História da moda 1900 – 1918: A Era da opulência e dos bons costumes

Essa série nasceu de uma vontade muito grande, suponho que se a Frenezi não tivesse uma editora de moda completamente fascinada pela história da moda e suas décadas passadas, o resultado talvez fosse bem diferente. Começamos com uma Era de grande interesse, 1920, partindo do pressuposto duro que rege o jornalismo (mesmo o independente) que sempre precisamos de um gancho para as matérias, os figurinos do Grande Gatsby de Baz Luhrmann assinados por Miuccia Prada ajudaram, assim como o misticismo envolvido nos vestidos retos e os cabelos na altura do queixo.

Acredito que começar pelo século XX seja uma decisão racional, foi quando o sistema da moda começou a girar em torno das estações do ano, o período que também contou com a consagração de grande estilistas desde da alta-costura até o pronto para vestir – qual, iremos aprofundar nos anos 60 – de Paul Poiret até Donna Karan. Hoje, gostaria de trazer o começo do século, entre os anos de 1900 até 1918, um tema recorrente que gostaria que estivesse impresso na cabeça de cada leitor possível, é que não existe história da moda sem considerar as mudanças sociopolíticas do mundo no contexto inserido.

Figurinos da primeira temporada de Downtown Abbey (Reprodução/Divulgação).

Terminamos esse texto em 1918 e não 1920, justamente pela data de cessar fogo na Primeira Guerra mundial, quando os racionamentos terminam e os anos de jazz e bebedeira começam a esquentar. “La Belle Epoque” tradução literal para “Era da opulência” ou se você tem complexo de Downton Abbey “Era Eduardiana”- falamos em eras pelos monarcas regentes na Inglaterra – o título não se difere terrivelmente da tradução, imagens de grupos de poder e nível social elevados, em saiam armadas, espartilhos e chapéus vêm a mente.

As regras da moda eram seguidas à risca grossa, arriscando uma forte ridicularização social caso as desafiasse, o que as cartilhas de ilustração de moda reportavam eram quase reproduções de boas maneiras básicas em sociedade. Paris também mantinha fortemente o seu espaço como absoluta influência de moda no mundo: “Uma etiqueta de Paris era o endosso definitivo, estabelecendo seu proprietário como árbitro do gosto e membro dos escalões superiores da moda” Valerie Mendes, A moda no século XX. 

Edwardian Era (Reprodução/TheEconomist).

A garota Gibson:

Os padrões de beleza femininos sempre foram quase irreais para seguir, a garota Gibson é reconhecida como o primeiro padrão de beleza estadunidense e nascida após a modernização do século anterior, com informações e ilustrações sendo popularizadas para maiores massas com uma velocidade maior do que antes. A mulher foi imaginada pelo ilustrador Charles Dana Gibson, foi o ideal de beleza durante toda a Era Eduardiana. 

A garota Gibson se tornou o arquétipo absoluto para as mulheres de classe média alta estadunidenses, idealmente ela seguia as modas da época, ombros bufantes, colarinhos altos, espartilho em formato de S e saias altas. Um cabelo enorme sempre em coques volumosos que emolduravam seu rosto, com corpo atlético e com uma cintura mínima. Mais importante, a Garota Gibson tinha graça, confiança e tinha uma certa independência dos homens.

Mas não confunda a garota Gibson com a “New woman” do período, a nova mulher era controversa, ligada ao sufrágio feminino e politicamente engajada. O visual Gibson foi imitado pelo país, afinal ela sempre estava na última moda e participou de uma mudança nos ideais de beleza, que acompanhavam as mudanças na virada do século em razão da modernização.

A mulher do novo século:

Entramos no período de transição do velho século para o novo, que acompanhava rápidas mudanças na industrialização e modernização, conseguimos entender que há um início da modernização do vestuário feminino: “Os estilos cambiantes não só começam a se parecem com as formas reconhecíveis da moda contemporânea, como também cartografam a busca das mulheres por igualdade social”. NJ Stevenson, Cronologia da moda.

Já entre 1880 e 1900 a silhueta mudou, das grandes crinolinas da Imperatriz Eugênia e Charles Frederick Worth, para saias longas e mais justas com uma cauda, exatamente para dar ênfase à forma de S eduardiana. “Não é na história dos vestidos de alta-costura, porém, que a aurora da libertação da mulher de seu status de “bem-móvel” pode ser percebida”. NJ Stevenson, Cronologia da moda.

 A roupa de alfaiataria foi requisitada por uma nova força de trabalho (governantas, balconistas e datilógrafas) a partir do tailleur usado pela alta-sociedade para viagens e atividades rurais, foi uma grande mudança para o vestuário e comportamento feminino.

Gosto pela decadência:

A moda para mulheres entre esse período, seguiram bastante as regras das décadas anteriores (principalmente 1890). A roupa altamente super estruturada da silhueta da Garota Gibson foi popular por quase toda década, a simplificação e silhuetas mais soltas só apareceram no final da década, podemos argumentar que isso foi graças aos efeitos dos racionamentos durante a Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

As décadas passadas foram conhecidas como a Idade de Ouro do novo dinheiro americano, com uma economia próspera, a opulência de vestidos com tecidos ricos, cores em tons de joias, diferentes texturas opulentas e colares pesados, a riqueza era exibida em estilos de vida extravagantes e especialmente, no vestuário feminino.

No começo da década de 1900, a moda seguia os padrões do final do século XIX, não houve grandes mudanças no vestuário durante os oito primeiros anos. O desejo do novo era inteiramente satisfeito pela introdução de séries de cores sazonais e por novos ornamentos, lembrando que nessa época o nível máximo de hierarquia na moda era ocupado pelos grandes couturiers, e seu seleto grupo de clientes.

O espartilho já dividia opiniões, durante a belle époque e os anos dourados dos EUA, os ricos desfrutavam de extrema opulência e o símbolo da vida privilegiada se tornou o espartilho em formato de S: “A príncipio considerado saudável por retirar a pressão do abdome e projetar o busto para a frente e os quadris para trás, esse tipo de espartilho tornou-se a estrutura para as roupas excessivamente adornadas do fim dos anos 1890 e começo dos 1900”.

Em contraste com a silhueta exuberante, as partes de cima eram bufantes, com bastante tecido para ajudar a montar a silhueta rígida, nos vestidos de dia os decotes eram inexistentes e terminavam com mangas dramáticas e um efeito diferente entre saias com anquinhas que deixavam a parte de trás maiores, e na frente uma certa solidez entre tecidos. A modéstia era algo especial dos vestidos de dia, cobriam o corpo do pescoço até os pés, com mangas longas cobrindo os braços e saias longas em linha A e formato de sino. 

Os vestidos de noite eram rigorosamente adornados com rendas e bordados, tecidos ricos como chiffon e seda também eram utilizados em um único vestido, ainda remanescentes da época dourada americana. Essa opulência e graciosidade do vestuário durou algum tempo, mas com a virada do século e sua primeira década logo temos conflitos como a Primeira Guerra, que começam a mudar drasticamente o comportamento e as roupas em meados de 1910.

Paul Poiret: Túnica abajur e orientalismo

Com a chegada do Ballets Russes de São Petersburgo em 1909, uma nova forma de dança, música e o mais importante, os figurinos desembarcaram em Paris com uma popularidade exaltante. Os figurinos e cenários inspiraram uma onda de experimentação, riqueza ao colorido, silhuetas fora do comum e cortes assimétricos foram traduzidos para uma mudança fundamental que colocaria um final na figura rígida e modesta eduardiana.

“Sem Paul Poiret a história da moda no século XX não teria sido a mesma. Dotado de grandes habilidades inovadoras, Poiret soube também aproveitar o estado de espírito reinante para se autopromover”. NJ Stevenson, Cronologia da moda.

Poiret sempre teve um alto interesse por roupas, uma trajetória que passou de fazer roupas para as bonecas da irmã, ser desenhista freelancer para grandes couturiers, e até mesmo um tempo trabalhando na Maison Worth, o que não durou muito tempo pelas suas ideias ousadas e a clientela tradicional da casa. Em 1906 já estava cortando vestidos mais frouxos, fluídos e com a cintura larga, na mesma época que Madeleine Vionnet havia decidido abolir o espartilho, as roupas tornaram-se mais largas com formato parecido de túnicas no atelier do designer. 

Os modelos inovadores de Poiret no início do século ajudaram para o estado de espírito da moda na época. Inspirado pelos desenhos orientalistas de Léon Bakst, ele lança a sua criação mais controvérsia: a túnica abajur em 1913.

“A predileção de Poiret pela decoração exótica com plumas preciosas, sedas fortes, calças de harém e frentes-únicas emplumadas havia traduzido o Zeitgeist em arte usável, mas sua teatralidade ficou anacrônica”. NJ Stevenson, Cronologia da moda.

Em consequência da Primeira Guerra, Poiret fechou as portas e nunca se recuperou totalmente, o mundo da moda foi seduzido pela simplicidade Chanel, mas o legado duradouro de Poiret compreendeu os aspectos comerciais e criativos – até teatrais – em uma empresa de alta-costura.

Frenezi na Semanas de Moda de Copenhagen

Copenhagen é conhecida entre os amantes de moda como a mais criativa da indústria, com a apresentação das coleções de Primavera/Verão 2023, suas marcas não decepcionaram com uma junção de diversão, criatividade e experimentação a CPFW ainda tem um reinado sobre as semanas de moda internacionais em diversidade de estilos, rostos e estéticas.

Os novos ares, de ondas de calor batendo recordes na europa, até a nova aspiração de grandes conglomerados de luxo – como Kering e LVMH – olharem com respeito para os graduandos de Copenhagen, que experimentam e começam a consolidar suas novas marcas para investimentos prósperos, assim como Cecile Bahnsen, que foi realocada para Paris mas nasceu na CPFW.

A semana de moda de Copenhagen também é internacionalmente reconhecida pelo seu streetwear, a inovação não é poupada nem nos looks de rua, com a aparição de tudo que se possa imaginar de bolsas em formato de pomba até saias do Star Wars, é um lugar para abraçar sua criatividade e individualidade.

Confira a cobertura completa da CPFW:

Streetwear na CPFW (Reprodução/Vogue Runway).

Biquínis

O clássico do verão ganha novas versões na Copenhagen Fashion Week. Há um tempo, o biquíni já estava invadindo os outfits do dia a dia. Nessa temporada, finalmente ele deixa de ser a peça básica para os dias de sol, e substitui o cropped. Na Ganni, ele faz dupla com calça de cintura baixa estilo baggy e low-rise, mantendo a estética Y2k. A marca de Ditte e Nicolaj Reffstrup, aposta em cores vibrantes e saturadas para destacar a peça. Já na (Di)vision, o beachwear ganha uma versão mais alternativa, em jeans combinado com calças de couro. A Sacks Potts, aposta no metalizado com amarrações de cores diferentes. Já na Holzweiler, ele aparece mais tímido, embaixo de jaquetas e peças de alfaiataria. 

Crochet

Não existe um match mais perfeito para a temporada de verão, senão as produções em crochet e, sua presença nas passarelas da semana de moda Primavera/Verão de 2023 de Copenhagen são a prova disso. O uso da técnica manual esteve presente em marcas como The Garment, Skall Studio, Holzweiler, The Royal Danish Academy, Sunflower e Malene Birger. E para quem busca optar por peças mais leves, combinadas ao calor do verão europeu, as peças confeccionadas em crochê e expostas nas passarelas, se confirmaram como uma ótima saída para a estação. 

Maxi bags

Que a era das mini bags já estava praticamente chegando ao fim todo mundo já sabe – há tempos que marcas internacionais vem desfilando modelos maxi em contraponto aos mini, que foram fortemente difundidos pelo pai da Le Chiquito, Simon Porte Jacquemus. Em Copenhagem então não poderia ser diferente: marcas como Malene Birger, Ganni, Soulland e Stine Goya foram só algumas das que adotaram essa proporção de acessório para a estação. Mas se antes o material chave para estas peças era o couro, agora ele é a fibra sintética acetinada, que vem nas mais diversas cores e dão forma à bolsas acolchoadas, confeccionadas de maneira a parecerem “fofinhas”. 

Metalizados

Quem é minimamente atualizado nas tendências fashion, já está por dentro da volta dos “metalizados” tanto na passarela como no street style. Desde o começo do ano, várias outras semanas de moda vinham tomando posse da tendência que não é mais do que um reflexo do estilo Y2K que ainda está em alta desde 2020. Nesta semana de moda tão esperada pelas suas novidades e singularidades, marcas como Saks Potts, Sunflower e Stine Goya parecem abusar do potencial da tendência em toda sua extensão. Peças em um dourado extravagante e looks que “metalizavam” tons suaves de rosa e azul através das superfícies têxteis, como nos paetês não foram difíceis de serem encontrados nas passarelas da Dinamarca nesta temporada.

Coletes

Perfeitos pra quem não abre mão da terceira peça, mesmo em dias mais quentes, os coletes marcaram presença na Copenhagen Fashion Week e, são o ‘must have’ dessa meia estação. Na The Garment, aparecem em alfaiataria, como substitutos do blazer, garantindo um office look mais descolado; já a Soulland, apostou tanto nas peças em estilo suéter, feitas de lã, como nos modelos com abertura frontal, em couro, trazendo conforto e sofisticação para a coleção, dando um toque preppy ao street style. Seja em modelagens máxi ou mini, os coletes apareceram nas mais variadas formas, materiais e composições; colete de pelos + biquíni? Sim! Colete alongado usado como vestido? Sim também! Em sobreposição, misturando estampas? Porque não? A Spring 2023 da CFW nos mostra que as infinitas possibilidades, proporcionadas pela peça, devem ser aproveitadas de forma criativa. 

Tons pastéis

Entramos no clima de primavera completamente, a CPFW é reconhecida por suas cores vibrantes e diferentes técnicas de design, quando falamos nas roupas coloridas uma variedade de paletas surgem na mente, principalmente depois de um ano cheio de vibrantes e color blocking. Os tons pastéis têm flertado com o mainstream novamente, com a volta de estéticas que variam entre meados de 2010, candy colors também tenham sua vez, menos na influência de um preppy hipster desajeitado com diferentes tons em um só, mas aparecendo em silhuetas fluídas, leves e mais casuais, justamente para fazer a junção do fator ‘cool’ com uma paleta de cores desafiadora para designers, principalmente nas marcas Saks Potts, Stine Goya, Helmstedt e Soulland.

Frenezi na Semana de alta-costura de outono inverno 2022

A alta-costura é uma das semanas de moda mais esperadas pela a indústria, a temporada de outono inverno 2022 foi apresentada em Julho deste ano com a ajuda do órgão regulador francês da semana a Fédération de la Haute Couture et de la Mode – Federação de alta-costura e da moda – com a aparição dos três membros da federação se apresentando os membros oficiais, os membros correspondentes e os membros convidados.

Lembrando que a semana de alta-costura significa uma enorme e próspera visão na moda, ela é a vitrine do poderio de esplendor em técnica e qualidade das grandes casas, as marcas apresentam suas versões opulentas de grandes vestidos e coleções justamente para se reafirmar no mercado de luxo.

É a semana mais exclusiva do mundo da moda, com o jet-set internacional se movendo para Paris fomentando o turismo de luxo e as vendas dessas grandes marcas de quebra, a semana de alta-costura não visa exatamente as duas dúzias de clientes de alta-costura, mas sim o estabelecer da marca no mercado de luxo.

Você pode encontrar o calendário oficial da Semana de Moda de alta-costura aqui.

Confira a cobertura completa da Semana de alta-costura de outono inverno 2022:

Fendi alta-costura outono inverno 2022 (Reprodução Instagram).

SCHIAPARELLI:

Ao dar largada na temporada de Outono/Inverno Alta Costura 2022, Daniel Roseberry mais uma vez deixa seus fãs e colaboradores boquiabertos com o seu talento como diretor criativo da Maison Schiaprelli.

Roseberry, claramente, uma vez que iniciou sua jornada na casa de alta costura, declarou sua admiração pela fundadora, Elsa Schiaparelli e assumiu como objetivo prestar sempre seu tributo com a ‘inovação’ como palavra de ordem.

A apresentação ocorreu no Musée des Arts Décoratifs, onde acaba de inaugurar uma exibição em homenagem à própria Schiaparelli e seus anos como estilista, a amostra inclui peças de designers que admiravam a italiana como Christian Lacroix, Yves Saint Laurent e Jean Paul Gaultier. O mesmo ponto de partida foi explorado pelo designer americano, Roseberry, para desenvolver uma coleção que ‘resultasse’ no reflexo de uma “conversa entre designers que a admiravam”, segundo o próprio diretor criativo.

Como era de se esperar, Roseberry adentra o universo surrealista de Schiaparelli e Salvador Dalí em mais um runway; e entrega uma coleção rica em formas e fusões inesperadas. A coleção foi resultado da sinergia de ideias de todo o legado que Schiaparelli deixou em seus fãs. 

Inspirado pela estética de Lacroix, Roseberry produz peças que remontam a silhueta do anos 80 que entram no mapa de coleção. 

Não pôde faltar também a alfaiataria impecável da maison e o aproveitamento das formas anatômicas da moulage para a montagem dos looks.

A passarela contou com looks que soube misturar com sabedoria materiais diversos criando combinações não tão comuns, como: miçangas, pele, couro, jeans, metais, veludo, seda, o gabardine e até mesmo a palha em chapéus de toureiros. 

Flores de seda e couro, tecidos telados em crochê , a força do veludo e dos acessórios de joalheria, todos esses elementos quando fundidos trazem um novo ar de inovação para uma marca que se comprometeu a nunca esquecer suas raízes.

O jogo de cores entre os azuis, pretos, off white, caramelos e dourados soube traduzir a mulher de Schiaparelli da década de 2020, uma mulher disposta a encontrar elegância no que há de mais primário em si mesma; seu corpo, suas paixões, arte e natureza. 

Cada um desses pontos teve seu momento de destaque nessa coleção, desde os looks que exploravam o corpo das mulheres, às flores de seda ornamentadas, às peças de joalheria que remontam a estética surrealista do qual Elsa era aliada.

Em seus 3 looks finais, Roseberry parece resumir toda a aura da apresentação. A feminilidade trazida em cada uma dessas peças não deixa de comunicar a força e a personalidade voraz da mulher de Schiaparelli.

Roseberry consegue mais uma vez firmar sua posição como gênio criativo na casa Schiaparelli sem deixar de lado sua própria assinatura e legado que o fez tecer sua trajetória.

DIOR:

Maria Grazia Chiuri apresenta mais uma coleção Fall Couture no comando criativo da grande maison de Christian Dior no Musée Rodin, a passarela foi construída debaixo de uma enorme tenda ao centro do jardim do museu parisiense. 

Para esta temporada, a italiana colaborou com a artista ucraniana Olesia Trofymenko. A artesão do leste europeu impactou a atual designer da casa Dior com um de seus bordados em paisagem pintada em mural. Chiuri logo iniciou as negociações de uma possível colaboração para a coleção de alta costura de inverno que viria a resultar no mergulho do folclore ucraniano como tema principal. 

Com tudo o que vem acontecendo no leste europeu, uma guerra travada há pelo menos 3 meses, é no mínimo interessante perceber a admiração de um nome tão ‘poderoso’ no mundo fashion como o de Dior, abrindo alas para uma artista independente como Trofymenko exibir sua arte.

MGC entrega uma coleção repleta de bordados e looks que exploram as superfícies dos tecidos com muita cautela, o que não é nenhuma novidade para os fashionistas de plantão que observam com uma lupa de aumento cada passo da italiana na Dior. O trabalho zelado com os bordados e as maquetes têxteis seria um impacto para qualquer um se a autora da coleção não fosse a própria. 

Mesmo com um trabalho um tanto “ordinário”, a italiana não deixou de apresentar uma coleção com um trabalho em cortes e acabamentos impecáveis. Mais uma vez, a marca trabalha com um conjunto de peças bem pensados não só em execução mas também na forma como eram apresentados na passarela. Os subgrupos de looks – ou como comumente chamamos “famílias de coleção” – se mostraram ter uma lógica e um sentido quando avaliados lado a lado, principalmente considerando a temática folclórica da apresentação. 

A italiana se aventurou em trabalhar com uma diversidade de bordados, motivos de xadrez e na contradição de tecidos leves e pesados, o que trouxe um certo ‘equilíbrio’ na passarela.

Em relação à paleta escolhida, o preto, branco e off white, vários tons de bege, cinzas, azuis, rosas e vermelho trouxeram à vida o universo campestre e distante da realidade caótica de que vive-se hoje.

Na maior parte do desfile, Chiuri exibiu looks que exploravam a clássica silhueta da qual a italiana não parece querer se desprender, longínqua com mangas compridas bufante com  um formato sutilmente mais estruturado do que o normal, peças fluidas e soltas o que de certa forma casar muito bem com o ideal da mulher bucólica do qual a coleção aparente atingir. Uma coleção inegavelmente bem executada e bem pensada em cada passo que assumiu dar, em termos de criatividade a história realmente parte para um outro lado. Haviam tantos caminhos inexplorados do qual a maison tem recursos para esmiuçar e mesmo assim parecem ter optado pela zona de conforto.

BALENCIAGA

Quando o assunto é Balenciaga, não há como esperar pela obviedade, especialmente quando se trata de Demna Gvasalia como mente por trás da direção-criativa das coleções. A cada temporada, seja ela de ready-to-wear ou resort, e agora pela couture week, Demna coloca toda a sua genialidade e excentricidade criativa em suas criações. 

Após o seu debut na alta-costura em 2021 — ano este que marca o retorno da Balenciaga na semana de Haute Couture após 55 anos de sua coleção criada pelo então fundador e diretor-criativo da marca Cristóbal Balenciaga —, Demna demonstrou que desafios, apesar de parecerem assustadores, não o incomodam de forma alguma. Pelo contrário, o diretor-criativo da Balenciaga ao longo de sua estada na casa prova que sair da zona de conforto — e do considerado como habitual ou convencional — é o seu hobby favorito na indústria da moda.

E sua coleção de alta-costura desta temporada, que demarca a coleção número 51 da categoria da casa, reúne referências não somente da direção-criativa e arquivos do pai da costura refinada, Cristóbal Balenciaga, como ainda resgata as influências do streetwear de Demna Gvasalia unidas ao acabamento meramente perfeito que a alta-costura requisita. 

Com uma atmosfera um tanto quanto sombria e melancólica, contemplada por um poema romântico na voz de AI e bombardeada por rostos cobertos imitando humanóides e simbolizando a pegada futurística, talvez uma das tendências favoritas de Demna ultimamente, a nova coleção da Balenciaga não é nada mais do mesmo, embora resgate silhuetas e referências de temporadas passadas. 

Para a temporada de Outono, Demna trouxe às passarelas da alta-costura parisiense peças colecionadas majoritariamente nos tons de preto, além de repaginar os tecidos Abrahams em estilo neoprene — fabricados em uma collab com um fabricante japonês — caracterizando a famigerada silhueta Balenciaga de Demna Gvasalia, porém, desta vez, em modelos que encapsulam os moldes do corpo. 

Outro fator que posiciona os olhares e toda a atenção para a nova amostra do duo Demna x Balenciaga é a presença de celebridades — ou principais nomes que amam e vestem a casa — nas passarelas da apresentação. Nomes como Naomi Campbell, Kim Kardashian, Bella Hadid, BFRND (esposo de Demna e músico), Dua Lipa e Nicole Kidman, roubaram a cena ao desfilarem pela Balenciaga nesta quarta-feira (07). Além disso, a aparição das bolsas ‘Speaker’, em que a maioria dos modelos carregavam durante a apresentação, simboliza mais um dos demonstrativos de inovação de Demna para a Balenciaga. 

Por fim, embora tenha apresentado alguns erros de execução — exemplificados pela dificuldade de algumas modelos caminharem na passarelas com suas vestimentas —, a coleção de alta-costura de Demna marca, novamente, um período de reinvenção e transição entre as duas gerações da casa, a primeira de seu fundador e ‘’arquiteto da moda’’, Cristóbal Balenciaga, e a atual de Demna Gvasalia, que consegue mesclar muito bem os universos de streetwear e elegâncias da alta-costura. 

JEAN PAUL GAULTIER

Após anunciar sua aposentadoria das passarelas, Jean Paul Gaultier tem buscado que outros designers possam tomar as rédeas de suas coleções de alta-costura a cada temporada. Depois do sucesso da collab entre Glenn Martens x Jean Paul Gaultier na última temporada, para a coleção de Outono 2022 foi a vez de Olivier Rousteing, atual diretor-criativo da Balmain, estar à frente das criações da maison francesa. 

Tomando como responsabilidade criar as peças da coleção de sua fonte de inspiração no mundo da moda, Olivier, apesar de estar à frente de um grande desafio, conseguiu elaborar uma coleção sólida e com muito prestígio às referências próprias da casa, mescladas com o toque e silhuetas que Rousteing já tem trabalhado na Balmain. 

Como o próprio disse antes do início da apresentação, esta coleção realmente funcionava como uma carta de amor para Jean Paul. Iniciada com peças masculinas, inspiradas nos moldes dos anos 1990 e especialmente nas tatuagens da época, Olivier celebra o que ele chama de diversidade e, ao mesmo tempo, liberdade de expressão. Em seguida a coleção ganha novos ares e simultaneamente revisita as criações que já conhecemos na Jean Paul Gaultier: espartilhos, jeans reaproveitados, os famigerados suéteres de pescadores e as referências dos seios expostos em trompe l’oeil, inclusive utilizado por Kim Kardashian na primeira fila do desfile.  

Olivier ainda não deixa de fora da coleção suas raízes africanas. Durante a apresentação é possível captar as milhares de referências ao continente africano, dentre elas, o mix de cores e os adornos utilizados pela maioria dos modelos da apresentação. 

Outro ponto bastante presente e muito bem explorado pelo duo Olivier e Jean Paul é a criação artesanal. O trabalho do artesanato foi expresso principalmente em uma das composições da coleção que continham vidro em forma de corpete, moldado pelo especialista por trás dos vitrais de Notre Dame, o que demonstra o cuidado e preocupação de Olivier em construir um trabalho impecável. 

O que Olivier fez na tarde desta quarta-feira (06), não foi de fato surpreendente somente a Jean Paul Gaultier, mas pode-se assumir que talvez tenha sido uma surpresa a todos que acompanham as semanas de moda e, especialmente, voltam os seus olhos à semana de alta-costura. Em sua coleção para a Jean Paul, que pode se consagrar como uma das melhores e mais criativas da couture week, Olivier desponta como um ótimo aluno em redesenhar aquilo que já está pronto de maneira autêntica, especial e com suas características criativas. Entre técnicas e um ótimo briefing de design, Rousteing entrega à Paris e a Jean Paul Gaultier uma coleção sólida, criativa e com muita história para contar.

MAISON MARGIELA

Desde o início da pandemia, John Galliano, frente ao seu trabalho na Maison Margiela, tem buscado se reinventar e investir em formatos digitais para apresentar suas criações para a marca belga. 

Para esta coleção de Outono 2022 da semana de alta-costura, John e Margiela optaram, novamente, pelo formato de fashion film para divulgarem as novas criações da Artisanal, assim apelidada a nova apresentação da casa. Inspirada na produção teatral britânica de Drácula, Galliano buscou reunir a moda, o teatro e o universo digital em um único universo. 

Em uma coleção-cápsula, unindo 9 looks bastante distintos e singulares uns entre os outros, John Galliano produziu vestimentas em um estilo cowboy dos anos 1950 norte-americano e que, ao mesmo tempo, conversavam com uma outra narrativa americana mais sofisticada. 

VIKTOR & ROLF

Se na temporada passada a dupla Viktor & Rolf produziu uma coleção inteiramente inspirada em vampiros e neste mundo mais gótico, para a semana de alta-costura de Outono 2022, o duo colecionou peças que, na primeira metade do desfile, seguem o storytelling de Nosferatu (inspiração da coleção exposta no início do ano), com vestimentas contendo golas altas estruturadas de forma que parecessem levitar na passarela, enquanto a segunda e última metade da mais nova exposição da dupla buscou segmentar um ambiente mais leve, relaxado e muito mais suave, se comparada à temporada passada e à primeira parte da apresentação da marca. 

O que tornou a apresentação muito mais agradável e divertida aos olhos do público foi a aparição e presença dos dois designers na passarela interagindo com as peças de forma que manipulassem-as visualmente na frente da plateia presente.  

FENDI

A “natureza fragmentar das coisas” foi o ponto de partida para a Haute Couture da Fendi. Kim Jones, atual diretor criativo da casa, fugiu do óbvio, trazendo para o outono / inverno, uma coleção fluida e descomplicada, em tons pastel – que contrastaram com as pontuais peças em amarelo vibrante – inspirada por elementos paisagísticos de três importantes cidades: Paris, Roma e Kyoto.

As referências a Kyoto, aparecem nos tecidos de kimono, típicos do século XVIII – confeccionados por meio do Kata Yuzen, uma técnica precisa de pinturas manuais – e, nos vestidos em patchwork de painéis de seda, feitos tradicionalmente no Japão, com silhuetas assimétricas.

Peças ornamentadas, com um “quê” da Art Déco, em clássicas modelagens italianas, fecharam a triangulação entre Roma (cidade de origem da Fendi), Paris (local onde surgiu o “japonismo”, tendência europeia até o início dos anos 20) e Kyoto (origem das matérias-primas utilizadas pela Maison).

É perceptível a influência de Karl Lagerfeld, antigo diretor criativo da marca, na coleção, através do design aparentemente simples, que conta com materiais sutis, porém, luxuosos – vale ressaltar que, os vestidos de lantejoulas foram confeccionados a partir de amostras de tecidos escolhidos por Karl, que por alguma razão, não foram utilizados anteriormente.

Os elementos bucólicos, vão além dos motivos florais e folhagens bordadas em tule; os paetês e cristais simbolizam a luz e, o brilho do orvalho sob a incidência dos raios de Sol – basicamente, o desfile remete aos agradáveis (e raros) momentos de “calor”, em meio ao frio invernal.

As joias assinadas pela designer Delfina Delettrez, não se limitaram a simples colares e brincos; adornaram também as headpieces, bolsas, sandálias e, até mesmo, luvas – essas, que roubaram os holofotes, dentre os demais acessórios da coleção.

VALENTINO

Encerrando a semana de alta-costura com chave de ouro, tivemos Valentino sob os degraus da escadaria da Praça da Espanha, em Roma. A direção criativa de Pierpaolo Piccioli começou com apresentações de alta-costura que tiravam lágrimas, os maiores e mais opulentos vestidos em tons de jóias que poderíamos ver.

Um dos grandes momentos pós-modernos na alta-costura eram as primeiras coleções de Pierpaolo Piccioli da Valentino. A opulência, imaginação e criatividade que as coleções tomavam, eram de tirar o fôlego de qualquer leigo, porém PPP nunca foi um grande storyteller suas roupas não contam uma história ou sua trajetória entre os tecidos, coisa que ajudava ao fator glamour de toda temporada – eram vestidos de baile de plumas e paetês em tons de jóias e realmente não precisava de nada mais!

A pandemia mudou algo de dentro da Valentino, o diretor criativo citou mais de uma vez que suas coleções haviam encurtado nas pernas e ficado mais “básicas” pois não fazia sentido naquele momento socialmente e politicamente desenhar grandes e opulentos vestidos de baile. Mas tinha uma apreciação pelo amor da arte na alta-costura nessas grandes coleções, que ainda faz muita falta.

Para sua temporada de outono inverno 2022 ele volta um pouco com suas raízes, as headpieces de plumas, tons de jóias vibrantes, brilho, bordado e alguns vestidos longos. Nada comparado a antes, mas é um começo! A verdade é que, retirando o valor simbólico da apreciação do trabalho espetacular e glamouroso da alta-costura, o que resta para Pierpaolo Piccioli? Numa direção criativa que visa roupas lindas sem um storytelling exato (que algumas coleções pós pandemia tiveram até, mas muito mais no rtw) esperamos uma coleção de alta-costura de tirar o fôlego.

Mesmo sem ser um grande storyteller em suas criações, a coleção dessa temporada ser titulada de “The Beginning” foi como um ciclo se encerrando, e outro recomeçando. Muito falamos sobre a moda pós-pandemia, mas Pierpaolo acabou de concretizar como esta vai ser para a alta-costura da Valentino. Com expressões diferentes de cores, silhuetas e texturas, adicionando corpos e pessoas cada vez mais diferentes na passarela, e alta-costura masculina.

Nada disso significa que ele deixou o passado para trás, com grandes ornamentos de cabeça de plumas, tons vibrantes e vestidos bordados brilhantes agraciaram os degraus de Roma.

A Valentino nasceu em Roma,  recomeçar onde a marca se fundou anos atrás também possui um significado importante. Entre as combinações de cores, comprimentos e texturas como plumas e lantejoulas, a coleção parece muito coesa.

Mesmo que grande no tamanho, conseguimos ver uma trajetória clara no trabalho do ateliê, que também fez a aparição final no desfile em conjunto com o diretor criativo. Um fechamento memorável!

Ballet Core: Entenda a nova estética

Originado na Renascença Italiana no século XV, o ballet era uma forma de entretenimento para os altos membros da nobreza. Muito popular, logo a dança se espalhou para outras partes da Europa. 

Na França o ballet teve grande evolução. Primeiramente introduzida por Catarina de Médici, esposa do rei Henrique II, que trouxe a dança da Itália, o ballet tornou-se um patrimônio francês nos séculos seguintes. O rei Luís XIV foi um grande patrono da dança – até dançando alguns ele mesmo – e elevou o status do ballet a uma forma de arte, fundando a Academia Real de Dança em 1661.

Rei Luís XIV no Ballet Royal de la Nuit

Foi apenas no século XIX que a sapatilha de ponta e os tutus apareceram. O ballet deixou de ser dominado pela ópera e se desvencilhou (não totalmente) das amarras reais. Fortemente influenciado pelo movimento romântico, os espetáculos começaram a retratar histórias de mulheres frágeis, amores impossíveis e criaturas mágicas, dentre eles Giselle e La Sylphide, por exemplo.

Carlotta Grisi em Giselle

Aqui, o foco começa a ser realmente nas bailarinas e na técnica de ponta. Técnica essa que foi aprimorada quando o ballet chega na Rússia. Esse é o grande boom do ballet, foi nessa época onde os grandes clássicos foram escritos. O Quebra-nozes, A Bela Adormecida e O Lago dos Cisnes nascem de mãos russas, mais precisamente das mãos de Marius Petius e compostas por ninguém mais, ninguém menos que Piotr Tchaikovski. Essa era é a mais definitiva para o ballet clássico, onde toda a atenção era voltada para a dança, sua precisão e, também, sua dificuldade.

Bailarinas de O Lago dos Cisnes no Teatro Mariinsky em São Petersburgo, 1895-1910.

Consequências na cultura

Apesar de ser visto como uma dança feminina, o ballet originalmente era composto apenas de homens, que interpretavam papéis masculinos assim como femininos. Não foi até meados de 1830 que a associação do ballet à mulheres começou. A Revolução Francesa foi um dos motivos, época em que artes e costumes mais aristocráticos eram vistos com maus olhos. Homens não queriam tomar mais parte disso, e como temas super românticos já haviam sido implementados, abriu-se espaço para as mulheres subirem ao palco. Ao fim do século, homens bailarinos não eram mais aceitos culturalmente. O crítico Jules Janin disse: “Em nenhuma circunstância eu reconheço o direito de um homem dançar em público”.

Essa nova feminização do ballet trouxe consequências reais que perduram até o dia de hoje. Bailarinas -geralmente de baixa renda- treinavam rigidamente desde crianças dentro do Paris Opera Ballet até chegarem ao corps de ballet, para então, serem suscetíveis a avanços sexuais dos patronos da ópera, que podiam influenciar suas carreiras. Dançarinas que, de alguma forma ou outra, chegavam a lugares de destaque em produções, eram vistas como prostitutas pela sociedade. 

Esse estereótipo é visto em Cisne Negro (2010), o mais famoso dos filmes balletcore. Nina (Natalie Portman) é vista como uma “vadia” por ter conseguido o papel principal, sofrendo retaliação de outras bailarinas. 

Reprodução/ Cisne Negro (2010) diretor Darren Aronofsky

Outro ponto importante a ser discutido sobre as consequências do ballet é o culto ao corpo magro. Conceito popular em meados dos anos 1920, a magreza era vista como sinônimo de saúde. Não coincidentemente, foi nessa época que o ballet voltou à graça do povo. É de conhecimento público os vários relatos de transtornos alimentares como anorexia, bulimia e dismorfia corporal dentro da cultura do ballet

Misty Copeland, uma das mais famosas bailarinas atuais, desabafa em artigo

“Eles me disseram: ‘Seu corpo mudou. As linhas que você está criando não são mais como eram. Gostaríamos de vê-la mais alongada’. Isso, claro, era apenas uma forma educada e segura de dizer, ‘Você precisa perder peso’.” 

Misty Copeland em O Lago dos Cisnes

Misty, que na época nem menstruava de tão magra, contou sobre suas dificuldades em aceitar seu corpo uma vez que começou a tomar a pílula, que fez seus seios e quadris aumentarem. Ela também admitiu a comer compulsivamente, por sentir-se frustrada com as demandas da companhia de dança. Misty pesava 48 kg com 1,57cm de altura e considerava-se gorda: “[Mas] em meu mundinho, eu fiquei devastada quando descobri que eu era ‘gorda.’ Eu sempre tive orgulho do meu corpo -sua força e graça me permitiram seguir minhas paixões. Mas agora ele havia se tornado o inimigo.”

Outro relato mais extremo é da bailarina Gelsey Kirkland. Em seu livro Dancing On My Grave (1986), ela conta sobre seu tempo dançando para o famoso coreógrafo George Balanchine. Sobre uma ocasião em que ele fez uma “inspeção física”, Kirkland disse: 

“Com os nós dos dedos, ele apertou no meu esterno até as costelas, cacarejando com a sua língua e dizendo ‘preciso ver os ossos.’ Eu tinha menos de 45 kg na época… Ele não apenas disse ‘coma menos.’ Ele disse ‘coma nada.’”

Os conceitos de magreza e hiper feminilidade são pontos fortes do balletcore, que preza por corpos retos, brancos e quase infantis. Jennifer M. Miskec diz sobre o ballet e o feminino: 

“O ballet é o espaço perfeito para a feminilidade ideal: corpos magros; saias bufantes; silêncio; movimentos graciosos que fazem tudo parecer fácil enquanto escondem a dor, angústia física pela beleza.” É importante realçar os impactos que esses padrões têm em bailarinas e mulheres que consomem essa cultura, que muitas vezes buscam um corpo “ideal” baseado em conceitos feitos por homens e para homens. 

Na moda:

Não é a primeira vez que a moda toma como fonte de inspiração para suas criações o ballet, na verdade historicamente apresentações de danças, óperas e teatros foram grandes atrações culturais, que chegaram a alterar o curso do vestuário da época por sua popularidade.


O caso mais famoso foi o de 1909 quando a companhia de ballet russa – Ballets Russes de São Petersburgo -inaugurou sua apresentação no teatro de Paris. Apresentação que mudou o curso dos vestidos de noite por uma década seguinte, penduricalhos e bordados famosos nos vestidos de 1920, e principalmente no grande designer Paul Poiret foram inspirados diretamente por este ballet.

”Com a chegada dos Ballets Russes, uma nova forma de dança, música e desenho de figurinos e cenários entusiasmou e assombrou a cidade inspirando uma onda de audaciosa experimentação. Os costureiros foram rápidos em sua resposta à vanguarda russa, com Paul Poiret ao timão. A riqueza do colorido, a decoração bizarra e o corte exótico foram traduzidos numa mudança fundamental que baniu a figura eduardiana rigidamente espartilhada”. NJ STEVENSON, Cronologia da moda, 2011, p. 78.

Paul Poiret, 1911, reprodução/ Met Museum

O orientalismo da época graças a companhia de ballet russa, mostrou o quanto os movimentos culturais podem ter ramificações nos grandes designers. A marca Nina Ricci sob a direção criativa de Olivier Theyskiens em sua estreia na marca, no outono inverno de 2007, também trabalhou com a estética, longe de uma apresentação específica ou de grandes peças de ballet em geral. A coleção incorporou elementos claros do Ballet em um contexto casual, com modelos em cardigans enormes, aquecedores de mãos e um sapato de salto com a ponta arredondada e tiras em cetim de sapatilhas, acompanhados com meia-calças da mesma cor!

Assim como Simone Rocha, o grande nome da semana de moda de Londres mostra em suas coleções, sapatilhas adornadas, pérolas, cores claras, tulles e corpetes são alguns exemplos da estética clara da marca, tudo bem amarrado em uma paleta de cores claras, características observadas como movimento estético central da marca, mas principalmente das coleções referentes as temporadas de primavera verão 2022 e outono inverno 2020.

Hoje, é possível perceber uma mudança no ciclo de tendências da moda, este não é mais regido pelas grandes casas de alta-costura, nem mesmo no grande ciclo de designers de luxo, a popularidade de novas estéticas e micro-tendências surgem do próprio público – uma das mudanças aceleradas pelo pós-pandemia – o Ballet Core apelidado por seus membros é uma estética de estilo que assim como o old money é menos sobre as roupas em si, e muito mais sobre o estilo de vida.

Editorial para Grazia France 2013, fotografada por David Roemer

Quem não aspira em ser uma bailarina? Seres quase místicos, esbeltos, que levam os corpos ao extremo pela própria arte e a graça em se mover, o estilo encontra raizes no preppy mas incorpora elementos clássicos do ballet, principalmente de vestimenta casual e diária das dançarinas para ensaios, como macacões colados, leggings, segundas peles, aquecedores de mãos, meia-calças e boleros leves. Um dos elementos principais são as saias transpassadas de cetim, acessórios de pérolas e sapatilhas.

O ballet core também entra num estereotipo claro da bailarina, não como um ser humano ou uma atleta, mas um ser místico que se aproxima de uma musa, que muitas vezes continua nos padrões clássicos de corpo e aparência que continuam a ser exacerbados nessa estética. O importante em ter em mente quando falamos dessa estética emergente que apesar de olhar para um estilo de vida e mimica-ló, o ballet é uma dança que merece dias, meses e anos de preparação, não é sobre olhar para o físico, mas aproveitar a ideia da estética para brincar com o visual hiper-feminino, independente do tipo de corpo. Essa vertente perigosa que o ballet core nasceu fez com que o estilo fosse popularizado principalmente em meninas muito magras, o que não deve impedir de experimentar com o estilo, buscar inspirações em novas marcas como Simone Rocha, que olha para o ballet de modo diferente, são importantes para não cair na rotina, com uma inspiração que pode se tornar tão rica e divertida.

Frenezi nas Semanas de Moda Masculina Milão e Paris 

Para inaugurar o novo ano no mundo da moda, a indústria apresenta a temporada de Moda Masculina Primavera/Verão 2022. 

Com um novo mundo próspero pós-pandemia, a indústria da moda esta se reestruturando e as temporadas presenciais voltando a todo vapor no hemisfério norte, algumas marcas como Prada e Fendi tiveram takes interessantes sobre a nova era da moda masculina, com micro shorts, botas e bordados incluídos. Vale ressaltar que a questão da semana de moda masculina é uma forma de organização das marcas e menos sobre a forma e estruturação das roupas separadamente.

Você pode encontrar o calendário oficial da Semana de Moda Masculina de Milão aqui e o calendário oficial da Semana de Moda Masculina de Paris aqui.

Confira a cobertura completa da Semana de Moda Masculina de Milão:

Desfile da Versace na semana de moda masculina (Reprodução/marca).

Fendi:

A Fendi parece ser uma das grandes novas potências do Menswear hoje, isso se dá exclusivamente a direção criativa assinada por Silvia Fendi, que começou com uma nova versão da vestimenta masculina da casa pelos seus olhos. Na última temporada primavera verão 2022, vimos a Fendi viralizar internacionalmente com seus terninhos de shorts e cropped em tons pastéis, os shorts parecem que vieram para ficar na coleção de primavera verão 2023 contando com a presença dos mesmos.

Quando perguntada como era sentir algo que saiu de um show da Fendi virando um statement de vestimenta no mundo inteiro pelo jornalista Luke Leitch: “Quando fizemos isso, foi muito bem recebido – e houve tantos comentários no Instagram. E era o momento de fazê-lo. Mas se você olhar para todos os nossos shows, sempre há algo que pode ser um pouco perturbador para alguns.”

O corte e atmosfera remetem ao último show de Silvia na temporada de ready-to-wear da marca, a cor azul e os cortes retos, alongados, mas que ao mesmo tempo transferiram uma leveza extraordinária para a passarela. Gabardinas e casacos longos com diferentes texturas, shorts combinados com camisas e estamparia inovadora, tudo amarrado perfeitamente na paleta de tons terrosos e azulados para a coleção.

A alfaiataria bem ajustada com um twist moderno, percebida principalmente no look 27 que vemos um casaco longo estilo gabardina com botões alinhados no mesmo tecido na frente, cortes simétricos em cada ombro, terminando com o melhor parte do show que são os casacos e blazers com pele á mostra por baixo – muito famoso no vestuário feminino mas poucas vezes demonstrado no menswear – para a alegria dos fãs da Gucci de Tom ford.

Não esquecendo que uma dos grandes momentos nos acessórios, que são o forte da diretora criativa, com diferentes representações dos tênis de verão, óculos escuros com uma pegada Mod dos anos 60, chapéus que compunham os looks, pingentes que saíam dos blazers e casacos, e bolsas, de todos os tipos, tamanhos e estilos. Uma bucket enorme com lona monogramada e estrutura em couro – look 25 – uma versão de uma bolsa clássica da Fendi feminina em jeans – look 19 – e para não perder o costume muitas bolsas de ombro, algumas incluindo franjas de tecido e jeans que davam texturas diferentes aos acessórios – look 26.

Versace:

A coleção Spring 2023 Menswear da marca foi planejada para atrair a atenção da Gen-Z para a casa (literalmente), através de peças que uniam silhuetas e modelagens modernas a tecidos, cores e estampas que remetiam à Versace dos anos 90, seguindo o legado de Gianni. As peças da linha Home, carregadas pelos modelos, celebravam a riqueza do design italiano, em uma referência à feira de móveis ‘Salone di Mobile’, considerada pelos milaneses, um dos eventos anuais mais divertidos da cidade, que, recentemente, teve sua data transferida de abril para junho – agora, próxima à Semana de Moda Masculina. 

Desfile da Versace (Reprodução/Vogue Runway).

  Pela passarela, desfilaram modelos cujos pais também marcaram a Versace runway, uma experiência passada entre gerações, afinal, a ‘herança’ foi um tema muito abordado na coleção – o que explica o styling moderno, através de peças em estilo vintage – como se um filho tivesse invadido o closet do pai – a presença dos objetos de decoração (que muitas vezes estão atrelados a um significativo valor sentimental para as famílias, sendo passados entre os entes) e, às inúmeras referências e homenagens às criações de Gianni Versace, irmão mais velho de Donatella, de quem ela “herdou” a direção criativa da marca.

Prada:

A tão admirada dupla com Raf Simons e Miuccia Prada trazem em todas as coleções que colaboram o desejo, o interesse em se aprofundar naquilo que está sendo apresentado. 

Desfile da Prada (Reprodução/Vogue Runway).

De primeira, os looks que chegam são em preto. Tendo uma única cor, o óbvio pode ser estabelecido. Mas não para Miuccia e Simons. As peças em couro apresentam detalhes únicos e um tanto quanto ‘estranhos’. São shorts curtos de alta resistência. Eles fazem match perfeito com as próximas peças workwear que chegam e compõem o look, como uma bolsa saco grande de couro. Um dos pontos cruciais e admirados da coleção, foi a apresentação de uma versão física do casaco, quadriculado em vermelho e branco, recebido em papel em forma de convite do desfile. Ele é uma terceira peça marcante em cima de peças de couro bem estabelecidas na combinação. 

Para quem recebeu looks all black em couro e ternos em preto como abertura dos primeiros designs do desfile, não imaginava que, em algum momento, viriam uma sequência de jeans lavados. Bem como trench coats em bege e alguns quadriculados. 

Uma coleção que transita em diferentes estéticas do homem moderno. Ele pode usar três estéticas da coleção num mesmo dia, essa é a transição da Prada.

Dior Men:

A coleção de verão 2023 de Kim Jones para a Dior masculina segue nos mesmos moldes de suas anteriores: o estilista desenvolveu um processo criativo que lhe permite criar coleções esteticamente diferentes porém com uma mesma base. Para isso, ele faz sempre uso de um tema visual por apresentação, além referências artísticas – muitas vezes colaborativas – específicas, que na maioria das vezes viram estampas e dão o tom da cartela de cores da apresentação (e também da direção de arte e cenário). Na coleção apresentada ontem (24/06) o tema escolhido por Jones foi a icônica casa de campo em Granville, França, de Christian Dior; e também a “Charleston Farmhouse”, moradia inglesa dos artistas Duncan Grant e Vanessa Bell, que é associada ao movimento Bloomsbury – tradicional grupo de intelectuais e artistas ingleses do começo do século XX que tinham o feminismo e a libertação sexual como pautas, dentre eles, Virginia Woolf.

Jones faz uso da casa de Dior enquanto cenário e se apropria dos jardins e das flores do local para criar roupas que tem um toque de uniforme de jardinagem. Aventais viram capas e blusas, galochas se transformam em coturnos com meias acopladas e bolsas e pochetes recebem cordas, desenhos e modelagens tradicionais de acessórios para jardinagem. Tudo é feito de maneira a homenagear o artista Duncan Grant, que tinha a atividade de cuidar do jardim como um de seus hobbies favoritos. A tradicional alfaiataria impecável de Jones é o que dá liga e forma a toda apresentação, construindo uma narrativa elegante e jovem através da desconstrução de calças e paletós e a implementação de estampas coloridas e detalhes irresistíveis – pense em broches de cristais e capas para Air Pods completamente bordadas, por exemplo.

Ao final, a tática do estilista é clara: ele se utiliza de um processo criativo poderoso de base que, ao mesmo tempo que se repete, é capaz de produzir peças-desejo que serão sucesso a cada nova coleção. Nada mal para um estilista que, agora já há três temporadas também à frente do feminino da Fendi, tem que desfilar 8 coleções ao ano.

Courrèges:

Desde sua estreia na marca retrô futurista em março de 2021, Nicolas Di Felice vem mostrando seu respeito e admiração pelo fundador da maison, Andrè Courrèges, em cada uma de suas coleções, e não seria diferente nesta temporada de Spring 2023 Menswear.

Com uma coleção minimalista, Di Felice ficou restrita à uma cartela de cores sucinta mas muito característica de Courrèges nos anos 60. Entre tons de branco, off white, caramelados, preto e azul oxford, o designer belga introduziu peças que exploram um corte sexy e até mesmo mais “feminino”, trazendo um ar de androginia em seus modelos para a coleção masculina desta primavera. 

O diretor criativo soube usar ao seu favor a fusão de silhuetas sensuais em corpos onde a pele dos modelos também se torna um acessório na avaliação do mapa de coleção de Di Felice. Peças em couro e vinil não podiam faltar em mais uma apresentação da marca, o jogo entre calças de alfaiataria e calças jeans com um corte mais despojado acompanhadas de t-shirts com a logo gráfica da maison e com recortes de acabamento. 

O ar retrô futurista faz o seu retorno principalmente nos acessórios de escolha do designer e nos acabamentos: pares de óculos escuros e espelhados, bonés arredondados em couro, calças e bermudas com duplo cós, tiras de nylon e de tecido plano em peças de alfaiataria.

A coleção traz consigo um frescor para o perfil do consumidor masculino da Courrèges, um frescor despojado de um homem que não pensa muito em qual look usar pela manhã, mas segue sua intuição e seu senso estético contemporâneo ao seu tempo mesmo trazendo detalhes e símbolos de moda que faziam sucesso nos anos 60.

Givenchy:

Modelos desfilaram sob névoa e água branca para a temporada de primavera/verão de 2023 em Menswear na Givenchy, sob a direção criativa de Matthew Williams, um designer que prometia novos rumos para a marca com sua chegada, sua expertise em acessórios inovadores e ligação direta com mestres do streetwear pareciam exatamente o rumo que levaria a tradicional casa de moda francesa para um sucesso de vendas jovial. Expectativa que foi rapidamente contrariada ao passo das temporadas, um começo de alfaiataria moderna, acessórios e styling interessantes com referências fortes de Alexander McQueen quando foi diretor criativo da marca em meados dos anos 90 e começo dos 2000, foram trocados por roupas retiradas e replicadas da era Tisci em 2010.

Desfile da Givenchy (Reprodução/marca).

A era de Ricardo Tisci como diretor criativo da Givenchy foi um dos grandes momentos de lucros na marca, com grandes logos e uma node ao gótico, sempre numa balança de elementos, Tisci trouxe a marca para a era digital. Williams tenta replicar desesperadamente o sucesso de vendas desde então, esquecendo-se que o seu grande forte como designer são inovações em acessórios e styling como um geral, contudo o que é possível observar da nova Givenchy do designer é uma obra sem espiritualidade, com logos estampados e monogramas por toda a passarela, roupas que facilmente encontramos na rua ou nas redes sociais.

O que parece é uma pressão astronômica do conglomerado de luxo dono da Givenchy para triplicar as vendas e restabelecer a marca no pós-pandemia, pressão que cai sob os ombros de um designer que mal tinha se estabelecido na marca, dito isso quando é analisado a coleção passada da marca pessoal de Williams, a ALYX parece a irmã jovem, inovadora, que mistura tendências atuais e alfaiataria contemporânea na medida certa. Seria muito bom ver esse espírito ser replicado na Givenchy.

Desfile da Givenchy (Reprodução/marca).

Sobre a coleção em si, grande parte se compõe de cores neutras com pontos vibrantes de cores neon entre os looks, com materiais diversos do cotidiano como moletom, couro, cargo e jeans, silhuetas despojadas que remetem realmente a uma pessoa comum – ou que você encontraria numa loja de departamentos – o que foi basicamente a inspiração do designer para a coleção, as pessoas ao seu redor e como elas se vestem, uma noção segundo ele moderna de olhar para tendências e moda. Com os ciclos da indústria cada vez mais rápidos, as grandes tendências não são mais ditadas pelos grandes estilistas parisienses e as revistas de moda, eles mais acompanham do que as criam ao passo desenfreado que a internet leva uma micro tendência ao ponto da exaustão.

“Sabe, acho que tudo sobre a marca é baseado na realidade. Eu podia ver esse cara, como ele parece, existindo na rua. E para mim, essa é uma abordagem realmente moderna da moda”, explica o designer para a jornalista Sarah Mower.

O ponto sobre Williams olhar para sua trajetória e interior como designer ao invés de tentar atingir o inatingível replicado, volta quando olhamos para o final da coleção, entre os looks 46 ao 50, vemos uma visão diferente de sua direção criativa, mais polida e atemporal mas sem desistir do twist moderno, uma das coisas inauguradas nesta temporada que também fez grande sentido foi o começo da linha de jóias masculinas.

Y/Project:

It’s all about jeans! Glenn Martens talvez seja um dos principais nomes das últimas edições das semanas de moda, e a cada edição ele nos prova o porquê, o que não seria diferente em sua temporada de Primavera/Verão 2023 para o calendário de menswear. Em sua assinatura completamente lúdica e inovativa, a coleção do designer para a Y/Project é contemplada em quase sua totalidade com a aparição dos famigerados jeans, além da presença ilustre dos brincos com a forma divertida do ‘’dedo do meio’’.

Desfile da Y/project (Reprodução/marca).

Além disso, as silhuetas da coleção foram apresentadas de maneira distorcida, de modo que desse espaço para a criação de novas silhuetas surpreendentes ornadas com gráficos, incluindo a impressão de um logotipo da famosa Torre Eiffel. A coleção ainda conta com a segunda parte da parceria de Glenn com Jean Paul Gaultier, com novas composições trompe l’oeil representadas durante a exposição. Outra contemplação nas passarelas do Y/Project foi o acompanhamento perfeito das botas de cano alto grandes com as peças apresentadas por Martens nesta edição, além dos tops brancos suspensos nos ombros com alças milimetricamente invisíveis e a incrível sustentação arquitetônica para unir os jeans, a alfaiataria e os maxis dos anos 2000. 

Frenezi no Met Gala 2022

Continuando a cobertura oficial da Frenezi sobre o baile do Met de 2022 — qual aconteceu na primeira segunda-feira de maio (02) como tradição —, o evento contou com os co-anfitriões Regina King, Blake Lively, Ryan Reynolds e Lin-Manuel Miranda.

Todos os anos desde sua fundação, o baile do Met (que foi criado como uma forma de arrecadação de fundos para o costume institute do Museu Metropolitan em Nova Iorque) tem um tema de vestimenta para seus convidados que sempre representa de certa forma a exposição anual do instituto de figurinos no museu. Para este ano o tema foi ‘Gilded Glamour’, um opulente momento da história estadunidense que data entre 1870 e 1890, de efervescência cultural, inovações tecnológicas e mudanças no vestuário.

Entenda mais sobre o tema do Met Gala 2022 em nosso texto especial apenas sobre ele, disponível aqui.

A editoria de Moda selecionou alguns grandes momentos desta segunda-feira, e entre os melhores (e os piores) looks temos alguns memoráveis para a história do baile:

Blake Lively de Atelier Versace (Reprodução/Vogue Runway).

Blake Lively

Blake Lively trouxe em seu design um dos símbolos mais importantes de Nova York: a Estátua da Liberdade. Usando custom Versace e se adequando à época do tema, o modelito é um vestido longo com luvas de ópera e laçarote. Em determinado momento do red carpet, a capa ouro-rosada é solta e apresenta a segunda cor: o azul. A Estátua da Liberdade chegou em NYC em 1885 durante a Gilded Age e, inicialmente, foi construída em cobre, mas com o tempo oxidou fazendo com que se tornasse azul.

(Reprodução/Vogue Runway).

Emma Chamberlain

Transitando entre a Gilded Age e a atualidade, a influencer Emma Chamberlain — embaixadora da Louis Vuitton — vestiu um look custom da marca que dividiu opiniões: a parte superior, em tom amarelo com babados, drapeados e mangas estilo princesa remete à Idade Dourada, enquanto a saia branca, justa e lisa, traz um aspecto mais moderno, marcando a dicotomia da produção.

(Reprodução/Vogue Runway).

Lizzo

Lizzo chegou ao Metropolitan Museum tocando uma flauta The Dryads Touch, adornada em ouro 18k — considerada a mais bonita do mundo. E por cima do vestido preto, em estrutura de espartilho e com recortes na parte inferior, a cantora vestiu uma verdadeira obra de arte: um longo casaco preto, com bordados dourados, custom Thom Browne, que foi desenvolvido em cerca de 22 mil horas — equivalente a 916 dias, ou seja, aproximadamente 2,5 anos. Levou a sério o Gilded Glamour!

(Reprodução/Vogue Runway).

Taylor Hill

A modelo Taylor Hill apostou num vestido com decote ombro-a-ombro, em cetim azul, da designer Miss Sohee. A junção da cintura marcada pelo corpete com flores bordadas, a cauda e as botas over the knee, em mesmo tecido, com amarração frontal, resultou numa belíssima silhueta, trazendo o volume característico da Idade Dourada. Um dos melhores momentos de moda da noite.

(Reprodução/Vogue Runway).

Laura Harrier

Laura Harrier usou custom H&M, em colab com Victor Glemaud. A estrutura em corset, combinada à saia ampla e volumosa — criada a partir de uma anágua original da época — marcarou a clássica silhueta em ampulheta, enquanto o tecido brilhante trouxe um toque moderno. Para compor o look, sua stylist Danielle Nachmani escolheu um colar de pérolas criado por David Yurman — designer que já assinou diversas joias utilizadas pela atriz.

(Reprodução/Vogue Runway).

Nicola Coughlan

Talvez um dos principais nomes da noite, a atriz Nicola Coughan (mais conhecida por seu papel como Penelope na série ‘Bridgerton’) parece ter se juntado ao grupo seleto de celebridades que se arriscam ao tema proposto. Em sua estreia no Met Gala a atriz optou por trabalhar ao lado de Richard Quinn — designer britânico —, e sua escolha, apesar de repreendida por muitos pelos tons usados, foi totalmente de acordo com a proposta desta edição. Nicola passou pela escadaria do MET num vestido rosa e preto com mangas bufantes e pontilhado com flores, que exala Gilded Glamour. O pecado talvez tenha sido a escolha dos cabelos soltos e escorridos — mas diante do que foi apresentado por outras celebs na noite, nós deixamos passar!

(Reprodução/Vogue Runway).

Anitta

Em seu segundo Met Gala, Anitta seguiu o tema proposto. E à risca. Usando um custom Moschino, roxo — cor associada à alta sociedade da época, visto que o pigmento púrpura era bastante raro e caro — com cintura marcada pelo espartilho e contrastando com o volume na região do quadril, a peça tinha como adornos e acessórios as pérolas, que trouxeram ainda mais glamour para a produção da nossa Girl from Rio. Com certeza um grande momento!

(Reprodução/Vogue Runway).

Kaia Gerber

A aparição de Kaia na primeira etapa do Met Gala, a ‘In America: a Lexicon of Fashion’, em um vestido Oscar de la Renta foi extremamente consistente e aclamada — o que infelizmente parece não ter acontecido nesta edição de 2022 e segunda parte do evento, ‘In America: An Anthology of Fashion’, em que a proposta era explorar a era dourada estadunidense. Apesar de ter escolhido um modelo Alexander McQueen (marca em que Kaia esteve presente nas passarelas desde seu início como modelo) dourado — o mais próximo da proposta — e com detalhes em franjas metálicas e muito brilho, o vestido parece não ter sido a melhor opção. Em um tema que buscava apresentar ao público as grandezas do país norte-americano, o combo Kaia x McQueen deixou o dever de casa de lado, a não ser pela escolha do cabelo — em cachos — que parece ter sido a atração principal.

(Reprodução/Vogue Runway).

Kim Kardashian

Kim Kardashian protagonizou um dos momentos mais impactantes do Met Gala 2022 ao usar o vestido cravejado de cristais (assinado por Bob Mackie, em seu primeiro projeto de pós-graduação) pertencente a Marilyn Monroe, utilizado pela atriz em 1962 durante o polêmico “Happy Birthday, Mr. President” no aniversário de 45 anos do ex-presidente dos Estados Unidos, John F. Kennedy. O vestido é uma verdadeira relíquia e estava exposto no museu Ripley’s Believe it or Not, em San Francisco. Por ser um acervo tão importante, não poderia ser alterado — por isso Kim precisou emagrecer cerca de 7 quilos em 3 semanas para que pudesse vestir a peça sem danificá-la.

O original foi usado apenas para uma sessão de fotos antes do evento, e durante a noite Kim usou uma réplica do modelo. Ainda assim, o ato foi criticado por especialistas em conservação do próprio Costume Institute, que julgaram como uma situação arriscada visto que o design é a vestimenta mais cara já leiloada da história, vendida por U$4,8 milhões. Apesar de fugir do dress code da noite, Kim se adequou ao tema da exposição como um todo ao usar um dos vestidos mais importantes da história da moda estadunidense, no mais importante evento fashion que tinha como proposta central a história da moda dos EUA.

(Reprodução/Vogue Runway).

Kylie Jenner

Kylie Jenner prestou homenagem ao seu falecido amigo Virgil Abloh usando um dos looks da sua última coleção: o vestido de noiva que encerrou o desfile. Em 2020, ela havia dito a ele que usaria um design da Off-White para o Met, mas o evento foi cancelado por conta da pandemia e infelizmente ele não pode ver em vida este momento. Portanto, Kylie escolheu o evento de segunda-feira para prestigiar Abloh e a marca. O vestido é branco e longo, e ela inseriu um boné fazendo referência ao streetwear de Virgil.

(Reprodução/Vogue Runway).

Rosalía

Para esta edição do Met Gala, Rosalía usou custom Givenchy Haute Couture desenhado por Matthew M. Williams. O vestido era um longo em tule de seda, de tom marfim, repleto de adornos e cristais cravejados, que foi combinado à bolsa e luvas bordadas, joias e óculos de sol (tudo também Givenchy) que trouxeram um toque moderno. O look da Motomami se adequa à estética Gibson Girl — mas passou bem perto do tema, vai!?

(Reprodução/Vogue Runway).

Shawn Mendes

Não é segredo algum que a maioria do público masculino opte por ternos pretos, básicos e convencionais, seja qual for o tema. Este é um caso também específico de Shawn Mendes. Entretanto, nesta edição de 2022 o astro se permitiu arriscar e tentar seguir um pouco o tema apresentado — mesmo que não tenha sucedido 100% na tarefa. Em seu terninho Tommy Hilfiger, o cantor parecia mais saído diretamente das produções de Bridgerton (com semelhanças com o personagem Anthony) ou de alguma produção da Disney do que da Era Dourada norte-americana em si.

(Reprodução/Vogue Runway).

Bella Hadid

Em referência à obra ‘Retrato de Madame X’, feita em 1884 pelo artista John Singer Sargent — que está exposta no próprio Metropolitan Museum of Art —, a supermodelo Bella Hadid usou um vestido preto Burberry, em corset, com saia fluida cuja abertura lateral revelava a meia calça em renda. Não podemos esquecer da tornozeleira de pérolas, que roubou todos os holofotes. O design foi uma ode à primeira versão do quadro, que foi ridicularizada pela sociedade da época por conta da vestimenta muito sugestiva da pintura.

(Reprodução/Vogue Runway).

Billie Eilish

A cantora Billie Eilish foi uma das celebridades que mais se adequou ao tema do baile. Usando Gucci, fez homenagem ao ‘Retrato de Madame Paul Poirson’ de 1885, por John Singer Sargent, conhecido por fazer retratos da sociedade sobre a moda. As cores do vestido e a silhueta vão de encontro à Gilded Age, e com um toque de personalidade, ela insere a gargantilha preta.

(Reprodução/Vogue Runway).

Adut Akech

A supermodel Adut Akech encantou a todos com um vestido verde esmeralda vintage de Christian Lacroix para Shrimpton Couture (da coleção Outono/Inverno de 2003), em modelo ombro-a-ombro, com bordados na região da cintura e detalhes em azul turquesa. Inspirado na pintura da árvore da vida que decora a escadaria do Chateau-sur-Mer, construído em 1852 em Newport, o local foi um marco da alta arquitetura Vitoriana, e redecorado seguindo o estilo do Segundo Império francês durante a década de 70.

(Reprodução/Vogue Runway).

Olivia Rodrigo

Em vestido custom Versace de malha metálica lilás, com abertura lateral, o modelo vestido por Olivia remetia ao vintage, porém com elementos modernos: combinado a luvas de tule em um tom mais claro e adornos de borboletas nos cabelos, a cantora apostou numa estética mística, sonhadora e glamourosa — mas que ainda assim exalava seu estilo teen rockstar.

(Reprodução/Vogue Runway).

Cardi B

Com uma entrada triunfal ao Metropolitan Museum of Art, Cardi desfilou pelo tapete vermelho do evento com um atelier Versace todo em joalheria dourada, talvez sendo a referência mais literal ao Gilded Glamour proposto — mas que apesar da distância com a proposta real, não deixou o bom gosto de lado.

(Reprodução/Vogue Runway).

Normani

Vestindo Christian Siriano, Normani entregou o que talvez tenha sido um dos principais looks da noite. A cantora optou por um look all black, mas que trouxe as referências e a silhueta da Era Dourada para uma pegada totalmente moderna e sexy que se encaixa completamente com seu estilo. Se uma das propostas entre a dupla Normani e Siriano era quebrar as regras, fizeram isso muito bem!

(Reprodução/Vogue Runway).

Sarah Jessica Parker

Sarah Jessica Parker desfilou pela escadaria do Met em um custom Christopher John Rogers homenageando Elizabeth Hobbs Keckley, escritora e primeira mulher negra — que nasceu em situação de escravidão — a se tornar modista da Casa Branca, durante o mandato de Abraham Lincoln. A saia volumosa traz a clássica silhueta da Gilded Age, já a estampa quadriculada do modelo usado pela nossa eterna Carrie Bradshaw faz referência a um dos designs mais importantes criados por Keckley, para a então primeira dama Mary Todd Lincoln.

(Reprodução/Vogue Runway).

Katy Perry

Talvez um dos poucos nomes de destaque da noite, a artista Katy Perry surpreendeu ao posar no red carpet com um vestido assimétrico — nos tons de creme e preto — com rendas florais, da marca também norte-americana Oscar de La Renta. Sem deixar de ser excêntrico, discreto (se comparado às últimas escolhas da cantora nas edições passadas do Met) e também sexy, a peça ainda trouxe algumas referências a vestimenta e obras de arte da época pretendida a ser abordada. O look foi completo com a presença de luvas — bastante protagonistas na época —transparentes.

(Reprodução/Vogue Runway).

É… Talvez Anna Wintour não tenha acertado no tema para a edição de 20022 — em geral, não houve grande aderência — e ainda assim, o Met é sempre uma experiência para os amantes da moda. Qual foi o seu look favorito da noite


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Met Gala 2022 – Gilded Glamour

A época da Inocência (1993) Reprodução/ Vogue US

Bem: finalmente chegamos na primeira segunda-feira de Maio, após dois anos turbulentos de pandemia. Em 2021 foi anunciado que o baile e a exposição do Costume Institute — órgão regulador da preservação ativa de tecidos e roupas históricas do Metropolitan Museum of Art — foram divididos em duas partes.

Sendo a primeira parte uma ode a moda Norte-americana com um twist moderno (como roupas de designers independentes), brilharam na exposição peças como o vestido xadrez de Christopher John Rogers ou criações de Prabal Gurung. O tema escolhido para o baile de 2021 foi exatamente sobre essa ativa exaltação da moda Norte-Americana.

Infelizmente o evento acabou sem muito clímax, com uma grande quantidade de convidados esquecendo o tema em casa e oportunidades perdidas de grandes momentos que poderiam ser memoráveis. Poucas previsões sobre a volta do baile naquele ano foram vingadas, e o esforço de um baile pós-pandemia de parar o mundo da moda com grandes entradas realmente não aconteceu com a força que muitos desejavam.

Os organizadores e curadores do evento, Andrew Bolton e Anna Wintour, nunca foram de perder muito tempo — a segunda parte do evento contará com uma representação histórica estadunidense, incluindo vestimentas utilizadas durante o racionamento na época de guerra, Era Dourada, anos vinte, entre outros grandes momentos ligados diretamente com a história da moda americana:

“Esta segunda exposição, apresentada em 13 das salas do período americano no Met, “fornece um contexto histórico para Lexicon, de certa forma”, disse o curador Bolton.  “As histórias realmente refletem a evolução do estilo americano, mas também exploram o trabalho individual de alfaiates, costureiras e designers”, diz ele.  “O que é emocionante para mim é que alguns dos nomes são muito familiares para os estudantes de moda, como Charles James, Halston e Oscar de la Renta, mas muitos outros nomes realmente foram esquecidos, ignorados ou relegados às notas de rodapé de  história da moda.  Portanto, uma das principais intenções da exposição é destacar os talentos e contribuições desses indivíduos, e muitos deles são mulheres.”

Andrew Bolton para a Vogue UK.

Na última linha de cada convite para o baile do Costume Institute é possível encontrar o tema e o código de vestimenta para o evento. Todos os anos desde sua fundação em 1943, o tema do baile é proporcional à exposição anual do instituto de figurinos, sendo a exposição deste ano (‘In America: An Anthology of Fashion’) construída em torno dos princípios do estilo americano entre a sua história e celebrando designs dos EUA, segundo a Vogue. Levando em consideração essa ligação, o tema escolhido para esse ano olhou para uma era específica interessante.

O título oficial do tema é o “Gilded Glamour” uma intrínseca nomeação, qual é a junção do “Gilded” — que se refere a Gilded Age, a era dourada — e o “Glamour” como uma volta para as raízes glamourosas e opulentas do baile. Após críticas sobre o ano passado, esse será um baile com o código White Tie como vestimenta oficial. O evento acontece na primeira segunda-feira (02) de maio, com os co-chairs como Regina King, Blake Lively, Ryan Reynolds e Lin-Manuel Miranda.

A série distribuída e produzida pela HBO Max Era Dourada (2022)

O tema

A Era Dourada foi um momento de grandes inovações em diversos departamentos da sociedade. Máquinas sendo construídas, tecnologias se desenvolvendo, imigrantes embarcando para os EUA, e uma nova classe social endinheirada graças às revoluções industriais surgia após os racionamentos da Guerra de Secessão — em Nova Iorque uma verdadeira guerra fria aconteceu entre os antigos ricos e os novos rico. Um tempo de movimentação social e o começo da dita modernidade, uma nova era estava no ar e era possível sentir.

O nome “Era Dourada” foi popularizado graças ao escritor Mark Twain, que se refere exatamente a 1873 até meados de 1890 como o período dessa efervescência cultural americana. Mas sabem quem realmente prosperava neste tempo? A farta alta-sociedade nova iorquina.

O Met Gala 2022 pedirá a seus participantes que incorporem a grandeza e talvez a dicotomia da Gilded Age de Nova York: a prosperidade, mudança cultural e industrialização sem precedentes, quando fortunas aparentemente surgiram da noite para o dia. A Sra. Astor e seus 400 governaram a sociedade educada até que os Vanderbilts com dinheiro novo se forçaram a entrar. E imigrantes chegavam em navios fartos para tentar a sorte na cidade de Nova Iorque, assim como pessoas dentro do país tentavam se estabilizar e esquecer a guerra passada.

New money x Old Money:

“As melhores histórias tendem a contar com uma fada madrinha para acenar sua varinha mágica para fazer acontecer, mas na vida real, um pai bem colocado pode fazer o truque” Nina-Sophia Miralles em ‘Glossy: The inside story of Vogue‘.

Carolus-Duran (1890) Mrs. William Astor, Caroline Webster Schermerhorn, 1831–1908 (Reprodução/MET)

Nascida como Caroline Webster Schermerhorn, a Senhora Astor era uma herdeira milionária em seu direito próprio: depois de ter criado cinco filhos começou a procurar por seu chamado verdadeiro, era uma mulher descrita como ainda regente às severidades da era Vitoriana. Ela decidiu que sua trajetória era proteger uma hierarquia elitista estabelecida por sua posição vantajosa entre as duas principais famílias ricas de Nova Iorque na época.

Em 1892 foi anunciado para a imprensa que a Mansão Brownstone da família Astor na quinta avenida conseguia acomodar apenas 400 pessoas em seu salão de baile. A capacidade do cômodo era uma simbologia: em conjunto com a tenacidade de sua proprietária, os 400 convidados personificariam o que havia de melhor da sociedade Nova Iorquina — afinal, que jeito melhor de deixar os novos ricos de fora do que literalmente tirá-los das festas?

Figurinos de A época da inocência (1993).

Os quatrocentos se tornaram rapidamente um apelido para a quantidade limite de quem poderia entrar para o status quo tradicional, preparados para serem reconhecidos como socialmente relevantes. Entre dos quatrocentos (e um grande aliado da senhora Astor) estava Arthur Turnure, que também procurava uma nova trajetória e no mesmo ano se preparava para introduzir sua debutante à sociedade — a jovem se chamava Vogue. Não por coincidência, a primeira edição da revista tinha como ilustração de capa uma debutante à bordo de uma cintura apertada e luvas longas, com as letras VOGUE acima.

Turnure era um cavalheiro muito bem conectado na sociedade. Charmoso, eloquente, entusiástico e cosmopolita são palavras utilizadas para descrevê-lo, segundo a autora, e muito da antecipação da cidade em conhecer sua nova empreitada vinha de sua popularidade eminente. A carta de abertura da primeira edição da revista era cheia de significado reforçando a importância da elite de Nova Iorque;

A sociedade americana tem a distinção de ser a mais progressista do mundo: a mais salutar e a mais benéfica.  É rápido para discernir, rápido para receber e rápido para condenar.  Não é atrapalhado por uma nobreza degradada e imutável.  Tem o mais alto grau de aristocracia fundada na razão e desenvolvida na ordem natural.” Parte da carta de abertura da revista Vogue assinada por Arthur Turnure.

Os meios de comunicação também prosperavam durante esse tempo: telefone, jornais e revistas tiveram suas circulações aumentadas e mais páginas adicionadas. O tema deste ano do baile do Costume Institute não apenas é uma ode à um momento especial da cidade de Nova Iorque, é uma ligação direta com a história da própria revista Vogue, sua criação e seu fundador não conseguiriam de forma alguma prosperar sem a ajuda da alta-sociedade e a benção da senhora Astor.

O que esperar do Baile do MET de 2022?

“Para o alto escalão, a moda naquele período era de excessos. Graças às recentes inovações dos teares elétricos e movidos a vapor, o tecido tornou-se mais rápido e barato de produzir. Como resultado, os vestidos femininos geralmente apresentavam uma combinação de muitos tecidos, como cetim, seda, veludo e franja, todos adornados com texturas exageradas, como rendas, laços, babados e babados. (O edital não oficial? Quanto mais acontecendo, melhor.)” – Elise Taylor para a Vogue US.

Grandes capas da Vogue nesta época conseguem traduzir um pouco das lentes, opulência e glamour que a vestimenta reproduzia nessa época, com uma infinidade de tecidos como veludo, renda e tafetá, tons de joias com baixa exposição e grandes pedras adornando os pescoços. Podemos esperar realmente um baile como nenhum outro. Se o tema for seguido.

Acredito que uma previsão com a qual podemos contar é a reinterpretação da palavra Gilded como uma forma de vestimenta completa: vestidos inteiros em dourado, grandes joias em ouro, o dourado como o ponto central e completo do look. Vestidos longos com caudas e bordados no tom, Schiaparelli de Daniel Roseberry, Loewe de Jonathan Anderson e Versace de Donatella Versace seriam ótimos para representar essa parte mais moderna da interpretação do tema.

Afinal, não podemos pedir uma silhueta de 1870 em um baile de 2022, poderia ficar até caricato de certa forma… Mas existem nuances que podem te fazer entrar no tema sem perder a beleza moderna e agradar os amantes da moda. Interpretações de códigos da Era dourada como corsets dos mais variados tipos, especialidades de Vivienne Westwood e John Galliano; luvas adornadas, decotes, tecidos ricos e tons de jóias podem ser ótimas apostas; pedrarias e pérolas podem funcionar a favor do look. Depois de um tempo turbulento na indústria e um baile anti-climático em 2021, esperamos que com um tema tão rico e glamouroso, com inúmeras referências e oportunidades, os convidados tenham criatividade para entregar um Baile do Met memorável.


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Frenezi no tapete vermelho do Oscar 2022

A temporada de premiações é sempre muito esperada em diferentes ramos da arte, de música à cinema, mas principalmente os tapetes vermelhos que roubam a cena — são muitos os rostos aproveitando o momento para colocarem seus melhores e mais opulentes vestidos para as cerimônias.

De Gwyneth Paltrow no vestido rosa pálido com uma grande saia de tafetá na cerimônia de 1999, Cher usando Bob Mackie com uma coroa de penas e saia brilhante em 1986 e Gillian Anderson com calcinha a mostra em 2001, o evento rendeu alguns momentos memoráveis para a moda.

Na edição de 2022, alguns deixaram a desejar com a escolhas de figurinos — uma onda um pouco mais básica inundou a cerimônia — enquanto são esperados grandes momentos na premiação ano, mas outros…

Confira as escolhas da editoria de moda da Frenezi para os melhores looks da noite:

Izabella Ricciardi – Editora de moda 

Deixando claro como o dia que o meu favorito de toda a noite foi, sem dúvida alguma, Jada Pinkett Smith de Jean Paul Gaultier Couture Spring Summer 2022 por Glenn Martens. Apesar disso, é perceptível no tapete vermelho como um todo uma mudança interessante no vestuário das premiações. Entre os últimos anos, se gostariam de ter um grande impacto na cerimônia, a presença era marcada com uma saia bufante e enorme de tulle assinada pela Giambattista Valli, ou um Valentino assinado por Pierpaolo Piccioli.

Contudo, as silhuetas na Alta-Costura ficaram mais limpas e retas na Valentino, o tule da Giambattista nunca se renovou: talvez a estética tenha oficialmente morrido por ter sido feita diversas vezes — ou talvez porquê o vestido de Ariana Grande no Grammy de 2020 ficou tão conhecido (e era por sua vez tão grande e volumoso) que seja quase impossível fazer algo maior.

Com a estreia de Demna Gvasalia na Alta-Costura da Balenciaga no ano passado — que teve uma boa influência nos vestidos de baile — ao que parece os tapetes vermelhos deram uma virada gótica. Com os momentos de grandes e volumosos vestidos sendo agora de tafetá — amassado ou em babados — o importante é ser grande, assim como o vestido de Kendall Jenner assinado pelo próprio Demna Gvasalia, Billie Eilish de babados Gucci por Alessandro Michele e finalizando com a versão mais comercial da nova estética que conserva o formato do corpo dentro do vestido, Laverne Cox de August Getty.

Luiz Fernando Neves – Repórter de Moda

Certamente o look mais polêmico da noite, Kristen Stewart cruzou o tapete vermelho do Oscar vestindo um conjuntinho de terno e shorts da Chanel, marca que a atriz mantém uma parceria há anos. O look pode até incomodar a primeira vista, mas o fato é que ninguém além de Kristen conseguiria segurar esse visual. A atriz, que declarou recentemente que “não liga a mínima” para a premiação, soube traduzir perfeitamente sua alma e estilo através da composição, sendo coerente com quem ela é — e, de quebra, ainda fez história: foi a primeira pessoa a vestir shorts na história do prêmio.

Kristen Stewart de Chanel (Foto: Reprodução / Vogue)

Julia Ferreira – Repórter de Moda

Dessa vez Hunter Schafer se afastou do seu guarda roupa à la Prada e apostou no universo gótico e pós apocalíptico de Rick Owens da coleção de Outono/Inverno 2022. A modelo/atriz se aventura em um vestido de gala de jeans manchado com costas à mostra e o cabelo molhado repartido ao meio, roubando assim os holofotes do tapete vermelho da after party da Vanity Fair.

Maria Fernanda Rocino – Repórter de Moda

Dakota Johnson de Gucci por Alessandro Michele foi um dos grandes momentos. Não só pelo look exuberante, mas pela escolha de usar no Oscar um look de uma coleção inteira dedicada à Hollywood.

Liz Bichara – Repórter de Moda

Timothée Chalamet surpreendeu, mais uma vez, ao usar Louis Vuitton para a premiação do Oscar. O astro de Duna — filme mais premiado da noite — apostou em um blazer cropped de renda, sem camisa, desfilado na coleção Primavera/Verão 2022 de womenswear.

Mirelle Carvalho – Repórter de Moda

Enquanto diversos artistas buscaram continuar em sua zona de conforto apostando em vestidos básicos convencionais e talvez nada dignos de um tapete vermelho do Oscar, Jada Pinkett Smith escolheu nada mais nada menos que um dos vestidos mais comentados da última coleção de Primavera/Verão Alta-Costura 22 da Jean Paul Gaultier, assinada por Glenn Martens. Acontece que, apesar de o vestido não ser sustentável para todos que possivelmente possam escolhê-lo, parece ter sido desenhado para Jada, que consequentemente sustentou lindamente o look escolhido e arrancou suspiros por onde passou, se consagrando como uma das possíveis personalidades mais bem vestidas da noite.

Jada Pinkett Smith de Jean Paul Gaultier (Foto: Reprodução/ Celeb Mafia)

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Frenezi nas Semanas de Moda de Outono Inverno de Paris

Finalizando as coleções da temporada de Outono/Inverno de 2022 entramos na semana de moda de Paris, cidade conhecida por ter o mais extenso e completo calendário. Com mais de oito dias e sendo um epicentro da moda internacional, Paris conta também com as maiores marcas contemporâneas, com os grandes conglomerados de luxo — principalmente LVMH e Kering — apresentando a maioria de suas marcas durante a semana.

O governo francês também não deixa a desejar, impulsionando a moda nacional com o próprio sindicato de Alta-Costura e Moda que monitora e organiza as semanas de moda no país. Paris funciona como um termômetro econômico da temporada, analisando desde dos clientes da moda de luxo até mesmo os eventos que acontecem na cidade durante os dias.

Durante a Paris Fashion Week, a geopolítica internacional se virou para o conflito em território ucraniano, e apesar dos grandes esforços de muitos da moda em tentar parecer sentimentais e contemplativos durante esse período, a semana não foi pausada e os eventos e festas continuaram regularmente. Acredito que das homenagens que aconteceram em Paris, a mais genuína e verdadeira veio de Demna Gvasalia na Balenciaga, falando de sua própria experiência como refugiado de guerra. Depois disso, aqui vamos com a cobertura completa da editoria de Moda da Frenezi com o final das apresentações da temporada de Outono:Inverno 2022.

Você pode encontrar o calendário oficial da Semana de Moda de Outono Inverno de Paris aqui.

Foto retirada do Instagram Oficial de Anthony Vaccarello, diretor criativo da Saint Laurent.

Confira a cobertura completa da Semana de Outono Inverno em Paris:

DIA 1

Off-White, a marca que não reconhece limites criada em 2012 por Virgil Abloh, marcou o início da temporada de Outono/Inverno 22 em Paris. Pouco mais de um mês após a apresentação da última coleção de Abloh para Louis Vuitton, na qual era diretor-criativo, chegou a vez de sua upstart personal label, que agora já não é mais upstart e pode muito bem ser equiparada a gigantes da Couture.

A apresentação que ocorreu na segunda-feira, 28 de fevereiro, na Galeria Lafayette foi a primeira homenagem da marca ao seu criador desde sua repentina morte em novembro do ano passado. Essa também é a última coleção feita e supervisionada por Virgil.

Nomeada ‘Spaceship Earth, an imaginary experience’, a apresentação foi ao mesmo tempo um tributo ao designer, mas também um sneakpeak do que será a Off-White no futuro. A questão e o ar de dúvida surgiram quase que imediatamente após o público saber do trágico falecimento do estilista (nacionalidade). O que será agora? Agora que mais do que nunca marcas e designers precisam estar com os sentidos aguçados para todos e quaisquer acontecimentos, já que a indústria da moda é uma das efêmeras e populares indústrias da atualidade. Entretanto, o desespero e aflição não são sentimentos assim tão desconhecidos, o mesmo aconteceu seguindo a morte do lendário Karl Lagerfeld ou do icônico Alexander McQueen.

A resposta foi nada menos que sorte por Virgil Abloh ser de fato genioso e à frente de todos. A coleção foi desenhada por Abloh e completada pelo seu time criativo e colaboradores, que seguiram um de seus inúmeros inspiring quotes: “Question everything”.

O desfile foi apresentado em dois atos: ready-to-wear e ‘Couture’. O primeiro focado no que a Off-White foi tão famosa por nos seus primeiros passos como marca: o streetwear, mas desta vez com o tom mais ‘adulto’ que Virgil queria alcançar para a marca. O estilo invencível da marca foi combinado com uma alfaiataria elegante e até sóbria, nos padrões Off-White; E o segundo tema, o high fashion que a marca migrou (e ainda migra) para: couture ou streetwear couture.

Na coleção ready-to-wear pudemos ser testemunhas de um incrível jogo de proporções. Highs com lows. O clássico com o nada óbvio. Cargo gears acompanhadas por vestidos de cetim, volumosas saias de tule com camisetas estampadas, alfaiataria elegante, jaquetas de esqui com tons sóbrios, tênis com vestidos de festa…

Entre os modelos e convidados estavam diversas celebridades e amigos pessoais de Virgil: Pharrell Williams e sua família na primeira fileira, a tenista Serena Williams e a DJ Honey Dijon, para citar alguns exemplos. a

Já a segunda parte da coleção, que Virgil começou a desenhar meses após sua ‘aparição surpresa’ na semana de Alta Costura parisiense no ano passado, foi pensada para representar um ‘tipo de mulher’ a cada looks: a noiva (desfilada por Bella Hadid de tênis e saltos na mão); a empresária; a diva ou a skatista (vestindo uma varsity jacket com uma volumosa saia de tule). Misturando referências subculturais ou estampas (“no snitching”) nunca antes pensadas de serem usadas em Couture.

Couture é definitivamente o epítome da moda, mas Virgil parece trazer esse mesmo couture de forma mais descontraída ou até alcançável. Afinal, seu legado teve início quando começou a inspirar gerações e a dizer-lhes ‘tudo é possível’. 

“The ethos of Off-White is it’s not just clothes. My inspiration and motivation is more the humanity level”

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

O segundo dia da semana de moda de Paris começa com mais uma coleção da Dior sob a direção criativa de longa data de Maria Grazia Chiuri. Uma apresentação no Jardin de Tuileries em Paris com uma atmosfera assinada pela artista Mariella Bettineschi na grande instalação da coleção, com porta retratos em todo seu entorno com retratos femininos famosos na arte europeia datando do século XVI até XIX, removendo figuras dos seus contextos originais e todas em preto e branco.

A coleção foi batizada de ‘A próxima era’ com a inspiração bruta sendo como o mundo retrata e se envolve da condição moderna do papel da tecnologia em nossas vidas. Parece anos luz de distância da coleção de Primavera/Verão 2022, qual foi inspirada na Dior na década de 1960, assinada por Marc Bohan entre mini saias vibrantes e cortes retos, homenageando uma característica importante na história da marca.

Apesar do tema desta temporada parecer muito interessante e com diversas formas de ser estruturado, a próxima era parece muito com as antigas coleções de Chiuri para a marca, com um desenvolvimento confuso e até um pouco chulo do tema nas roupas em si. Rendas combinadas com tipos diferentes de armaduras, camisetas com slogans sobre o futuro feminista, apesar de ser uma visão diferente dos outros trabalhos da designer para a Christian Dior, acaba parecendo razo a interpretação do mesmo no desenvolvimento.

“Temos essa ideia de que a tecnologia é algo um pouco irreal”, disse Chiuri para a jornalista Sarah Mower. “Usamos mais a tecnologia para comunicação e pensamos menos em como ela pode nos ajudar a viver melhor. Estamos acostumados a esperá-lo em coisas muito práticas: máquinas de lavar, mas não moda.”

O desenvolvimento da Saint Laurent pela direção criativa de Anthony Vaccarello é uma experiência única de se acompanhar. O designer encontrou uma situação complicada na marca em sua estreia, uma clientela que era fiel demais a seu antecessor criativo, pois Slimane criou não só um cliente mas um estilo de vida para a Saint Laurent, sem contar com um conglomerado por trás com sede das vendas da marca.

Com paciência ele foi entendendo a mulher Saint Laurent aos poucos, trazendo para mesma a sua própria visão criativa para a marca, uma node um pouco mais sensual e uma alfaiataria mais fina e refinada ele foi conquistando seu lugar na marca, e hoje traz seus melhores trabalhos até então.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Se distanciando muito do que o Heidi Slimane apresentava, apreciando a história e os arquivos da própria marca, vemos o Outono/Inverno de 2022 assinado por Vaccarello como uma carta de amor à Alta-Costura de Yves Saint Laurent na década de 1980. Com ombros altos e estruturados e vestidos retos e longos, ele mostra a todos que ninguém faz o chic effortless como a Saint Laurent.

Ternos perfeitamente alinhados, formas de triângulos invertidos, cores sóbrias mas quentes, acessórios grande e prepotentes, tudo isso em conjunto com novas formas de texturas dentro da coleção, de um terno com detalhes em cetim até opulente peles durante toda a coleção — vale lembrar que o grupo Kering baniu as peles verdadeiras de animais — e longos vestidos de festas que inclui transparências segmentadas, assimetria e rouching em diversos pontos.

É uma nova era para a Saint Laurent de Vaccarello, uma que olha para o interior da marca como um todo e faz associações interessantes para o consumidor contemporâneo, ele consegue reviver a musa YSL em sua melhor e mais atual forma a cada temporada.

DIA 2

Intitulada Princípios da Nossa Geometria’, a coleção Outono/Inverno 2022 da Courrèges foi desenvolvida por Nicolas Di Felice (atual diretor criativo da casa) com base nos estudos de André Courrèges (fundador da marca e engenheiro civil) acerca da aerodinâmica. Capas, abas e trench coats unem formas orgânicas à silhuetas exageradas, em modelagens meticulosamente proporcionais. De forma menos literal, o estilo aviador foi explorado na coleção através de jaquetas em shearling, óculos esportivos e amarrações cruzadas, inspiradas em cintos de segurança.

Decotes e recortes geométricos foram os pontos-chave da coleção, que possuía uma sóbria cartela de cores, contrastando com metalizados prateados em acessórios, botas over the knee e pontuais peças de roupa.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Com inspirações — literalmente — nas alturas, Nicolas ‘manteve os pés no chão’, focado em peças usáveis; “fazer roupas para as pessoas é o meu trabalho, não pode ser apenas sobre minhas fantasias”, disse em entrevista concedida para a revista ‘i-D’. Criar peças “reais” também era a principal motivação de Courrèges, que revisitou os arquivos da marca.

O clubwear aparece como um símbolo de liberdade, os cut outs e comprimentos mini são perfeitamente equilibrados por materiais como tricô e alfaiataria, vestindo igualmente em termos de elegância e bom gosto, mulheres de 20 ou 60 anos.

A marca das irmãs Mary-Kate e Ashley Olsen, que costuma apresentar apenas looks em tons sóbrios, trouxe para a temporada de Outono/Inverno uma cartela diversificada, repleta de cores saturadas em peças pontuais — mas ainda assim uma novidade para a The Row, que segue uma linha minimalista.

O mix entre sportswear e alfaiataria, em modelagens oversized e aparentemente despretensiosas, é pensado para a volta ao trabalho presencial, tornando este momento marcante (e de certo modo, angustiante) mais confortável e divertido.

Ao invés de um desfile, Dries Van Noten preencheu uma mansão particular com sua coleção Outono/Inverno; assim, seus convidados puderam apreciar melhor as diferentes texturas de suas peças. O retorno experiencial de Dries, despertou novamente, a sensualidade da marca, perdida durante a pandemia.

O surrealismo setentista dos trabalhos do arquiteto e fotógrafo italiano, Carlo Mollino, serviu de inspiração para as peças ora simples, ora extravagantes. A geometria das peças também atraiu a atenção do público, volumes e formas deram vida às fantasias do designer.

A primeira experiência de Jonny Johansson, designer e fundador da Acne Studios, com a costura, foi ao customizar peças em jeans de seu guarda-roupa, durante a adolescência; esta inspiração foi traduzida pelo patchwork e upcycling. Elementos que o incomodavam, como desfiados, desbotados, bordados florais — grandma style — e amarrações, agora o confortam, afinal, precisou lidar com eles por tempo suficiente para aprender a combiná-los de forma cool.

O futurismo se fez presente através dos tecidos metalizados e do styling distópico (couro + layering + modelagens oversized + aparência destroyed + peças manchadas) e extravagante, mas também, sensual, expressando a essência da marca, em um cenário totalmente branco.

Roupas com estruturas que lembram armaduras, podem ser consideradas a assinatura de Olivier Rousteing, diretor criativo da Balmain. O motivo? O designer sofreu um grave acidente, no ano de 2020, onde teve 80% do seu corpo queimado; Olivier passou por um longo processo de recuperação, necessitando do uso de curativos e equipamentos de proteção, que o mesmo enxergava como armaduras, para enfrentar a luta diária.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

As peças também são associadas à necessidade de sentir-se protegido e confortável diante do momento de fragilidade em que precisou esconder-se, por vergonha (das cicatrizes) e medo do body shaming e tantos outros discursos de ódio, que tomam conta das redes sociais.

A ilusão de ótica criada através das estampas Trompe L’oeil aparece como alerta à dismorfia corporal — um transtorno psicológico que envolve o hiperfoco em uma característica física específica, onde a pessoa tenta a qualquer custo corrigir esse “defeito”, seja através de filtros, Photoshop, ou procedimentos estéticos. Também pode ser interpretada como uma crítica ao Metaverso, vidas ilusórias, que mascaram um descontentamento interno.

Ao longo do desfile, dividido em 3 atos, a estética distópica, com ar militar, finalmente deu lugar à leveza e fluidez dos vestidos de gala, que pareciam vestir verdadeiras deusas, simbolizando a esperança — vale ressaltar que qualquer semelhança com a situação geopolítica atual, é mera coincidência; ainda assim, o designer usou suas redes sociais para demonstrar repúdio a todas as formas de violência e fazer um apelo pela paz.

A estética sexy, poderosa e brilhante da marca foi adaptada ao estilo esportivo através de elementos do futebol americano e do motocrosssempre à la Balmain

O futurismo esteve presente nos mais de 100 looks da coleção, que apesar de extensa, foi bastante coesa; Olivier conseguiu, com maestria, equilibrar materiais delicados — como plumas e rendas — a um estilo pesado e desconstruído.

DIA 3

Com mais de 71.7 milhões de visualizações a trend ‘Euphoria High School’, no TikTok, brinca com os figurinos um tanto quanto ousados para ir à escola dos personagens da série. Vestidos com recortes, roupas curtas e maquiagem e cabelo impecáveis são alguns dos looks escolhidos por personagens como Maddy e Cassie — e que são reproduzidos de brincadeira pelos usuários após um corte no vídeo, que marca o momento de transição de um look “normal” para ir à escola para um look “euphorico”.

Mas e se essa brincadeira se tornasse realidade? Arnaud Vaillant e Sébastien Meyer, dupla à frente da Coperni, parecem ter atingido este feito com a coleção de Inverno 2022, apresentada ontem em Paris. Em um cenário repleto de lockers escolares, a trilha sonora anunciava o início do desfile após um sinal de recreio: “o sol está brilhando no campus da Coperni High. Estamos prontos para começar agora, aumentem os volumes.”

Não demorou muito para que um casting de peso — composto por nomes como Bella Hadid, Gigi Hadid e Lila Moss — começasse a desfilar as peças da marca: maxi casacos de pêlo colorido e mini saias com fendas e aplicações de ilhós foram algumas delas.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A coleção tem como base uma alfaiataria desconstruída tanto a partir de recortes quanto na extensão da própria modelagem. Alguns blazers ganham capuz e criam um visual à la Aläia, enquanto outros fazem parte de conjuntinhos em que o cinto é na verdade utilizado na barra do top, e não na da saia. Já os trench coats recebem recortes laterais e são torcidos no centro-frente, criando um visual contemporâneo e casual ao mesmo tempo.

Mas o destaque mesmo fica por conta dos vestidos O look 30, um modelo azul bebê com recortes vestido por Lila Moss, poderia perfeitamente ter saído direto do armário de Maddy Perez. Já os cinco últimos do line up, confeccionados em tecidos fluidos e decorados com flores no mesmo material, traduzem com maestria o DNA parisian-easy-chic da marca. Em um jogo de texturas, decotes e drapeados mil, é assim que a garota Coperni decide ir à escola.

Em outubro do ano passado a Chloé foi a primeira marca de luxo a conquistar um selo B-corp de sustentabilidade, que garante que a empresa tem impacto socioambiental positivo. Sendo assim, à primeira vista, a quantidade de peças em couro do Inverno 2022 da marca podem assustar. Mas Gabriella Hearst, diretora criativa da marca, explica: “Para mim o couro é um subproduto da indústria da carne. Então, desde que você saiba de onde ele vem e como é tratado, você está utilizando lixo.”.

Vestidos com mangas bufantes, calças em corte de alfaiataria e trench coats são algumas das peças confeccionadas no material, que dessa vez aparece mais envelhecido que em outras estações. A apresentação é, no geral, mais limpa e bem editada, com looks formais e bastante alfaiataria tradicional. Os clássicos ponchos e suéteres coloridos da designer também marcaram presença, desta vez com estampas de paisagens formadas através do entrelaçamento dos fios.

Um mini vestido de couro em estampa de cobra com aberturas laterais: esse foi o modelo escolhido por Bruna Marquezine direto das passarelas de Outono 2022 de Ludovic de Saint Sernin para curtir uma noite de balada em Paris. A coleção foi talvez uma das mais básicas do estilista, que é conhecido por seus designs super sexys e repletos de cristais.

Ludovic quis reinterpretar e explorar os códigos do daywear nesta temporada, produzindo maxi suéteres de tricô, camisas oversized e saias longas em linho. Vestidos longos e fluidos e conjuntos de saia e blusa em malha também marcam a apresentação e reforçam o caráter menos experimental da coleção.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Rick Owens já é, naturalmente, um designer que falava sobre o fim do mundo e estéticas distópicas muito antes da pandemia e da popularização deste tema. Roupas rasgadas, paleta de cores mais sóbria e silhueta oversized já se tornaram clássicos do estilista, que geralmente apresenta suas coleções com efeitos especiais de luz e fumaça.

Mas, surpreendentemente, sua temporada foge dessa estética: vestidos longos em paetê, silhuetas mais justas ao corpo e o uso de cores mostra que Owens, nesta temporada, parecia estar mais otimista. “Durante tempos sombrios, a beleza pode ser uma das maneiras de manter a fé” declarou o estilista, explicando que a apresentação é sim um respiro em meio ao caos que o mundo e principalmente a Europa vem vivendo.

“Eu quis fazer algo super evidente e super confortável, fácil de vestir e sexy sem esforços. Ela é bem discreta e ao mesmo tempo super poderosa.” declarou Isabel Marant sobre o seu Inverno de 2022. As apresentações da designer são um ótimo momento para prestarmos atenção nas futuras tendências da temporada e em como o público irá incorporá-las, já que Isabel é conhecida por fazer uma moda mais para o dia-a-dia e focada no vestuário em si.

Sendo assim, as botas over-the-knee e maxi suéters serão com certeza peças-hit da temporada — assim como a brincadeira de misturar peças mais arrumadas com outras em linguagem esportiva. Em um lineup ultra colorido já clássico, a designer deixou claro que, acima de tudo, o conforto persiste como tendência em tempos pandêmicos.

DIA 4

No dia 4 de março, Issey Miyake apresentou uma coleção de Outono/Inverno 2022 em Paris que celebra e destaca a beleza da natureza, “Esta coleção é inspirada em plantas – e principalmente vegetais”, disse Satoshi Kondo. Nomeada de ‘Sow It and Let It Grow’, a paleta de cores foi inspirada em cores reais de frutas e legumes. Os looks da coleção são animados e exploram o crescimento de texturas em tecidos, cores fortes e silhuetas irregulares.

Nina Ricci é conhecida por seus famosos perfumes. Contudo, desde a saída dos diretores-criativos Lisi Herrebrugh e Rushemy Botter, Nana Baehr desenvolveu para essa coleção de outono-inverno 2022 looks para a nova mulher da marca. Resgataram arquivos e estéticas da marca com looks de peças ‘simples’ com muita extravagância. Estampas diversificadas, sem recorrer ao arquétipo floral, mas com flores em spray como camuflagem. A tradição de alfaiataria da casa foi desenvolvida com materiais tecnológicos, como nylon acolchoado. Um pequeno vestido preto tinha um tecido de tule no corpete que era pura extravagância. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Yohji Yamamoto desenvolveu para sua coleção de outono inverno 2022 looks que inicialmente começaram com jeans e foram levados até o fim do desfile como grande destaque, seja cortado, drapeados ou assimétricos. Os looks jeans fizeram parte de looks inteiros e também como peças únicas como terceira peça. Não é dessa temporada que as jaquetas puffers tem aparecido, dessa vez, eram jaquetas oversized com mangas grandes. Muitos looks tiveram a participação de camisas brancas de algodão, que de início eram destaque que depois foram apenas parte de outras composições. A alfaiataria de Yamamoto chegou de forma expressiva, desconstruída e todas diferentes. 

VTMNS é um projeto de Guram Gvasalia, irmão do diretor criativo da Balenciaga – Demna Gvasalia, ramificado da marca Vetements. O primeiro desfile da marca aconteceu nesta temporada de outono-inverno 2022. Gvasalia desenvolveu uma coleção streetwear com uma alfaiataria despojada e com um logo incomum, mas que reflete a personalidade do diretor criativo: um código de barras. Jaqueta, jeans, agasalhos puffers completavam a coleção do projeto. O streetwear é uma característica forte da família Gvasalia, Guram não apresentou indícios de que sairia longe deste caminho. 

Por mais que muitos da indústria da moda nessas últimas semanas não tenham reagido de maneira significativa a respeito dos recentes acontecimentos como a Guerra na Ucrânia, o desfile teve um minuto de silêncio a todas as vítimas afetadas pela guerra. Para essa coleção de outono- inverno 2022, Marine Serre, diretora-criativa da marca, desenvolveu uma coleção upcycling como de costume. Contudo, não apresentou a estética de logomania de meia lua como tem estado presente em todas as últimas coleções da marca. 

A coleção faz parte do projeto Hard Drive da marca, e fica em exibição nos dias 5 e 06/03 no centro de artes Lafayette Anticipations, em Paris. Na loja criada para a exibição, os visitantes podem trazer qualquer material de tecido e customizá-lo com o famoso logo clássico da marca, uma meia lua. Parte das vendas será destinada à ong Médicos Sem Fronteira para os refugiados da Ucrânia.

A diretora criativa optou por trazer diferentes estéticas na coleção. Uma delas, que tem estado muito presente nas semanas de moda, é a punk rock. O xadrez vermelho com preto esteve fortemente presente em looks como saias, casacos e em cachecóis azuis e pretos. Outra, foi o patchwork que é o upcycling que Marine sempre faz questão de inserir em suas coleções. Um trabalho manual e sustentável feito através de retalhos de tecido em diversos formatos e cores, foi desfilado com a inserção de diferentes cores, logos e frases, representada em um vestido longo com luvas em calças e casacos. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Trench coats e casacos de frio com pelos na gola e manga em couro azul com duas cores de azul, o marinho e um mais claro. Além de, recortes quadrados em tons de azul e marrom. O famoso hippie chic com toque refinado veio em tons terrosos e em estampas astrólogas, uma estética apurada e um ar romântico, mas não jovial. 

Marine sempre faz questão de reforçar a importância de seus discursos ambientais e comportamentais, como o uso de  tecidos reciclados ou técnicas de upcycling, destacando o compromisso com a sustentabilidade. Marine pensa em cenários apocalípticos para a construção das peças, como guerras climáticas, civilizações ameaçadoras e extinção em massa. 

A marca tem crescido e se destacado mostrando sua capacidade na indústria. Apesar de seu logo de meia lua não ter estado presente nesta coleção, outros já familiarizados foram vistos, como astrológicos. Marine tem conquistado fortemente fãs da moda e artistas da cultura pop. Ela faz seus designs com naturalidade e de forma orgânica, e sua trajetória parece estar bem encaminhada. 

J.W Anderson desenvolveu para a coleção de outono-inverno 2022 da Loewe formas de automóveis delineadas em bainhas de vestidos, sapatos de salto alto sob camadas transparentes de malha, além da tendência de tecidos transparentes. 

O designer apresentou uma estética surrealista, facilmente referencial a Salvador Dalí, René Magritte ou a própria estilista surrealista original, Elsa Schiaparelli, com looks de lábios em contorno dos braços e mãos e na frente dos vestidos. Anderson se concentrou em roupas mais simplistas. Continuou experimentando linhas e formas volumosas (ambas vistas em temporadas passadas na Loewe e em sua marca homônima, J.W. Anderson). Suéteres com golas circulares levantadas como travesseiros e cardigãs esvoaçantes com mangas acolchoadas estavam presentes nesta coleção. 

Anderson mencionou que ele também estava olhando para a arte feminista. Havia referências à surrealista Meret Oppenheim e Lynda Benglis. Uma série de squashes de Anthea Hamilton foi apresentada ao público no show. O escultor e o diretor criativo já se reuniram nas apresentações de arte de Hamilton na Tate. 

A paleta de cor dos looks eram mínimas. Tom sobre tom e tons terrosos, nada muito estampado e colorido. Como indica o comunicado de imprensa que acompanhou o desfile, esta coleção foi concebida para destacar uma ‘moda que provoca uma reação, despida de primitivismo cru com emoção e fantasia’. De fato, é difícil não ver a dimensão sensual na coleção do designer: como as leggings de látex, tweed, seda e malha foram combinados; às peças-chave foram vestidos de couro moldado, tops de látex que revelavam os seios das modelos, jaquetas enroladas no pescoço ou na cintura e outras peças reveladoras. 

Anderson sabe fazer looks ousados e que realçam o lado sexy e exuberante da mulher. Dessa vez não foi diferente. O toque surrealista incorporou suas criações gerando ainda mais desejo e valor.

DIA 5 

Desde a saída de Alber Elbaz, Lanvin enfrentou crises estruturais e financeiras no mercado de moda, e desde a nomeação de Bruno Sialelli, que tem se mantido no cargo há 3 anos, o destino aparenta estar sorrindo novamente para a maison francesa, fundada por Jeanne Lanvin.

A temática dos anos loucos de 1920 e do Art Deco parece ter sido o ponto de partida para um grande número de designers durante a temporada de Outono/Inverno 2022 e com Bruno Sialelli, diretor criativo da Lanvin, não foi diferente.

O designer francês revisitou os arquivos antigos da fundadora da marca, que viveu de fato nesse período, como fonte de estudos durante seu processo criativo. “Há algo nesses momentos entreguerras que parece preocupante, mas otimista ao mesmo tempo, mas são estes os momentos em que nossa criatividade e cultura devem levantar suas propostas de ideais como um ‘remédio’ para essas preocupações”, disse Sialelli.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A coleção foi apresentada em formato digital como um filme de art noir, justamente com o objetivo de ambientar os espectadores nessa temática dos anos de 1920. Sialelli teve uma atenção muito focada em traduzir as silhuetas da época para um consumidor contemporâneo. O designer focou nas silhuetas em linha ‘Í’ resgatando as roupas de formas secas tão características da época, “silhuetas do passado ao presente” de acordo com o próprio designer.

Peças em veludo molhado, rendas, vestidos bordados com miçangas, looks com muita transparência com telas de tule e a transição de uma silhueta mais seca para silhuetas mais volumosas ao final do desfile, mostraram bem a interpretação da moda do período entreguerras para uma linguagem mais contemporânea e não necessariamente literal.

A cartela de cores da coleção contou com tons de azul, rosa, vermelho, amarelo, nudes e preto; que circulavam entre os looks em peças lisas ou em estampas de motivos geométricos, motivos inspirados na fascinação de Jeanne Lanvin pelas formas do Egito Antigo, como as esfinges.

Logo próximo ao final do tempo de passarela, o francês introduziu looks que exploravam os babados e os tecidos telados, esmiuçando o potencial de textura e o efeito volumoso que estes causam nas formas finais das peças.

Com a direção criativa de Bruno Sialelli, a Lanvin gradualmente retorna aos seus tempos de glória sob os holofotes da moda de luxo. As impressões do designer combinadas com o histórico da marca com certeza dão motivos suficientes para acompanhar com maior atenção o trabalho da marca nas próximas temporadas de moda.

Andreas Kronthaler mergulhou sua criatividade no universo do teatro ao desenvolver a coleção de Outono/Inverno 2022 para Vivienne Westwood. O parceiro de vida e de trabalho de Vivienne Westwood deixou emergir sua ‘musa particular’ durante a apresentação e teve como maior objetivo ser fiel a si mesmo. “Sempre fiz as coisas com ela [Vivienne Westwood] em mente….. e isso sempre me colocou em crise e percebi que não, você deve achar a ‘musa’ de inspiração em você e ser verdadeiro consigo mesmo”, disse Kronthaler.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

A maior parte da coleção pode ser descrita por um só adjetivo: leveza. As formas de Kronthaler e os materiais escolhidos pelo designer austríaco denotam uma leveza que nada contra a correnteza de corpetes modeladores tão familiares à marca de Westwood. Tecidos acetinados, lamê, plumas, e malhas de moletom tiveram a responsabilidade de trabalhar essa sensação de suavidade das peças.

Inspirado pelo universo teatral, Kronthaler desenvolveu uma infinidade de estampas e toda essa mistura reflete esse mundo fantasioso e criativo dos palcos de teatro, além da estética nômade e multicultural imprimida nesses motivos, arriscando trabalhar vários signos ao longo da coleção.

O trabalho de alfaiataria continuou sendo o ponto forte de Andreas e esse esforço do designer é explorado ao longo da apresentação. A variedade de símbolos clássicos da marca em conjunto com a “nova” e livre estética de Kronthaler revela uma confiança mútua entre os designers que lideram a direção criativa de Westwood, em parceria. 

Ao contrário de outros públicos, o consumidor Hermès busca sempre por um produto impecavelmente bem feito em detrimento de um artigo ou peça que siga as tendências da temporada. É por isso que, desde que assumiu a direção criativa da marca em 2014, Nadège Vanhee-Cybulski entrega coleções cujo tema central são sempre as roupas e a qualidade dos produtos.

Seu Inverno 2022 então não poderia ser diferente: em uma cartela de cores minimalista (um clássico de Nadège) a estilista desfilou peças clássicas que exalam elegância e um luxo discreto que é a cara da Hermés. Saias plissadas em couro, macaquinhos e macacões em malha firme e casacos em cortes e aplicações impecáveis são alguns exemplos.

Nadège ainda, como de costume, traz referências do universo equestre para as passarelas em razão do histórico da marca: mini vestidos em matelassê com enchimento fino, fivelas clássicas e abas em formato de selaria são as mais visíveis. Para equilibrar e tornar a coleção contemporânea, ela adiciona toques de sexy nunca vistos antes em seu trabalho para a casa, como a transparência de algumas camisas e o encurtamento dos shorts e saias.

Dois anos após a mega explosão que assolou a população libanesa de Beirute em 2020, Elie Saab decide voltar às passarelas físicas e reviver sua marca para os olhares presenciais de seus consumidores e admiradores, mesmo ainda se recuperando da tragédia que afetou seu lar e seu ateliê. O inverno 2022 de Saab é direcionado inegavelmente para mulheres com força e autenticidade. “É sobre mulheres fortes, com um forte caráter e um pouco de rock n’ roll”, disse o designer libanês.  

Saab traduz toda sua expertise em vestidos de alta costura para uma temporada ready-to-wear. Vestidos de noite recheados de elegância e glamour, com acabamento em bordados de paetês, muita renda, bordados de cristais, plumas que por si só já requerem um olhar especial de observação. A alfaiataria de Saab também ganhou sem momento de destaque na passarela, em formato de blazers bem cortados com ombros avantajados e  calças cigarretes;  além disso as peças em veludo, couro e tules esvoaçantes terminaram por revelar o guarda-roupa dessa mulher forte de Saab

Vencedor do prêmio LVMH de 2018, o estilista coreano Rokh Hwang comanda sua marca própria desde 2019. Discípulo e ex-aluno de Louise Wilson, prestigiosa professora da CSM que guiou nomes como Mcqueen e Kane, Rokh possui um trabalho que mescla desconstrução e jogo de texturas.

Sua estética particular e talento o fazem um dos nomes mais interessantes de se acompanhar atualmente – e sua coleção de inverno de 2022 prova isso. De conjuntos de alfaiataria envoltos por cintos de couro até trench coats em vinil azul royal, Rok entrega uma coleção que mais uma vez reforça seu design disruptivo e elegante ao mesmo tempo. O grande diferencial das peças de Rokh parece ser justamente o equilíbrio entre experimentação e usabilidade, que rende assim peças fashionistas e formais na medida certa.

O Inverno de 2022 de Ann Demeulemeester se manteve fiel às suas origens e traz à tona na passarela a estação fria para os góticos, boêmios e melancólicos de plantão. Apresentada no Réfectoire des Cordeliers a coleção sob não estava tão distante de suas raízes e nem de sua criadora em termos de distância física, a própria Ann Demeulemeester garantiu sua presença na plateia do desfile, após sua saída da marca de nome homônimo em 2013.

Longas casacos, vestidos e coletes de uma alfaiataria bem cortada, foram se repetindo constantemente do início ao fim da passarela. Peças sóbrias e secas de gola V em diferentes materiais como o crepe e o couro, que ganhou destaque por reviver a identidade gótica de Demeulemeester. Pequenas aparições de bordados com miçangas pretas tiveram seu momento no vasto mar de looks pretos e cinzas, que surgiram no decorrer de uma discreta graduação ao passo que o desfile avançava. 

DIA 6

A mais recente apresentação de Demna Gvasalia para Balenciaga foi um tributo direto para o conflito que ainda continua entre Rússia e Ucrânia. Demna que já sentiu na pele o que é ter que sair de seu país natal e se tornar um ‘refugiado para sempre’, dedicou este show à bravura, resistência e a vitória da paz e do amor. 

Essa apresentação se mostra de longe a mais pessoal e tocante para o estilista. Nascido na Geórgia — um país na intersecção entre a Europa e a Ásia — Gvasalia fugiu de seu país durante uma guerra civil e lembrou que ‘um fashion week (nas condições atuais) parece uma absurdidade e em tempos como esse, a moda perde sua relevância’. Apesar de ter sido assombrado por espíritos e traumas passados, Gvasalia não cedeu e prosseguiu com seu show, que se mostrou afinal de conta extremamente necessário e relevante. 

Num palco 360° isolado por uma redoma de vidro, os modelos desfilavam contra uma tempestade de neve e vento. Fazendo críticas ao aquecimento global, a guerra na Ucrânia e também, ao desperdício e a negligência a bens materiais — vide os convites aos convocados para o show, era um velho iPhone 6s, quebrado, que não funcionava, esquecido e desprezado. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Também aos convidados, foram dadas no total 525 camisetas com as cores da bandeira da Ucrânia, posicionadas nos assentos juntamente com uma declaração pessoal escrita pelo próprio designer. 

A coleção seguia uma paleta de cores sóbrias: preto, cinza e marrom, com toques de branco, estampas florais e seguido pelas cores amarelo e azul. A silhueta arrojada e forte — uma marca já registrada de Demna — fez sua aparição, tracksuits, jaquetas bomber, macacões, moletons, couro e jeans. A coleção parece ter sido criada por ‘peças staples’, ou essências, acompanhadas das bolsas que lembravam sacos de lixo — seria mais uma crítica ao consumo e ao desperdício? — os vestidos que se fundiam com luvas e leggings e sapatos. 

Ao final, o show foi menos sobre as roupas em si, mas sim a poderosa alusão criada e a mensagem que era transmitida. “De algum modo, moda não importa agora nesse momento, para mim” declarou Gvasalia, “Pessoalmente, eu já sacrifiquei muito por guerras. Essa última semana tem trazido de volta todas as memórias que eu e minha mãe colocamos de lado numa caixa e nunca mais olhamos. Nós nunca superamos.” 

Think pink! Pierpaolo Piccioli tomou um gesto radical em sua última coleção para a maison Valentino, desfilada hoje, 6.  Apesar da íntima relação da grife com a cor vermelha — Red Valentino é inconfundivelmente a marca registrada da maison, Valentino Garavani tinha uma profunda afeição pela cor e a usou para distinguir a mulher normal da ‘mulher Valentino’. 

Agora, no entanto, testemunhamos a nova coleção intitulada Pink PP, inteiramente na cor rosa — acompanhada de algumas singelas interrupções de um preto profundo. 

Buscando as possibilidades envoltas na cor rosa, o mais recente show da Valentino não deixou nada que não fosse ‘Valentino pink’, desde a passarela, as paredes, até as roupas e as ‘Valentino muses’ — Zendaya usava um look cor de rosa dos pés a cabeça enquanto acompanhava o desfile da primeira fileira.  

As capas e luvas sempre marcantes nas apresentações estavam presente, vestidos curtos e longos que brincavam com diferentes cortes ou aplicações, decotes em onda, transparência, alfaiataria (sempre) precisa, longos de festa, lantejoulas, casacos oversized…  Por trás dessa coleção quase monocromática, salvo os looks em preto, Piccioli declarou que desse modo ‘as atenções poderiam ser voltadas no seu trabalho com diferentes tipos de tecidos, aplicações e bordados, silhuetas, cortes estratégicos’. Ou seja, sem a ‘distração’ das cores somos forçados a perceber as texturas, os materiais e as superfícies. Um trabalho de reflexão que Pierpaolo propôs ao seu público e, mesmo fugindo do tradicional, conseguiu cativar a atenção e deixar a cor rosa ainda mais viva em nossas mentes.

Kenneth Ize definitivamente tem um novo look para chamar de seu: o aso oke. O tecido ‘aso oke’ usado pelo designer nigeriano, no qual Naomi Campbell fechou o desfile no debut do diretor criativo em Paris (antes da pandemia), agora é oficialmente o centro das atenções das coleções de Ize. 

Trata-se de um material tradicional da Nigéria no qual Ize usa e reusa cores mas mantém as inconfundíveis listras. Na sua passarela vimos inúmeras variações do asooke: terno com saia, jaquetas de zíper, tricô, blazer e calças. 

A coleção que foi desenhada em Nova York traz muitas referências da cidade como ‘Taxi Driver’ ou a ‘vibe 70′ s’ que a cidade um dia já carregou. E que também fez uso de tecidos e materiais reciclados. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

O designer vem cada vez mais se elevando e trazendo identidade para a marca. Com suas silhuetas elegantes, longínquas e, por vezes, alegre — vide a estampa aso oke. De uma forma eclética e despretensiosa, Kenneth Ize vem nos mostrando seu caminho de como ganhar os holofotes e as atenções.

Matthew Williams vem ainda pavimentando sua identidade e visão para a Givenchy— visão a qual torna a Givenchy mais para a frente, franca e honesta. O interesse de Williams em sua nova coleção para outono-inverno ready-to-wear era realmente ‘criar roupas que as pessoas fossem usar e a facilidade disso’. 

Focado, principalmente, numa pegada streetwear, Matthew usou suas cores predominantes: preto e verde escuro. As consequências dessa inspiração no streetwear foram: muita sobreposição, logos e moletom com estampas gráficas, tracksuits, peças ‘baggy’. 

Williams, que era anteriormente diretor criativo no ramo musical, trouxe essas ‘raízes’ para seus shows como head-designer. Desde a passarela e o trabalho de luzes LED à soundtrack do desfile. 

Matthew descreve seu trabalho na Givenchy como ‘muito instintivo e presente’. Espelhando a cultura do dia a dia num muito mais elevado nível na passarela. No entanto, sem esquecer as origens da marca: Williams, como inspiração, fez inúmeras menções para os ‘arquivos’ da grife francesa e trouxe isso na sua nova coleção.

DIA 7

Ao som de ‘Give Peace a Chance’ de John Lennon e Paul McCartney acompanhada do discurso pacifista ‘A Strategy for Peace’ de John F. Kennedy, a coleção de Outono/Inverno 2022 de Stella McCartney abre espaço para a conscientização e para se posicionar em prol da população ucraniana que vem sofrendo ataques de guerra do governo russo nos últimos dias.

Stella McCartney se reuniu em parceria com o artista plástico Frank Stella durante o planejamento da coleção. Stella e McCartney trabalharam lado a lado principalmente no que diz respeito às silhuetas e estampas desenvolvidas para a passarela. “Amo o maximalismo e o minimalismo dele [Frank Stella]. É um paralelo para nossa marca: o lado masculino simples em conjunto com um lado mais explosivo. Quando você observa o trabalho de Frank, ele realmente acompanha isso muito bem”, disse a estilista britânica.

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Como era de se esperar, McCartney continua a aumentar seu acervo com looks provenientes de materiais ‘eco-friendly’, que dialogam com seu discurso sustentável. Peças em algodão orgânico, nylon reciclado, lã regenerativa, lãs RWS de fontes rastreáveis foram alguns dos insumos usados pela estilista nesta temporada. Por outro lado, seu verdadeiro protagonista foram os restos de cascas de uvas transformadas em couro falso.

A parceria entre McCartney e Stella foi um harmonioso casamento de traçados e criações, onde os motivos e linhas de Frank Stella dançavam e pulavam de peça em peça, entre os conjuntos de alfaiataria, os vestidos de malha de elastano e os acessórios de Stella McCartney.

McCartney não se limitou somente em trabalhar com materiais novos para sua marca, mas também se aventurou com pares de jeans desbotados, camurça e pele falsa, tecidos acetinados em um cartela comum, mas forte na forma como a estilista a disponibilizou ao longo da passarela. Tons de roxo, laranjas e marrons terrosos, vermelho vinho, amarelo mostarda, tons azulados e muito preto fizeram parte do Inverno da designer.

Em mais uma coleção Stella McCartney não deixa de mostrar aos seus contemporâneos que é sim possível planejar e criar um raciocínio de moda ética baseado na clareza das suas fontes de materiais e em um produto final de sofisticação e qualidade.

Ao celebrar o seu retorno à Paris e às passarelas, Chitose Abe alavanca o patamar de sua marca nessa coleção e foca em entregar ao seu consumidor produtos que carregam sua assinatura mas com o máximo de sofisticação possível. As famosas combinações imprevisíveis de Sacai volta junto aos desfiles presenciais, mas com uma linguagem mais extravagante e festiva para essa temporada de Outono/Inverno 2022.

A silhueta oversized foi mais uma vez a palavra de ordem na mente da designer japonesa durante seu processo criativo. Saias volumosas com cós em acabamento de elastano, jaquetas esportivas de nylon encapuzadas, trench coats e blazers transformados em vestidos, casacos de pele e couro terminam por acentuar a imagem de poder e força dessa consumidora de Abe que necessita de novos looks para os eventos pós pandemia. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Mesmo com um cartela limitada, Abe soube explorar todas as possibilidades de combinações entre o vermelho vinho, o vermelho amaranto, preto, branco, os beges, além disso as estampas de risca de giz e de onça pintada souberam usar seu tempo de passarela com muita sabedoria para quebrar as sequências de peças lisas que dominaram a apresentação. 

Juventude foi a premissa do desfile de Outono/Inverno 2022 da Louis Vuitton nesta temporada. Com uma coleção inteiramente influenciada pelas manifestações juvenis atuais, não só o streetstyle mas também as redes sociais, Nicholas Ghesquière trabalha simultaneamente as estéticas da sua adolescência e os estilos de hoje. 

Movido pelas suas observações dos jovens de hoje e como eles se comunicam via TikTok, Instagram, seus ídolos, e estilos; Ghesquière aproveitou a volta da estética dos anos de 1990 e dos anos 2000 e reinterpreta esse estilo preppy escolar misturado com referências do grunge e dos skateboarders para uma nova leva de consumidores da moda de luxo.

O desfile da Louis Vuitton ocorreu no interior do Musée D’Orsay, tornando-se a primeira marca a conseguir permissão para desfilar sua coleção num dos museus mais respeitados do mundo em termos de arquivos de Belas Artes.

Focado em captar a fase transformadora da juventude, a passagem da vida infantil para a adulta, Nicholas Ghesquière compilou vários signos e estilos que um jovem em período de transição e liberdade estaria disposto a testar para se descobrir. “A coleção é uma verdadeira excursão a um momento perceptível, fugaz e decisivo em que tudo vem à tona, em toda sua inocência e perspicácia. A impermanência e a bela volatilidade da adolescencia”, disse o designer francês. 

O ápice dos designs de Ghesquière nessa temporada foi, sem sombra de dúvidas, o seu foco na alfaiataria. Calças estilo ‘Annie Hall’, camisas sociais, gravatas, blazers e casacos oversized ‘boyfriend’, e a androginia presente nas combinações foi extremamente forte nessa coleção. Além disso, as camisas esportivas de rugby, calças e botas de cano longo de couro e as camisas polo com a impressão gráfica de um retrato do fotógrafo de moda David Sims, dão o toque final nessa excursão de novas descobertas pelo seu próprio estilo que o jovem de Ghesquière passa. 

Ao sair um pouco dessa androginia, Ghesquière trabalha a feminilidade na coleção por meio de formas que lembram as silhuetas das crinolinas – armação que aumentava o quadril da mulher nos vestidos do século XIX – em vestidos de tweeds bordados. Nos suéteres, camisas e vestidos, com o intuito de se aproximar ainda mais da realidade jovem, o designer implementa uma mistura psicodélica de motivos localizados gráficos em padronagens também figurativas.

Na tentativa de se aproximar dessa nova leva de consumidores jovens, a Louis Vuitton sob a direção de Nicholas Ghesquière ao lado Virgil Abloh, que estava responsável pela linha masculina da marca até seu abrupto falecimento no ano passado, tem lançado coleções que sabe se comunicar comercialmente com esse novos consumidores e atingir esse objetivo. O mergulho de Ghesquière nas inconstâncias da juventude logo logo vai comprovar mais uma vez a maestria com que a Louis Vuitton sabe se comunicar com os fashionistas da Geração Z.

Inspirado pela moda dos anos 60, Giambattista Valli revela o lado mais ousado e rebelde de sua consumidora na coleção de Outono/Inverno 2022. Valli se deixou levar pela autoconfiança da mulher parisiense e isso transpareceu em seus looks. “As mulheres aqui são muito feministas, são muito complexas. Elas não se importam com nenhuma crítica. Elas só querem ser elas mesmas e é isso que eu amo sobre as mulheres francesas. Elas são muito livres, muito fiéis a si mesmas”, afirmou o designer italiano.

Logo de cara os espectadores do desfiles foram seduzidos pela silhueta de linha ‘trapézio’ e as mini saias clássicas dos anos de 1960, com peças em branco e grandes óculos redondos, também característicos da época, revivendo o período do Space Age. No decorrer da passarela, Valli aos poucos trabalhava em alternância os códigos tão característicos de sua assinatura com os ícones da Era dos Beatles; como os casacos de inverno de gola alta, botas de cano alto de couro, vestidos em tule e renda e recheados de babados, muitos laços e estampas florais. 

Além das referências florais, Valli trabalha com as estampas de motivos de ‘pois’ e o animal print em sobretudos longos, vestidos curtos e minissaias Os tons de branco e off white, o preto brilhante e o fosco, os azul Tiffany, os rosas e vermelhos conseguiram de maneira sucinta equilibrar a mensagem final do Inverno 2022 de Valli, a mensagem de que seu trabalho se destina e presta homenagem às mulheres autênticas e seguras de sua feminilidade acima de tudo. 

Assim como todos os profissionais da indústria da moda e do mundo, Olivier Theyskens foi profundamente influenciado pela pandemia da COVID-19 e sua coleção de Outono/Inverno 2022 é um honesto reflexo dessa influência. Além de uma mudança em seu olhar criativo, Theyskens parece ter reestruturado toda sua cadeia produtiva e seu raciocínio de negócios. “O que aconteceu no mundo é tão importante que eu realmente queria redimensionar o meu negócio”, afirma Theyskens. 

Theyskens decide abandonar todo o padrão de negócios de costume das marcas e segue em direção a uma reestruturação livres de pressões e regras corporativas por um crescimento sem precedentes que visa somente o lucro.  O designer belga orquestrou toda sua coleção ‘à moda antiga’, a partir de um trabalho minucioso da combinação de retalhos têxteis e patchwork, Theyskens teve como resultado uma coleção etérea, cheia de espírito e um convite ao passado. 

Looks cortados no viés, combinações e maquetes têxteis que misturavam vários tecidos ricos em motivos, como o crochê e as muitas rendas de diferentes padronagens cortadas no fio reto. O belga continuou a trabalhar com uma paleta reduzida e bem sombria com seus tons de preto, roxos, verdes, marrons e off white, ele aproveitou e trabalhou com o  envelhecimento dos tecidos e de suas cores, valorizando o ‘ar’ sublime e vintage que seus vestidos e inspiração pede. Theyskens soube aproveitar muito bem seu período de isolamento não só para ouvir seu tino criativo nesse momento de mudança mas perceber também que é necessário um giro de 180 graus  para reavaliar o que o mercado necessita nesse momento introspectivo. 

DIA 8

Na terça-feira (08), Virginie Viard 一 atual diretora-criativa da maison francesa 一 repetiu um ato icônico feito anteriormente por seu ex-chefe (e também diretor-criativo frente a Chanel) Karl Lagerfeld: apresentar uma coleção que fizesse diversas referências à Escócia, uma região bastante visitada e amada por Gabrielle Chanel, mais conhecida como Coco Chanel e fundadora da marca.

Em contrapartida, enquanto a coleção apresentada por Lagerfeld em 2012 (Pré-Outono 2013) comportava uma atmosfera mais melancólica e altamente ambientada às raízes escocesas, a coleção de Outono/Inverno 2022 一 dirigida por Virginie 一 busca referenciar uma das paixões de Coco Chanel de maneira mais otimista e vibrante, o que consequentemente contribui para que a marca consiga atrair os olhares de uma geração mais jovem, seguindo a pegada brilhante da nova coleção. 

Um outro detalhe que ainda capta bastante atenção nesta nova exposição da Chanel é a devoção aos clássicos tweeds 一 marca registrada da maison 一 em diversos tons, em destaque aos tons mais claros (pastéis) em rosa e azul, por exemplo, fazendo uma grande menção e homenagem ao guarda-roupa tradicional de Coco Chanel e às vestimentas populares durante a década de 1920, além da Londres de 1960. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Os shorts de tweed, também presentes nesta nova coleção da Chanel, ainda são componentes que aplicam ao desejo de Viard em apresentar peças que também pudessem reproduzir o conceito de roupas urbanas, além da própria inspiração no guarda-roupa inglês e escocês. 

A coleção como um conjunto é apresentada de maneira sóbria, apontando de maneira explícita toda a assinatura da Chanel, além de, claro, homenagear a fundadora da casa francesa com suas produções e peças mais clássicas. Apesar de ainda não corresponder ao anseio da comunidade e dos fãs da marca em sair da zona de conforto das criações da marca, como por exemplo o uso ‘’abusivo’’ do tweed 一 que apareceu na coleção não somente em ternos ou nos tradicionais conjuntinhos, mas também em vestidos, cardigãs, meia-calças, sobrepostos, entre outros 一, esta nova apresentação proposta por Virginie Viard na nova coleção da Chanel é um grande convite para que a nova geração possa conhecer um pouco da história da maison e deliciar as referências ao otimismo e brilho da juventude, além de comportar peças que reforçam e mencionam a feminilidade da mulher Chanel. 

Na temporada apresentada no dia 8, Miuccia Prada, diretora-criativa da Miu Miu deu a cartada e última palavra final para esta Semana de Moda de Paris. A coleção de Outono/Inverno 2022 apresentada para a Miu Miu comporta-se como um storytelling magnífico através da continuação da narrativa contada na última apresentação da casa.

Miuccia buscou contar um pouco de sua infância 一 traduzida em roupas 一 e de suas paixões em sua nova coleção. Em uma coletânea reunindo 53 looks, a garota Miu Miu assume uma postura menos workaholic e mais apaixonada por esportes e aventuras, e isso pode ser facilmente captado através da composição das vestimentas 一 através de casacos e blazers oversized, peças mais finas e composições sobrepondo lingeries, o que acaba por substituir a imagem ‘menininha’ por uma mulher mais feroz, determinada e sensual. 

Essa proposta ainda é reafirmada através da aparição de peças que utilizaram da técnica da transparência, além de, como já se era esperado, da presença de vestimentas que explorassem o ‘’uso’’ da pele, como as minissaias, por exemplo, que foram um grande marco e impactaram a coleção passada da Miu Miu. 

Foto para colagem retirada do Vogue Runway.

Os acessórios da nova coleção da casa ainda chamam a atenção por sua praticidade e cores mais convidativas. Além disso, à medida que a nova temporada Miu Miu continuasse a narrativa iniciada anteriormente, foi inevitável a presença de peças em couro, casacos em shearling, estampas de pele de cobra, dentre outros.  

Conforme outras marcas passaram a abordar questões como peças andróginas e genderless, não foi diferente com a Miu Miu nesta temporada de 2022. Os detalhes e conjuntos que tomaram conta desta nova coleção comportam-se como uma maneira de expressar a diversidade de gênero, a partir da silhueta mais acanhada que também funciona para demonstrar como esta funciona com não-binários. A tentativa proposta por Miuccia foi abordada de forma que os modelos masculinos também usassem a malha fina e jaquetas mais curtas. 

Deixando de lado a busca por produzir vestimentas arcaicas de escritório, a nova coleção inspirada nas quadras de tênis criada por Miuccia Prada e apresentada para esta temporada é extremamente acolhedora aos entusiastas de uma moda clássica, livre, moderna e altamente contemporânea. O impacto da coleção de Primavera/Verão 2022, apresentada em outubro, foi extremamente assombroso e parece querer ecoar por um longo tempo. 

Frenezi na Semana de Moda de Outono/Inverno de Milão

Continuando com as coleções de Outono Inverno de 2022, passamos para a cidade de Milão, a qual tem impressionado com sua visão moderna e inovadora aplicada a silhuetas e formas dentro da alfaiataria clássica Italiana. Com a presença marcada de algumas das estreias mais aguardadas da temporada, Glenn Martens na Diesel por exemplo, qual pega o material mais conhecido da marca – o jeans – repensando-o para um olhar descolado e inovador, quase sem limites para a criatividade e sensualidade. 

Assim como o primeiro desfile da Bottega Veneta após a saída do então diretor criativo Daniel Lee, Matthieu Blazy foi o escolhido como sucessor da diretoria criativa a da marca, com características clássicas da história da marca intercaladas com uma influência da era Lee, Blazy encontra o perfeito equilíbrio entre os novos e velhos clientes, ao contrário de Versace e SportsMax que investem nesta temporada na irreverência do sensual ao extremo, com influências e reflexos do fetichismo e do sensual ao extremo, de pernas de vinil, plataformas cada vez maiores, corsets e decotes em roupas de couro, estamos vendo a reação sensual de Milão nesta temporada.

Você pode encontrar o calendário oficial da Semana de Moda de Outono Inverno de Milão aqui.

Foto dos detalhes do desfile da Fendi, retirada do Vogue Runway.

Confira a cobertura completa da Semana de Outono Inverno em Milão:

DIA 1

O primeiro dia de Milão Fashion Week (23) foi, merecidamente, marcado pelo debut da Diesel por Glenn Martens. A marca italiana descreve uma inteira ‘all-gender runway collection’ pela primeira vez ao público numa das principais fashion weeks do mundo. 

Não coincidentemente, o responsável pelo mais novo burburinho é o – recente – diretor criativo da marca: Glenn Martens; o mesmo ainda é diretor criativo da marca ‘Paris based’ Y/Project, e foi, também, responsável pela mais nova colaboração de haute couture da grife francesa JPG. Essa foi a segunda coleção de passarela de Martens para Diesel e reafirma sua personalidade irônica, excêntrica, indiferente e ‘too cool’. Brincando com streetwear, silhuetas, futurismo, sensualidade e singularidade. 

A Diesel, que após um hiatus no ‘gosto popular’, já vem lentamente construindo sua volta e trabalhando numa evolução para a imagem da marca através de campanhas, colaborações e, claro, nas mídias sociais. No entanto, quem incorpora essa evolução para o mundo real é Glenn Martens. Seu affair com a manipulação de silhuetas está presente nos looks assimétricos, volumosos, exagerados e bem construídos. Glenn é, claramente, o próximo passo da evolução da Diesel. 

E agora, a nova cara da Diesel desfila seus looks com influência 2000’ (cintura-baixa e minis), astros e futurista (com direito a modelos pintados dos pés à cabeça), denim ‘all ways’ – exagerado, mini, ‘distressed’, super construído, quilted, vários tons, na parte de cima, de baixo e nos pés – as adoradas mini saias (mas dessa vez acompanhadas pelas botas denim de cano alto e bico fino) e o exagero no ‘outerwear’. 

Para manter o comprometimento da marca com a sustentabilidade, Martens aposta no ‘upcycle’. Provando sua fama pelo seus looks ‘reconstruídos’. E, também, paralelamente, muito bem construídos quando falamos do seu trabalho de denim e couro, e outros mais tecidos, na construção de silhuetas.  Este ano, Glenn Martens vai fazer todo mundo se apaixonar, vestir e falar novamente sobre a Diesel. Nos entregando um novo capítulo da marca. 

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

O sucessor de Karl Lagerfeld, Kim Jones, inicia seu segundo ano à frente da direção criativa da casa italiana Fendi. Após sua nomeação ao cargo a pressão, críticas e expectativas não têm sido fáceis. Entretanto, para esta coleção de outono 22’ Jones parece ter acertado o público da marca e vem arrancando críticas positivas ao ser comparado com Lagerfeld e levando o legado das mulheres Fendi em diante. 

Os mais treinados olhos já tiram de cara quais foram as inspirações de Jones para sua nova coleção. A estampa italiana Memphis, utilizada por Lagerfeld na coleção de 1986, ou a delicadeza e fragilidade da coleção de primavera 2000, também por Karl. 

Apesar das referências, Jones trás a energia e os adorados clássicos dos anos 2000, como a cintura baixa ou as saias ¾, de uma maneira refrescante – não cansativa e repetitiva. Afinal, o espaço que a influência ‘y2k’ vem tomando não é pequeno. 

A estampa Memphis nessa coleção foi acompanhada pelo uso do chiffon e a alfaiataria imaginativa e inigualável de Jones. Blusas transparentes, calças e macacões, adornados com babados ondulados ou “alface”. 

Lingeries, corpetes e transparencias delicadas, muitas vezes sobrepostas por casacos numa cartela de cores suave, que brincava somente às vezes com o vermelho-sangue. Os acessórios, o ‘cabelo molhado’, a sobreposição, alfaiataria e as estampas geométricas trouxeram um toque moderno à coleção. 

Kim Jones, diretor artístico de costura e vestuário feminino, trabalha com a magnata e fundadora da marca, Silvia Venturini Fendi, responsável pelo vestuário masculino e acessórios da marca sediada em Roma. 

Foi observando Delfina Delettrez, que frequentemente usa as roupas da mãe Silvia, que teve sua grande epifania para sua coleção de outono. Delfina estava no escritório da Fendi em Roma usando uma blusa Fendi ‘archive’ que pertencia a sua mãe de uma coleção de 1986, quando Kim Jones a viu. 

A coleção ao mesmo tempo em que homenageia o legado de Karl Lagerfeld na casa, de mais de 50 anos, também honra as fundadoras da marca e a ‘mulher Fendi’. 

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Essa coleção revela uma sensibilidade feminina ao mesmo tempo que mostra que a mulher Fendi encara qualquer coisa: a coleção de outono teve mais pele à mostra do que outerwear. Enquanto que traz esse ‘renascimento cultural’ do y2k para a vida real com peças de roupas para uma vida no dia a dia. 

E ainda falando em renascimento e renovação, tivemos novas re-edições das incógnitas e comentadas baguettes na passarela. Com o sucesso das baguettes impulsionado pela geração Z é, nada mais, que o novo reboot de Sex and the City, este é o momento mais que ideal para Jones trazer esse acessório aos holofotes, mais do que já está. Nessa coleção contamos com re-editions feitas de cashmere, couro e ‘intarsia mink’. 

Nos anos 90, Roberto Cavalli foi ‘renascido’ como o designer estrela dos Red Carpets. Muitas vezes comparado com Gianni Versace, o afamado estilista é conhecido por suas estampas exóticas e seu estilo flamboyant e glamuroso. Responsável por vestir as celebridades mais sexys de décadas atrás, Cavalli ainda mantém sua reputação e notoriedade, principalmente, através de suas peças archive que são cada vez mais prestigiadas por celebridades de agora, Zendaya e Bella Hadid para citar algumas, que trazem de volta à sedução e o poder da mulher. 

E foi pensando nisso, em unir as gerações de mulheres Cavalli, que Fausto Puglisi apresentou sua primeira coleção como diretor criativo da marca. ‘Eu quero respeitar a herança de Roberto’, disse Puglisi em entrevista. O grande momento y2k e o desejo de voltar aos anos 2000 trabalham a favor de Puglisi e da marca Cavalli. Entretanto, ao mesmo tempo, nunca se quis tanto evolução e melhoramentos para o futuro. 

Sua primeira passarela para Roberto Cavalli tinha como inspiração os anos de ouro e os archives da marca, em especial entre 1998 e 2006. O dourado, obviamente, compôs muitos dos looks, o animal print não deixou de marcar presença (assim como não deveria, por ser uma das marcas registradas de Cavalli), profundos recortes eram segurados por pequenas argolas, vestidos de festas eram feitos de couro, leather straps eram usadas como cintos ou colares, e o xadrez invadiu o outerwear e as mini saias. 

Assim, o Cavalli de Puglisi traz o sexy na medida, traz a mulher confortável da atualidade (e do pós-pandemia), traz o nada óbvio xadrez — que por ora nunca tinha feito parte de uma coleção de Cavalli — e ainda traz o poder feminino tão intrínseco na marca. 

DIA 2

Inspirada nos trabalhos do escultor  Alberto Giacometti e do fotógrafo Peter Lindbergh, a coleção ‘Esculpindo o Tempo’ da Max Mara, contou com 12 casacos femininos, em diferentes formas e volumes, conectados por sua neutra cartela de cores e pelos designs atemporais. 

Produzidas a partir de fibras naturais,de forma artesanal, as peças apresentadas exalam bom gosto e sofisticação, com acabamentos impecáveis.

Por sua casualidade, os looks podem ser adaptados a diversos estilos, uma ótima estratégia para uma coleção comercial. Mais uma vez, a marca mostrou que o básico também pode ser surpreendente. 

Simbolizando o ritmo acelerado da moda, em uma crítica ao consumo desenfreado, modelos da Sunnei, corriam pela “passarela” da marca – uma calçada, num cenário cinematográfico industrial. O público podia acompanhar a apresentação em câmera lenta, através de seus smartphones, para que os detalhes pudessem ser observados; metaforicamente, os aparelhos eletrônicos “congelam o tempo”.

Seguindo o ar esportivo do desfile, a coleção foi desenvolvida a partir de tecidos tecnológicos, que acompanham os movimentos corporais, estendem e esticam, permitindo a construção de camadas, essenciais para o clima invernal.

Simone Rizzo e Loris Messina, designers da marca, mantiveram a proposta elegante e minimalista, mas apostaram em cores saturadas e um assertivo mix de texturas, assegurando, assim, o senso de humor da Sunnei. 

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

“O sexy está mais na cabeça do que na pele exposta. Esse é um ponto cardeal da filosofia da Prada.” escreveu Gian Luigi Paracchini em seu livro “A vida Prada”, que conta a história da marca e de sua fundadora através de uma extensa pesquisa e de inúmeras entrevistas com Miuccia e sua família.

A frase de Gian Luigi resume bem a silhueta central da apresentação de hoje: regatas brancas vestidas sem sutiã e saias midi em tecidos leves e transparentes foram a base para a coleção, que herda referências claras de uma Prada mais minimalista que bombou nos anos 2000. O que essas peças têm em comum com a mensagem do autor? São casualmente sexys, no maior estilo Prada possível.

Para aqueles que estavam sentindo falta dos traços de Miuccia nesta nova fase da marca, que conta com Raf Simons como co-diretor criativo, a apresentação de hoje foi um deleite. Miuccia fez o que sabe fazer melhor: celebrar a mulher e sua história – e de quebra brincar com texturas e detalhes excêntricos ao longo do line up.

Foto do desfile da Bottega Veneta, retirada do Vogue Runway.

O penteado do desfile – um coque banana volumoso e impregnado de laquê – e a bolsa principal da coleção – de couro, espaçosa e carregada na mão – nos revelam que a estilista tenta dialogar nesta temporada com uma mulher profissional, mas não exclusivamente a que trabalha em escritórios. Miuccia utiliza esses códigos apenas para delinear a sua narrativa e mostrar ao espectador que a apresentação se trata de uma celebração do viver, do casual, do dia a dia; do rotineiro.

Mas é claro que, se tratando de Miuccia Prada, o rotineiro não precisa ser necessariamente tão minimalista assim: maxi bordados de flores, penas tingidas em marrom e azul marinho e pele fake azul bebê são alguns dos motivos e detalhes excêntricos que a estilista adiciona em peças-chave que formam as camadas de sobreposição da coleção.

Peças essas que, no geral, são os únicos traços de Raf na coleção – como as maxi jaquetas bomber, os trench coats em couro e a abotoadura embutida da alfaiataria. Todas, sem exceção, são heranças do último desfile masculino da dupla.

Ao longo da semana a marca postou vídeos de nove das 54 modelos que desfilaram hoje – dentre elas Anok Yai, Kaia Gerber e Kendall Jenner – em seu Instagram. Neles, as modelos apareciam ainda crianças em vídeos caseiros de infância e, após um corte, em takes atuais recém gravados. Com a legenda “Uma saudação à profissão de modelo. Uma história de mulheres.” a marca já indicava a narrativa que seria contada através das roupas: a vida acontece e quando percebemos já não somos mais crianças; temos agora uma vida cuja experiência e rotina são moldadas pela profissão.

Coincidência ou não, Hunter Schafer, a modelo que teve sua vida e rotina viradas de cabeça para baixo após estrear como atriz na série mais comentada do momento, encerrou o desfile.

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Nesta temporada, o time misterioso por trás da MM6 Maison Margiela deixou de lado a conceitualidade das peças e optou por apresentar uma coleção focada apenas em roupas. Os 37 looks desfilados apresentam modelagens e cortes super contemporâneos e que certamente serão um sucesso de vendas.

A marca passa ainda por uma reformulação na sua grade de tamanhos, extinguindo a clássica numeração europeia e a divisão entre masculino e feminino. Blazers de couro, luvas em estampa de cobra e conjuntos de alfaiataria acinturada são algumas das peças que certamente farão sucesso entre o público.  

Pela passarela da Emporio Armani, que remetia a um tabuleiro de xadrez, encontramos diversos elementos do militarismo, em alusão às peças do jogo. As roupas femininas apresentavam uma marcante cartela de cores, contrastando com os visuais masculinos, em sua maioria, monocromáticos e sóbrios.

 A coleção contou com mais de 100 looks, apresentando desde trajes formais, até roupas esportivas (em um mood invernal, claro!), passando por muita alfaiataria e, pelo estilo casual chic, característico da marca. 

Com comprimentos mini, midi e máxi, Armani passeou por diversas décadas, resultando em uma coleção coesa, mas que ainda assim, consegue agradar a seus diversos públicos. Xeque Mate! 

Nicola Brognamo, diretor criativo à frente da Blumarine, fez a marca voltar aos holofotes da imprensa e do público através da incorporação da estética Y2K em seus designs. A tática foi boa: ele aproveitou a tendência do momento e criou roupas que supriam a demanda daqueles mergulhados na #Y2Kfashion no TikTok e no Pinterest – conquistando assim centenas de clientes ao redor do mundo, dentre elas Dua Lipa e Bella Hadid.

Mas, depois de quatro coleções imersas no tema, seu trabalho começou a ficar cansativo. Isso porque Nicola não chegou a injetar uma linguagem própria na marca ou adaptar a tendência dos anos 2000 para o Zeitgeist – suas roupas, por vezes, pareciam fantasias.

A coleção apresentada ontem (24/02) marca talvez uma nova era de sua direção criativa: o designer deixa de lado a interpretação caricata do Y2K e passa a inserir designs e elementos de um processo criativo próprio pensado para o agora. Macacões justos, conjuntinhos de top e saia em tricot e vestidos drapeados são alguns deles, produzidos em uma cartela de cores mais sóbria do que o normal para o estilista.

A ruptura com o tema não foi também tão abrupta assim: tops de borboleta, mini saias de babados e jeans de cintura baixíssima são algumas das peças que seguem a estética dos anos 2000, tão adorada e explorada pelo estilista.

No geral, a coleção peca pelo impacto estético e pela inovação, mas certamente mira em um sucesso comercial. O que importa na verdade são os rumos que a marca irá tomar após o desfile: será que veremos mais de Nicola em futuras coleções?

A coleção apresentada ontem por Nicola Brognamo, diretor criativo à frente da Blumarine, marca talvez uma nova era para a marca: o designer abre um pouco a mão da estética Y2K e insere elementos e designs atuais em uma cartela de cores mais sóbria.

Conjuntinhos de tricot com busto à la JPG, macacões decotados justos e mini vestidos drapeados foram os destaques da coleção, que também herdou referências da Gucci de Tom Ford. Acompanhe no carrossel a review completa.

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Jeremy Scott é um daqueles designers que você ama ou odeia. Isso porque o estilista é um dos únicos que tira sarro da moda de maneira caricata e direta, fazendo muitas vezes com que seus designs sejam vistos como cafonas e bregas. 

Mas Jeremy não tem medo das críticas e construiu uma identidade para a Moschino pautada essencialmente na estética camp. O inverno de 2022 apresentado pelo designer segue portanto no mesmo mood: Jeremy escolhe um tema central e a partir deste constrói peças puramente inspiradas neste. 

O clássico “Space odyssey”, de Stanley Kubrick, é a narrativa que permeia e inspira toda a coleção – desde o cenário até o look vestido pelo designer no final da apresentação. Jeremy apresentou looks que incorporaram traços, desenhos e motivos de móveis antigos em suas modelagens e finalizações, construindo verdadeiros objetos-vestíveis (um clássico do estilista). Vestidos-sofá, ombreiras-moldura e tops-gaveta foram alguns deles.

A ideia por trás da GDCS de Giuliano Calza é clara: o designer faz roupas para aqueles que gostam de se divertir e brincar com a moda. Dentre estes está ninguém menos que Dua Lipa, que já desfilou diversos dos modelos de roupas e acessórios do estilista por aí. 

Esse talvez seja o motivo pelo qual Lorenzo Posocco, stylist da cantora, estivesse sentado na primeira fila da apresentação de inverno de 2022 da marca. Em uma cartela de cores tão colorida quanto a das outras apresentações, Giuliano apresentou uma coleção que brinca com texturas e beira a estética DIY: casacos são construídas em material de esfregadores de pó, vestidos midi aparecem feitos a partir de cabelo sintético colorido e casacos em látex contrastam com mini macacões de renda.

No geral, a coleção é mais um exemplo de como Giuliano consegue produzir peças criativas e instagramáveis. Por mais que o designer não seja muito forte em acabamento e edição final dos looks, sua entrega final dialoga perfeitamente com o zeitgeist – em uma era na qual cada vez mais os looks são pensados para fotos do que para serem efetivamente usados.

DIA 3

“As formas mais essenciais e rigorosas”, descreve Walter Chiapponi sobre sua coleção de outono/inverno de 2022 para a Tod ‘s. Nomeada de “Italian Beauty”, a coleção é repleta de alfaiataria, trench coat longos inspirados em uniformes – looks femininos para a volta ao trabalho – e sobretudo alongados apertados na cintura. Uma coleção elegante com looks invernais alongados e soltos. Botas em cano alto femininas e masculinas, mocassim e tênis completavam os looks, além de bolsas e cintos. A paleta girava em torno de tons terrosos como marrom, preto, bege, verde militar, laranja e vermelho. 

O diretor-criativo da casa reduziu a coleção para 44 looks alguns dias antes da apresentação na passarela em Milão. “Decidi desnudar e reduzir a coleção, tornando-a mais essencial”, disse ele à imprensa. “Não é hora para frivolidade, realmente.” O desfile iniciou com Gigi Hadid em um terno preto, corte fino na perna, uma verdadeira homenagem aos anos 90. A alfaiataria de Chiapponi expressa uma estética moderna, mas com um toque clássico e silhuetas amigáveis. Ternos masculinos usados por modelos femininas vem sendo mostrada em toda temporada, com Tod´s não foi diferente, o designer abordou essa versão em diversos looks.

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Após dois desfiles sob sua direção criativa, o designer Alberto Caliri está deixando a Missoni, marca onde trabalhou por mais de 20 anos como chefe de design de Angela Missoni. O diretor-criativo desenvolveu uma coleção que relembra passos da marca, simplista e descomplicada. “Os confrontos harmoniosos entre um espírito burguês, elegante e milanês, e uma atitude rock moderna e jovem”, descreve ele sobre sua coleção. Looks modernos e que levam a pegada punk rock – característica que tem se mostrado presente em grande parte dos looks dessa temporada. 

Alberto desenvolveu looks como uma jaqueta motociclista de couro preto que foi usada sob um blazer masculino listrado, além de um couro branco envernizado por baixo de um casaco chevron de tricô jogado sob os ombros, além de macacões de couro vermelho e calças de motoqueiro, bem como em jeans largos e calças extra largas de cintura baixa usadas com tops ou malhas, que chegaram em conjuntos aconchegantes. 

As roupas leves eram brilhantes, opacas, metálicas, luminosas e brilhantes, que à noite, os looks eram iluminados por vestidos de malha tricotados com fio de lurex brilhante, como o usado pela supermodelo Eva Herzigova que encerrou o desfile.

Para Veronica Etro, diretora criativa da marca, nesta temporada ela desenvolveu a coleção nomeada de ‘Etro Remix’, uma verdadeira viagem aos anos 1960-1980, revivendo a herança da marca e as raízes familiares na Itália durante sua infância.  

Foram apresentados 46 looks que para essa coleção mostram o desejo pelo verão europeu. Looks coloridos e estampados em vestidos, calças, tops e terceira peças como uma camisa manga curta ou jaquetas. Looks como malhas boho arty-crafty, alguns em tons escuros com a pele a mostra que expressam uma estética punk, mas moderna e diurna. Os tecidos são um destaque a parte que vale a pena considerar a grande relevância da Etro nisso. 

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Para essa coleção de outono/inverno, Gucci entra em mais uma collab, dessa vez com a Adidas – as últimas collabs contaram com The North Face, Disney, e a mais recente Balenciaga – abrangendo desde chapéus – boinas, bonés, cachecóis – até ternos, vestidos de noite, corset, vestidos e acessórios. Intitulada de ‘Exquisite Gucci’, Alessandro Michele, ainda apresenta uma clássica estética vintage fazendo referências a várias épocas da marca, com casacos de pelo e reedições de bolsas clássicas.

A alfaiataria reina na coleção. Apesar do look ser um totalmente clássico, Michele o insere de uma forma contemporânea, usado com óculos, toucas com listras da Adidas ou brincos verdes. Reprisando um dos maiores sucessos de Tom Ford, um smoking de veludo vermelho do outono de 1996, o diretor criativo o insere com novos ajustes e outro tecido, que incluem ombros mais modernos, detalhes em couro que contornam a frente do smoking em preto com placas arredondadas de metal, além da camisa azul e uma gravata preta fina em couro. O look acompanha um sapato social, mas com toque esportivo. 

Ele disse que as mulheres com que trabalha muitas vezes expressam afeição por roupas masculinas e adoram usar ternos masculinos. “A linha é tão reta e elegante em um terno masculino”. O traje de abertura é tecnicamente um traje masculino usado e mostrado por uma modelo. “Você não precisa de muito para adaptá-los a corpos masculinos ou femininos”, disse Michele sobre o terno. 

Looks de renda e lingerie são usados com casacos volumosos e botas. Uma moda sexy e ousada é apresentada em looks femininos e masculinos, tanto nos looks em si como em suas cores e estampas, seja quadriculada, listrada e estampa de cobra que tem surgido nas passarelas.  

O ponto de partida da coleção, foi uma foto da Madonna de 1993, onde ela aparece em um vestido da Adidas. A parceria com a marca esportiva além de ganhar um ar vintage, apresenta um ar ousado como peças de tricô em pontos abertos. Muitos looks são apresentados com uma enorme logomania, característica clássica da Gucci. 

As cinturas nesta coleção subiram, não estão mais abaixo do umbigo como tem aparecido nas passarelas. Os ombros e as bolsas estão maiores, o contrário também do que tem sido visto, como a tendência de mini bolsas. 

Alessandro honra o legado da marca, mas sem perder o timing do novo, da mudança necessária. Resgata os arquivos e os insere no hoje. Uma coleção comercial que não irá demorar para ser vista pelas ruas. 

Não é de hoje que Donatella Versace gera expectativas sobre seus desfiles e consegue surpreender em boa parte deles. Para essa coleção de outono/inverno 2022, Donatella cria looks modernos e sexys, o que melhor sabe fazer em sua direção criativa da marca. Cinturas marcadas, corset e mini saia cintura baixa são apresentadas na coleção. O uso de cores que são atraídas ao sexy como rosa, preto e vermelho se encontravam nos looks. 

Supermodelos como Gigi e Bella Hadid, Emily Ratajkowski e Lila Moss desfilaram para a marca. As maquiagens eram com os olhos contornados de preto e sobrancelhas apagadas, além do cabelo liso e dividido ao meio – tendência que tem se mostrado presente nas semanas de moda.

A versão Y2K é enrustida na coleção, mas de uma forma madura e punk, e não jovial como ela se apresenta normalmente. O uso de choker, botas tratoradas e calças em vinil contemplaram boa parte da coleção. Camisetas com frases como “I ‘love” – representado em forma de coração – you, but I’ve chosen Versace” usada como baby look e mini saias ganharam o centro das atenções, e no final Bella Hadid aparece usando com Donatella. 

A paleta de cores é apresentada em tons neon, preto, verde, vermelho, rosa, entre outras. Nas estampas as cores se encontram e formam casacos quadriculados, blazers e vestidos. Casacos alongados e conjuntos de blazers ganham destaque nessa coleção como nesta temporada de outono/inverno 2022. 

Não é de hoje o resgate dos arquivos da marca por Donatella, como a inserção do salto bloco que em toda coleção é apresentado e continua atraindo olhares. O caminho da diretora criativa tem mudado e surpreendido, mas uma coisa é certa: ela não tem dúvidas do seu trabalho e o que fazer para alterar o estilo da marca, mas mesmo assim deixar seu DNA claro e cada vez mais presente. 

DIA 4

Em seu primeiro desfile após quase dois anos longe das passarelas, o designer nigeriano-britânico Tokyo James buscou direcionar suas criações a mensagens extremamente positivas. ‘’Pelo menos não se parece com o que passamos’’, disse o estilista após sua apresentação. 

Sendo assim, ele buscou apresentar peças que pudessem fugir do sentimento de tensão pela qual o mundo tem passado nos últimos 18 meses por conta da pandemia em decorrência do novo coronavírus (Covid-19). 

Durante seu desfile suas peças fortes e justas foram grandes protagonistas de seu grande show 一 marcado pela resiliência. As mulheres de Tokyo James foram representadas de maneira altamente sexy e sensual. De maneira mais geral, a apresentação da nova coleção de Outono de James apresenta referências ao universo punk 一 representados pelos cabelos espetados e óculos cobertos de tecido 一 e ao upcycling, marcados pelo jeans reciclado e uso de materiais mortos da Nigéria.  

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Entretanto, a alfaiataria de Tokyo James foi a grande estrela do desfile. Confeccionada a partir de ternos feitos em mohair felpudo, em seda chartreuse abotoada na parte lateral e com bordados de sapos 一 toten escolhido por James 一 feitos de maneira caprichada.

Como forma de ressaltar a parceria da marca com a Nike e sua paixão pelo universo futebolístico, foi possível observar pregas de futebol em praticamente todos os modelos da coleção, além do reaproveitamento de alguns materiais como os cadarços dos sapatos como acabamento em um de seus vestidos e babados da Nike como remendos. 

Não é novidade alguma que o DNA de Jil Sander está diretamente ligado à construção de ternos clássicos em alfaiataria e toda a sua sutileza e elegância, e nesta temporada não foi diferente. Enquanto a maioria das marcas 一 inclusive as que passaram pela Semana de Moda de Milão 一 buscou mirar nas referências e gostos da Geração Z, Lucie & Luke Meier (responsáveis pela direção criativa da Jil Sander) optaram direcionar as criações da marca ao olhar adulto e mais maduro, pensando na comunidade desta determinada faixa etária que ocasionalmente possam se sentir abandonadas e deixadas de lado no quesito ‘’representatividade’’ ou, ainda, na quase ausência de vestimentas voltadas para si nas últimas temporadas das semanas de moda. 

Este sentimento de lealdade foi reproduzido através da produção das peças clássicas em alfaiataria escultural, construídas de modo que praticamente imitassem a produção em alta-costura, bem como pela adoção de silhuetas mais cortadas, representando toda a elegância que somente a Jil Sander tem.  

Seguindo essa pegada, foi possível encontrar ternos de saia em lã, jaquetas com uma construção mais esculpida em volumes de ampulhetas e complementadas com a presença das famigeradas botas Chelsea 一 desta vez, com detalhes dourados, mais planas e resistentes. Além disso, o minimalismo dos anos 60 em junção ao propósito artesanal construíram – de maneira altamente sucessiva – a estética de Jil Sander para este Outono.  

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

A nova coleção da Bottega Veneta antes de seu lançamento poderia facilmente ser considerada como uma incógnita para a comunidade da moda, especialmente após a saída de seu então diretor-criativo, Daniel Lee, anunciada oficialmente em 10 de novembro de 2021. Desde o comunicado, muito se especulava quem assumiria e quais rumos a marca italiana iria tomar 一 uma vez que Lee foi considerado como o grande responsável pelo rebranding da marca, especialmente durante o início da pandemia, em 2020. 

A coleção de Outono/Inverno 2022 da Bottega Veneta legitima o debut de Matthieu Blazy na marca 一 designer belga que teve passagem pela Balenciaga, Raf Simons, Maison Margiela, Artisanal, Celine e Calvin Klein antes de se tornar o diretor do setor de prêt-à-porter da Bottega em 2020. Apesar das diversas especulações acerca de sua função como diretor-criativo da casa e de como ele daria continuidade ao trabalho excêntrico realizado por Lee, é possível afirmar que Blazy conseguiu entregar uma coleção íntegra e extremamente alinhada aos conceitos e identidade da Bottega Veneta. 

Pelas próprias palavras de Matthieu sobre suas criações, sua nova coleção para a marca simboliza as jornadas, e isso pode ser facilmente apreendido durante uma viagem pelos 69 looks apresentados por ele nesta temporada. Cada look contém uma história para contar e representa o conceito de diversas e distintas jornadas individuais. ‘’Há muitos personagens, todos eles têm lugares para ir, eles se sentem bastante livres’’, contou Blazy à Vogue. 

Em outras palavras, Matthieu Blazy pretende reconectar a marca com seu pedigree italiano através da inovação e criatividade 一 características bem marcantes da Bottega Veneta. O que pode ter sido considerada como uma coleção com componentes e detalhes ‘’demais’’, na verdade, representa de maneira excepcional a assinatura de Matthieu costurada à identidade da marca. 

Foto do desfile da Bottega Veneta, retirada do Vogue Runway.

Quanto aos detalhes, foi prazeroso poder assistir uma coleção tão sólida e extremamente precisa quanto à colocação dos componentes e o storytelling por trás de toda essa junção, como por exemplo a calça confeccionada de couro representada como jeans. 

Chama atenção ainda a importância do trabalho artesanal nesta coleção de Outono/Inverno da Bottega Veneta: a nova bolsa apresentada (Kalimero) foi confeccionada em uma peça única 一 sem costuras 一, assim como as botas de cano alto presentes na apresentação. Ademais, os ternos executados com precisão, malhas mais ecléticas e suéteres retalhados contribuíram para exaltar a produção à mão nas criações de Matthieu. 

Se por um lado a saída abrupta de Daniel Lee de seu cargo como diretor-criativo da Bottega Veneta deu margem a diversas lacunas quanto o futuro da marca na indústria da moda, a recém-chegada de Matthieu Blazy à maison foi crucial para fechá-las. Com uma proposta de criações mais confortáveis e destinadas a vestirem as denominadas ‘jornadas’, a coleção exposta por Blazy neste sábado (26) conseguiu conversar entre duas gerações contrastantes (passado-presente), além de posicionar a Bottega Veneta no status de moderna, atual e conectada 一 expressa pelas referências à tecnologia, propósito este também pretendido pelo novo diretor-criativo da marca. Sendo assim, a coleção que oficializa a estreia de Matthieu marca o início de uma nova era na casa italiana, sem deixar para trás a sutileza, leveza, requinte e alta qualidade característicos de Bottega Veneta. 

DIA 5

Massimo Giorgetti lança sua coleção de Outono/Inverno 2022 para a MSGM como um foguete que anseia desvendar os mistérios da imensa escuridão do espaço sideral. De acordo com as notas do designer, Giorgetti se viu observando o céu à procura de ‘um espaço mais amplo de esperança em algum lugar longe do familiar e assim fugir da realidade difícil’.

Toda atmosfera astronômica que envolve as constelações, galáxias, planetas, estrelas, buracos negro e cometas foi ponta pé de inspiração do designer italiano, que logo se viu imerso e totalmente preso na temática, segundo o prórpio Giorgetti. 

Brilho foi a palavra de ordem do início ao fim da passarela, fazendo alusão aos corpos celestes que iluminam a imensidão escura e misteriosa do cosmos. O glitter e a purpurina na estamparia de peças em tule, o vinil, bordados de cristais em forma de estrelas, paetês, o couro e o trabalho de bordado em telas transparentes; todos materiais que quando trabalhos em sequência, completam a energia luminosa que coleção aborda. Peças grandiosas de pele falsa como casacos, saias e botas “lunares” terminam por trazer essa silhueta volumosa já bem familiar dessa temática espacial.

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Na estamparia, o designer trabalha de forma bem literal o seu tema. Motivos onde os desenhos figurativos de constelações estelares, cometas, meteoros e planetas juntam-se em uma só superfície criando as galáxias que habitam na imaginação de Giorgetti. Já nos bordados brilhantes presentes nos conjuntos de alfaiataria e no moletom e calça jeans (look 17), levam esses looks de cortes simples a se comunicarem com maior coerência com a extravagância do restante da coleção.

Diferentemente de suas coleções passadas, Giorgetti decide apostar em uma paleta bem mais discreta do que em seus tons rosados e alaranjados extremamente saturados da sua última coleção. Os tons metalizados, acinzentados, o branco e o preto dominaram a maior parte das peças da coleção. 

A literalidade do designer ao longo da apresentação pode ter facilitado o entendimento do tema por parte dos fãs de seu trabalho, mas talvez seguir por caminhos menos óbvios e mais orgânicos poderia ter levado sua coleção à galáxias bem mais excitantes.

A moda das pistas de corrida da Fórmula 1 retorna às passarelas na Semana de Moda de Milão através da coleção de Outono/Inverno 2022 da Ferrari, que continua a investir no mercado de moda de luxo desde junho de 2021.

Rocco Lanonne, designer italiano responsável pela direção criativa da Ferrari, partiu do ponto de partida do próprio DNA da quase centenária marca de carros de luxo. Inspirado no cotidiano dos pilotos da Ferrari, Lanonne faz estudo das inovações tecnológicas de materiais e traduz isso para um consumidor que tem interesse em consumir o produto fashion da grife. 

Ele buscou mergulhar mais fundo na cultura automotiva e não focar somente no lado superficial dessa modalidade esportiva, como nos elementos físicos, decorativos dos carros e nas roupas de pilotagem. 

Ao invés disso, procurou apostar nos fatores tecnológicos, exemplos disso foram os vários looks em Nylon, que por via de regra fazem parte do cotidiano dos uniformes dos profissionais das equipes; além de peças em fibras de carbono e fibras de plástico reciclado.

A paleta de cores escolhida por Lanonne descreve com clareza o espírito da marca, os tons de vermelho amarelo e verde estão presentes do início ao fim da coleção em diversas tonalidades diferentes; além dos azuis, preto e das estampas gráficas que remetem à circuitos de softwares, a logo de cavalo da marca foi repetida diversas vezes em alguns looks gerando estampas abstratas.

Peças em couro, lamê e borracha, casacos de cashmere e golas felpudas tiveram seu momento de destaque durante o desfile. Ianonne também aproveitou para trabalhar em luvas de pilotagem de couro e balaclavas de tricô, muito tem se discutido sobre o uso da balaclava e o significado cultural que ela carrega. No caso de uma marca de carros de corrida como a Ferrari, a balaclava é um elemento de segurança obrigatório nos uniformes dos pilotos e sua inserção na coleção faz total sentido para um consumidor que está habituado neste ambiente automotivo.

Lanonne ainda percorre pistas desconhecidas ao assumir a direção criativa de uma marca de carros em um território tão desconhecido para a Ferrari, como a moda; seus primeiros trabalhos na marca já mostraram agradar o consumidor já habituado com a marca e atrair nosso fãs para a Ferrari e para o mundo automotivo que têm crescido muito em popularidade nos últimos meses. 

Só resta saber se a marca vai saber lidar com o público do mundo fashion da mesma forma que sabe lidar com os apaixonados por carros ou se é só mais uma febre que recaiu sob o gosto popular com Fórmula 1 que voltou a estar em voga.

Fotos para a montagem retiradas do Vogue Runway.

Inspirado pela era do jazz e pelo movimento artístico Art Déco, Giorgio Armani lança sua coleção de Outono/Inverno 2022 seguindo a tendência cintilante que tem tomado conta das passarelas nessas últimas semanas de moda.

Movido pela extravagância dos anos de 1920, Armani levou a sério o trabalho eufórico de materiais brilhantes ao longo da coleção.

A extensa coleção de 90 looks desfilados na passarela contou com uma seleção de peças com silhuetas frequentes na marca de Giorgio Armani mas com um apreço pelo glamour elevado nessa temporada de Outono/Inverno.

Desde vestidos, calças, passando por blazers, casacos, cardigans e acessórios, o designer italiano trabalha a estética festiva em um paleta de cores concentrada nos acinzentados, pretos e azulados. 

Mesmo com um público masculino de perfil mais conservador e clássico, Armani conseguiu introduzir a aplicação de materiais não tão discretos sem sair exageradamente da zona de conforto da sua clientela, que já está familiarizada com a alfaiataria impecável Italiana.

As inúmeras peças de veludo molhado, jaquetas de lã, casacos estampados e brilhantes, jaquetas com abotoamento marinheiro e com bolsos utilitários, cardigãs e calças amarrotadas descrevem o guarda-roupa desse novo consumidor de Armani que passa a experimentar com certo cuidado o glamour trabalhado na coleção. Para a moda feminina, a Armani pode extravasar com maior liberdade os brilhos de um tempo passado regado a festas e holofotes. Os looks femininos foram recheados de brilho desde a linha dos ombros até aos calçados e acessórios.

Veludo molhado, brocados texturizados, estampas geométricas cintilantes, e o trabalho minucioso de bordado de miçangas em vestidos que revisitam a silhueta de linha “I” das melindrosas da era do Jazz captam toda o comportamento excêntrico das mulheres daquela época mas nos tempos de hoje.

Armani se junta ao grupo de designers que passam a olhar a moda como uma válvula de escape que viaja para tempos mais fáceis, e que ficam à espera de clientes que queiram entrar nessa fuga temporal.