Hate Letter To Alcohol é a oitava faixa do álbum e conta com a participação da banda Fleet Foxes. A música se inicia com um coro de vozes e como diz o título se desenrola em um desabafo da relação de amor e ódio com o álcool. Nela fica explícito os problemas que o artista tem com a bebida, mas essa ainda é a sua forma de encarar a tristeza. Em sua participação no Saturday Night Live em maio deste ano, a faixa ganhou sua primeira apresentação ao vivo.

Já a nona música do projeto é Wasting Angels com The Kid LAROI, a faixa mais lenta e com orientações pop, coloca os dois artistas para discutir a relação com a fama e reputação. Vale destacar como Malone e LAROI possuem similaridades vocais, fazendo até ouvintes atentos se questionarem quais são de fato os versos de cada um.

O álbum continua então com Euthanasia, que conta com o sample da música de 2003, Pink & Blue do OutKast. A faixa que faz uma referência clara a eutanásia, prática médica que consiste em abreviar a vida de um paciente em estado terminal ou que esteja sujeito a dores e intoleráveis sofrimentos físicos ou psíquicos. Em uma das músicas mais sombrias do projeto, Malone então fala sobre a ideia de sua própria morte e fantasia sobre uma morte indolor em que possa encontrar um coro de anjos.

When I’m Alone é a décima faixa do Twelve Carat Toothache, com a batida rápida da bateria acompanhada de guitarra e voz, essa música mistura pop e rock ao mesmo tempo. When I’m Alone então abre espaço para o rapper falar sobre sua infidelidade em um relacionamento anterior.

[Imagem: Reprodução/Billboard]

Depois de uma faixa mais animada, Post volta a uma música mais lenta e introspectiva. Waiting For A Miracle é novamente uma das canções que discute a morte de alguma maneira, seja no verso “And everything done for the dead after they’re dead, is for the living” (E tudo que é feito para os mortos após eles estarem mortos, é para os vivos; em português) ou quando fala sobre suicídio.

Mudando totalmente de estilo, a penúltima música do álbum, One Right Now, conta com a participação de The Weeknd. Lançada como primeiro single do projeto ainda em 2021, a canção tem clara influência do pop dos anos 80 com uso de sintetizadores. A faixa tem relação com os trabalhos mais recentes de The Weeknd, mas não necessariamente se encaixa no disco de Malone. One Right Now estreou na sexta posição na Billboard Hot 100 e ganhou um videoclipe no mesmo mês de lançamento.

O álbum encerra com New Recording 12, Jan 3 2020, uma gravação caseira e demo de parte da letra de Euthanasia. No áudio de 1 minuto e meio, é possível ouvir Malone cantando somente acompanhado de seu violão. Essa maneira de terminar o projeto com uma demo, evidencia que essas músicas mais sombrias e reflexivas do artista, foram de pensamentos recorrentes de Post Malone nos últimos anos.

Em relação a crítica especializada, o site metacritic atribuiu nota 66 ao álbum baseado em apenas seis reviews. Com maioria de resenhas positivas, as revistas Rolling Stone e NME destacam o sucesso do artista em compartilhar sua verdade, em um disco mais reflexivo que segue com a cara do artista.

Twelve Carat Toothache estreou no Spotify com mais de 30 milhões de streams e em comparação com seu antecessor Hollywood’s Bleeding, que fez 74 milhões em seu primeiro dia, o número parece desapontar. Já em relação às projeções de venda, a Hits Daily Double previu cerca de 115,000 a 130,000 mil unidades vendidas, quantidade também inferior ao disco anterior, mas que pode dar a possibilidade do terceiro número 1 de Post Malone na Billboard 200.

De fato, o lançamento de Twelve Carat Toothache não foi cercado de muita promoção e singles que fizessem muito barulho como os trabalhos anteriores de Malone. O projeto também sofreu alguns adiamentos, Post anunciou que estava trabalhando em um álbum novo durante live tributo a banda Nirvana ainda em 2020 e em 2021 seu empresário chegou a postar no Instagram que talvez teria dois discos do rapper naquele ano. Infelizmente, nenhum novo projeto ganhou um anúncio e em julho de 2021, o single Motley Crew foi lançado, mas a música não faz parte de Twelve Carat Toothache.

A menor quantidade de faixas é um fator que pode prejudicar o número de streams do disco, mas como citado anteriormente, a escolha do rapper foi selecionar o que considerava as melhores músicas para a edição final. O álbum foi claramente pensado como um todo, desde as temáticas das músicas que se cruzam a todo momento até as transições entre as faixas.

Twelve Carat Toothache talvez seja um dos discos mais tristes da carreira de Post Malone, nele é possível ver que mesmo após o sucesso do artista, ele prefere evidenciar seu sofrimento, vícios, problemas com drogas e álcool, e a relação ambígua com a fama. Para os fãs do rapper, o álbum provavelmente não decepcione, pois apesar dos assuntos mais sombrios, não se afasta da essência musical de Malone.

Cópia física do álbum novo de Post Malone. [Imagem: Reprodução/UMusic]

O destaque de Twelve Carat Toothache ainda vai para as faixas mais energéticas como Love/Hate Letter To Alcohol, Insane, Cooped Up e I Like You (A Happier Song), deixando algumas outras participações e músicas solos mais esquecidas. Pelas especulações e críticas, talvez o projeto não seja um grande sucesso nas paradas musicais e número de streams, mas essa não parece ter sido a intenção do artista.

Depois de algumas eras anteriores bem sucedidas e várias aparições no topo das paradas, Post Malone fez seu comeback inspirado em um relato super honesto sobre seus sentimentos e impressões sobre sua vida atual. Para isso, Twelve Carat Toothache cumpre seu papel e vale a pena pelo seu poder de reflexão. E o trabalho mais curto talvez indique que essa seja apenas uma das partes iniciais de seus lançamentos futuros.

Jack Harlow: a mistura de carisma e talento que o levaram ao topo

Se você está nas redes sociais, provavelmente já ouviu falar de Jack Harlow, seja pelas suas músicas virais ou pelo carisma do artista. O rapper que teve seu momento de ascensão em 2020, hoje vive seu melhor momento na carreira e com sua personalidade conquistadora não para de aparecer na mídia. Afinal, quem é Jack Harlow? E como ele se tornou uma das maiores promessas do cenário do rap americano?

Harlow nasceu em 1998 na cidade de Louisville, Kentucky. Desde seus 12 anos sempre foi apaixonado pelo hip-hop e com essa idade começou a gravar músicas no seu quarto, postando na plataforma SoundCloud para compartilhar com seus colegas. Na época, gravou algumas mixtapes com amigos sobre o nome de Mr. Harlow. Extra Credit foi um desses projetos que chegou a ser lançado independentemente, mas não pode ser mais encontrado em nenhum serviço de streaming.

Em 2015, o rapper lançou seu primeiro EP comercial, The Handsome Harlow, com a gravadora independente de Louisville, sonaBLAST! Records. Pelo sucesso de seus projetos durante o ensino médio, Jack ainda conseguiu esgotar alguns shows em espaços populares da sua cidade.

Já em 2016, um mês após se formar no ensino médio, o artista lançou outra mixtape, intitulada 18, pela gravadora e coletivo musical Private Garden Records, fundada por Jack Harlow e The Homies. O projeto com 8 faixas teve participações de Otis Junior e Nemo Achida e como singles, Never Woulda Known, featuring Johnny Spanish, e Ice Cream.

Capa da mixtape 18 de Jack Harlow. [Imagem: Reprodução/Amazon]

No ano seguinte, Harlow lançou dois singles, Routine e Dark Nigth, sendo o último acompanhado de um videoclipe por ser o lead single do álbum. Os lançamentos foram para mais uma de suas mixtapes, essa chamada de Gazebo. Para promover o projeto, o rapper chegou a fazer uma turnê que incluía 14 cidades dos Estados Unidos, chamada de Gazebo Tour.

Pensando no futuro da sua carreira, Jack Harlow então se mudou para Atlanta, onde conheceu seu conterrâneo KY Engineering e construiu uma relação de trabalho com ele. Foi a partir desse encontro que o artista pôde conhecer o DJ Drama, que ficou impressionado com o estilo único do rapper. Em agosto de 2018, Harlow anunciou a assinatura com a Atlantic Records através da gravadora de DJ Drama e Don Cannon, Generation Now.

Para celebrar a parceria, foi lançado o videoclipe de SUNDOWN, lead single do seu próximo projeto, a mixtape Loose. O disco com 13 faixas contou com a participação dos rappers CyHi the Prynce, K Camp, 2forwOyNE e Taylor. No final de 2018, o artista embarcou em uma turnê pela América do Norte chamada The Loose Tour. Com o sucesso do single, o álbum colocou Jack em um cenário de conhecimento nacional e conquistou a crítica. Loose chegou a ser indicada no BET Hip Hop Awards de 2019 na categoria de Melhor Mixtape.

Apesar de não serem singles, as faixas PICKYOURPHONEUP com participação do  K. Camp, CODY BANKS, SYLVIA featuring 2forwOyNE e DRIP DROP em parceria com Cyhi The Prynce, ganharam videoclipes no início de 2019.

Desde 2016, Harlow vinha lançando um projeto por ano, apostando em uma constância para atingir cada vez mais público. Em 2019 não foi diferente, lançou o lead single THRU THE NIGHT em parceria com o cantor Bryson Tiller. A faixa antecipou a nova mixtape do artista, intitulada Confetti.

Com 12 faixas e participações de 2forwOyNE and EST Gee, o projeto ainda contou com os singles não oficiais, HEAVY HITTER, GHOST, WARSAW com participação de 2forwOyNE, RIVER ROAD e WALK IN THE PARK

Com a chegada de 2020 mais lançamentos foram programados para o artista, mas dessa vez algo mudaria sua carreira. Em janeiro, era lançado o single WHATS POPPIN antecedendo o seu segundo EP, Sweet Action. O videoclipe, lançado junto a faixa, foi produzido por Cole Bennett do canal Lyrical Lemonade, que já trabalhou com gigantes da indústria, como Eminem e Juice WRLD.

WHATS POPPIN tornou-se o maior viral da rede social TikTok, sendo usada em diversas trends do aplicativo. Vale lembrar que no início de 2020 a rede social viveu um de seus maiores momentos de ascensão, impulsionando o nome de vários artistas, como Doja Cat e Megan Thee Stallion.

A versão original do single alcançou a 8° posição na Billboard Hot 100 e cinco meses depois, a canção ganhou um remix com a participação de DaBaby, Tory Lanez e Lil Wayne. Associada a grandes nomes, a música fez ainda mais sucesso atingindo o segundo lugar na parada musical da Billboard. Além disso, WHATS POPPIN foi indicada no Grammy Awards de 2021 na categoria, Melhor Performance Rap

Foi nesse momento que Harlow passou de um artista local em ascensão para um dos artistas revelação de 2020. No final do mesmo ano, o rapper anunciou o lead single, Tyler Herro, para o seu álbum de estreia intitulado Thats What All They Say. O primeiro single do projeto não se igualou ao sucesso anterior e apenas conseguiu a 34º posição na Billboard Hot 100.

Já o disco com 15 faixas contou com grandes figuras da indústria musical, como Lil Baby, Big Sean, Chris Brown, Adam Levine, Bryson Tiller, EST Gee e Static Major. As duas versões de WHATS POPPIN foram incluídas no projeto e o álbum no seu lançamento alcançou a 5° posição a Billboard 200, vendendo 51 mil cópias. Outros dois singles foram promovidos, Way Out com participação de Big Sean e Already Best Friends com Chris Brown.

Tentando se manter como figura presente no mainstream, Jack colaborou com artistas como G-Eazy, Eminem, Ty Dolla $ign, Saweetie e French Montana. Até que uma das suas participações se tornou seu próximo sucesso, a aclamada INDUSTRY BABY de Lil Nas X.

A canção atingiu o número 1 na Billboard Hot 100 em 2021, sendo essa a primeira vez de Jack Harlow no topo do chart. INDUSTRY BABY ganhou indicação no Grammy 2022 na categoria Melhor Performance de Rap Melódico e o verso de Jack foi considerado por muitos da crítica como um dos pontos altos da música.

No início de 2022, Harlow começou a preparar o caminho do lançamento de seu segundo álbum, Come Home The Kids Miss You. O lead single do disco, Nail Tech, alcançou a 18°posição na Billboard Hot 100 e ganhou reconhecimento de um dos maiores nomes do rap, Kanye West.

Em postagem já excluída do Instagram, Kanye elogiou o talento nas letras de Jack, dizendo que ele realmente consegue rimar e é um dos top 5 rappers atualmente. Harlow não escondeu sua felicidade no Twitter, já que West é um dos seus grandes ídolos e inspirações na música.

Tradução: “Isso aqui…é um dos melhores momentos de toda a minha vida…feliz que todos vocês puderam assistir da primeira fila … de repente todo o ódio não significa nada… imagine seu herói dizendo isso sobre você… Eu poderia chorar”

Os dois acabaram colaborando para o álbum de Kanye, Donda 2, em uma faixa chamada Louie Bag. Ela não pode ser encontrada em nenhum streaming convencional, já que só foi disponibilizada nos serviços da Stemplayer, dispositivo criado por West. Apesar disso, Harlow participou de uma das grandes performances ao vivo para promoção do disco, realizadas em um estádio em Miami.

Apresentação da música Louie Bag no estádio LoanDepot Park em Miami. [Imagem: Reprodução/Good Music]

Meses após o primeiro single de Come Home The Kids Miss You, Jack postou uma prévia em estúdio do que seria seu próximo hit viral. O vídeo que mostrava o refrão da canção First Class viralizou imediatamente nas redes sociais, principalmente, pelo uso do sample de Glamorous da cantora Fergie.

Uma semana depois a música foi lançada e estreou no primeiro lugar da Billboard Hot 100, sendo essa a segunda vez do artista no topo e sua primeira com uma canção solo. Aproveitando o momento de sucesso, Harlow finalmente lançou seu segundo álbum de estúdio com participações de Pharrell Williams, Drake, Justin Timberlake e Lil Wayne.

O projeto recebeu críticas mistas e no site do Metacritic ganhou nota 52, não impressionando a Pitchfork que deu a baixíssima nota de 2.9 e atribuiu o álbum como uma das declarações mais insípidas e vazias da história pop recente.

Dá para notar que Jack Harlow tem hits, conquistou as paradas musicais e seu talento no rap é inegável. Mas nem todos esses elementos justificam sua ascensão à fama nos últimos dois anos. Jack ganhou muitos admiradores por seu carisma e confiança, que o fizeram ser considerado um dos rappers mais bonitos do momento.

Talvez a primeira vez que você tenha visto Harlow foi quando partes da entrevista do artista com a comediante Amelia Dimoldenberg ganharam as redes sociais. No vídeo que simula um encontro entre os dois, ele exibiu sua personalidade paqueradora, cheio de brincadeiras e gestos românticos.

O público foi à loucura com esse lado do artista e, frequentemente, Jack aparece em vídeos flertando e desconcertando mulheres famosas. No tapete vermelho do BET Awards em 2021, ele viralizou em um vídeo cumprimentado a  rapper Saweetie e no Met Gala deste ano em entrevista com a youtuber Emma Chamberlain aconteceu o mesmo.

E parece que o carisma do rapper vai o levar até as telas do cinema, já que Harlow foi confirmado no elenco do reboot do clássico de 1992, Homens Brancos Não Sabem “Enterrar”. Na sua primeira audição para o filme, o artista conseguiu impressionar os diretores e executivos o suficiente para interpretar um dos protagonistas, o personagem Billy Hoyle.

Fica evidente que Jack Harlow construiu seu caminho na indústria musical com muita constância e lançamentos frequentes. Quando finalmente algo chegou ao mainstream, o artista soube que era seu momento. Ele parece ter um plano claro de como vai levar a vida da fama, sempre unindo seu carisma com seu trabalho. Essa mistura o tornou uma figura sólida em dois anos e o cenário parece bem promissor para o futuro.

Sleeper Hits: conheça algumas músicas que demoraram para estourar

Às vezes na indústria musical, existe um fenômeno chamado Sleeper hits, que são as músicas que se tornam um sucesso depois de anos ou meses que foram lançadas. Com a internet e as redes sociais, uma canção pode viralizar e crescer de maneira orgânica nas paradas musicais, vencendo um lançamento fracassado ou pouco investimento por parte do artista.

No Tik Tok, ocasionalmente uma música antiga vira uma trend no aplicativo. Foi o que aconteceu com a faixa Heat Waves da banda britânica Glass Animals. Lançada em junho de 2020, como single do álbum Dreamland, a canção quebrou o recorde de crescimento na parada musical Billboard Hot 100, chegando ao topo do chart em 59 semanas. 

Heat Waves chegou ao número 1 da Billboard Hot 100 em março de 2022 e permaneceu no topo por 5 semanas, quase dois anos após seu lançamento, e muito se deve à viralização do refrão da música no TikTok em 2021. Na Billboard Global 200 atingiu o topo e se manteve por 6 semanas na posição.

Outro hit antigo inesperado da rede social foi Beggin, versão cover da banda italiana Måneskin. Originalmente a canção foi lançada pela banda americana The Four Seasons em 1967 e ao longo dos anos ganhou várias regravações e remixes. Quando estava concorrendo no X Factor Itália, a banda Måneskin apresentou um cover da famosa música, que mais tarde integrou o EP de estreia Chosen em 2017. 

Em 2021, a banda ganhou o Eurovision, competição musical europeia, e algumas de suas músicas começaram a aparecer nas paradas musicais depois de 4 anos de lançamento. No Tiktok, Beggin foi uma das canções virais e chegou a atingir o terceiro lugar na Billboard Global 200. Além disso, alcançou o topo do chart de rádios Alternativo e Rock da Billboard, e ficou na 13° posição na Billboard Hot 100, sendo esse o debut da banda no chart.

Talvez um dos casos mais interessantes de Sleeper hits dos últimos anos foi da canção Truth Hurts da cantora Lizzo. Lançada oficialmente em 2017, a música não fez muito sucesso e não alcançou nenhuma parada musical. Mas o single, depois de dois anos, acabou virando uma trend nas redes sociais chamado #DNATest, em que brincando com alguns versos da música, os usuários podiam adaptar a letra com o que se identificavam.

Para ajudar ainda mais na viralização, a faixa apareceu no trailer do filme Alguém Especial da Netflix e foi cantada por uma das personagens, em uma das melhores e mais compartilhadas cenas do longa. Com isso, a canção foi adicionada na versão deluxe do álbum Cuz I Love You de Lizzo, lançado no início de 2019.

Truth Hurts atingiu o topo da Billboard Hot 100 e permaneceu por 7 semanas no primeiro lugar da parada musical, sendo essa a primeira faixa da artista a ter esse feito. Mesmo tendo sido lançada em 2017, a música foi elegível para o Grammy Awards de 2020. Sendo indicada em três categorias, Música do Ano, Gravação do Ano e Melhor Performance Pop Solo. Truth Hurts levou o gramofone em Best Pop Solo Performance.

Além disso, a canção foi incluída em listas importantes, como as 500 melhores músicas de todos os tempos definidas pela revista Rolling Stones e músicas que definiram uma década pela Billboard.

Lizzo no Grammy 2020 com suas vitórias em Melhor Performance Pop Solo, Melhor Performance de R&B Tradicional e Melhor Álbum Contemporâneo Urbano. [Imagem: Reprodução/Getty Images]

Quem diria que um dos maiores sucessos do início da carreira de Lady Gaga também foi um Sleeper hit? Just Dance, com participação de Colby O’Donis, foi lançada em abril de 2008 como lead single do álbum de estreia da cantora, The Fame. Mas mesmo com boa recepção da crítica, a faixa só atingiu o primeiro lugar do chart Billboard Hot 100 em janeiro de 2009, 9 meses desde o lançamento e permanecendo por 3 semanas no topo. 

O single foi indicado ao Grammy de 2009 na categoria de Melhor Gravação Dance e o crescimento orgânico da música em 22 semanas na Billboard Hot 100, pode ser facilmente atribuído ao sucesso que Just Dance foi obtendo nos clubes e baladas americanas.

 Poker Face, também de Lady Gaga, fez caminho semelhante. Lançada em setembro de 2008 como segundo single do The Fame, a música não teve desempenho comercial relevante na época. Mas com o sucesso de Just Dance, a faixa começou a subir nas paradas musicais. 

Após 4 meses de seu lançamento, Poker Face atingiu o topo da Billboard Hot 100 e na época a cantora se tornou a primeira artista em 10 anos a conseguir colocar seus dois primeiros singles em primeiro lugar no chart. A música recebeu indicações no Grammy Awards de 2010 nas categorias de Gravação do Ano e Música do Ano, e ganhou Melhor Gravação Dance.

Outro caso de Sleeper hit que aconteceu na década passada foi Sail da banda americana Awolnation. Sendo lançada pela primeira vez em 2010 no EP de estreia, Back From Earth, e depois incluída no primeiro álbum do grupo, Megalithic Symphony, em 2011. A faixa entrou na Billboard Hot 100 em setembro do mesmo ano, na 89ª posição, e após 20 semanas no chart saiu da parada musical.

Depois de dois anos, a faixa entrou novamente na Billboard Hot 100alcançando a posição 17 e permaneceu por 79 semanas entre as 100 músicas mais ouvidas dos Estados Unidos. Sail se tornou a terceira canção com mais semanas na Billboard Hot 100, atrás somente de Blinding Lights do The Weeknd com 90 semanas, e Radioactive do Imagine Dragons com 87 semanas.

A razão desse fenômeno depois de muito tempo foi pelo uso da música em diferentes propagandas, vídeos pela internet e programas televisivos. A faixa apareceu no trailer da série Vikings da History Channel, na trilha sonora de um vídeo de wingsuit que viralizou em 2011 que hoje conta com mais de 30 milhões de visualizações, em diversos vídeos da rede social Vine, no comercial da BMW e em séries e filmes como Os Desconectados, Meu Eterno Talvez, Fleabag e The Walking Dead.

Outro destaque fica para a canção Habits (Stay High) da cantora sueca Tove Lo. Inicialmente, a música foi lançada independentemente pela artista em 2013 com o nome apenas de Habits, sendo esse o seu segundo single lançado sem o apoio de uma gravadora. Depois de Tove Lo assinar com a Universal Music, a faixa foi relançada em dezembro do mesmo ano servindo com o segundo single do EP, Truth Serum, e como o lead single de seu álbum de estreia, Queen of the Clouds.

A música entrou nas paradas musicais em 2014, um ano após o relançamento, e alcançou a terceira posição na Billboard Hot 100. Um remix da canção foi lançado na metade de 2014 e impulsionou o hit nas paradas, no Youtube a versão do duo Hippie Sabotage é a com mais visualizações.

É interessante perceber a longevidade que algumas dessas músicas apresentaram. Independente da época que foram lançadas, o seu sucesso não estava atrelado a alguma fase da indústria musical, pelo contrário, pode-se dizer até que estavam à frente de seu tempo. 

Atualmente, com as redes sociais, um grande fenômeno na música pode surgir sem grande investimento e divulgação. O crescimento orgânico através dos fãs e viralização espontânea de algum vídeo que utilize a canção na internet pode ser o suficiente para marcar um hit em ascensão. 

Para os cantores e os fãs de música, é uma boa notícia que nenhuma faixa ou single esteja destinado ao fracasso imediato, e que só depende de um pouco de tempo para a descoberta de tais artistas.