Do sim ao altar: o cronograma de beleza para noivas

Para algumas noivas, um dos dias mais mágicos da vida delas é o dia do “sim”, porém, quando dizem sim ao pedido de casamento, também estão aceitando os desafios que cercam a preparação para que esse grande dia seja perfeito. Foi-se o tempo em que as preocupações dos noivos se restringiam à decoração, buffet e escolha dos trajes adequados. Agora, principalmente no que diz respeito às noivas de plantão, mais um item entrou no checklist de tarefas a serem realizadas até o dia da cerimônia: o cronograma de procedimentos de beleza. 

Com o avanço da tecnologia nesta indústria, os novos tratamentos com diferentes objetivos e downtimes (tempo de “descanso” necessário para que a região tratada se recupere e atinja o resultado final) têm se popularizado rapidamente devido à versatilidade que oferecem: há tratamentos mais profundos que podem precisar de semanas de recuperação para que se chegue ao resultado final, enquanto existem outros mais superficiais que não possuem downtime e a paciente já pode voltar às atividades cotidianas logo após a realização dos procedimentos. 

Imagem: Reprodução/Organize Casamento

No entanto, quando se tem um planejamento por trás, é possível obter o melhor dos dois mundos: combinar tratamentos – tanto pelos efeitos a longo prazo, fruto dos protocolos que tratam a qualidade da pele de maneira mais profunda, quanto por aqueles que podem ser realizados aos “45 do segundo tempo” e trazem resultados sutis, mas notáveis – e obter resultados progressivos, ou seja, que melhoram com o tempo. Esse é o caso das noivas que cada vez mais têm buscado montar um verdadeiro cronograma de beleza a ser seguido desde o dia do “sim” até chegar ao altar. 

Emanuela, que casou-se recentemente, desde o início dos planejamentos, incluiu em seu “projeto noiva” cuidados específicos com a aparência, “Quando disse ‘sim’ ao meu noivo, também disse sim ao dia dos meus sonhos e por isso fiz questão de chegar nele na minha melhor versão!”. Segundo ela, a preparação começou com um ano de antecedência, logo que noivou, e a escolha dos procedimentos foi um conjunto de desejos dela e recomendações de profissionais.

“Aproveitei a ocasião do casamento para tirar do papel algumas vontades que já tinha, como preencher as olheiras que já me incomodavam há um tempo, com ácido hialurônico (uns três meses antes) e aplicar a toxina botulínica de forma preventiva e para levantar o olhar (mais ou menos dois meses antes da cerimônia). Porém, quando procurei minha dermatologista para realizar esses procedimentos, ela me recomendou alguns outros tratamentos para melhorar o aspecto da pele, como limpezas mais frequentes (realizei uma por mês) e lasers para tratar manchas e textura. Montamos um verdadeiro cronograma que incluiu desde tratamentos no consultório até cuidados em casa.” Emanuela ressaltou ainda que a preparação e o cuidado prévio para com a imagem foram fundamentais para que ela se sentisse mais confiante no dia da cerimônia, “Me senti preparada, mais bonita de verdade, porque tudo o que me incomodava antes já não estava mais lá, eu já tinha tratado!”

Nesse sentido, a Dra. Liliany Lóss Folate, médica dermatologista, diretora da clínica Dermacorpo,  afirma que se preparar com antecedência, porém com calma e responsabilidade, é de extrema importância: “O grande dia da noiva é uma ocasião de muitas emoções e ansiedade! Eu recomendo não acrescentar mais emoção, na ânsia pelo resultado dos procedimentos estéticos. Sempre oriento a realizar os procedimentos de forma programada e antecipada.” Além disso, a dermatologista acrescenta que seis meses de antecedência é o período que considera ideal para dar início aos cuidados de forma mais intensa e que os protocolos a serem adotados são escolhidos após a realização de uma avaliação individual, que é uma etapa fundamental para identificar as necessidades de cada noiva e direcionar o tratamento.

No entanto, existe uma característica que a Dra. Liliany considera indispensável em qualquer cronograma: a busca por uma pele visivelmente bem zelada, “Estar com a pele bem cuidada, com viço e brilho, faz toda diferença na maquiagem! O Botox também é indispensável!” e para exemplificar uma forma de chegar a esse resultado, ela nos direcionou na montagem de um cronograma de beleza para incentivar as noivas de plantão. Vamos conferir?  

Cronograma de beleza do “sim” ao altar:

  • 6 meses antes: Os bioestimuladores de colágeno – substâncias aplicadas na face para estimular a produção de novas fibras de colágeno, auxiliando na melhora do aspecto do rosto, minimizando os sinais do tempo, atenuando a flacidez e proporcionando uma pele mais uniforme + Ultraformer 3 – um aparelho de última geração que combina a utilização dos ultrassons micro e macrofocado para tratar a flacidez da pele. Essa tecnologia atua através de estímulos para intensificar a produção natural de colágeno no organismo e promover a quebra das células de gordura. 
Imagem: Reprodução/Mealth Clinic
  • 3 meses antes: Preenchedores + Laser.
  • 1 mês antes: Botox e, se necessário, alguma nova etapa com preenchedores.
Imagem: Shutterstock
  • 15 dias antes: Finalizar com Laser para melhorar textura de pele!

Depois de descobrir a importância de um planejamento prévio e com um cronograma em mãos para se inspirar, parece que o caminho para chegar ainda mais bela ao altar ficou mais descomplicado, não é? Porém, não se esqueça: cada planejamento é único e a opção por realizá-lo também. O cronograma de beleza não deve ser visto como uma regra e nem como uma obrigação, mas, sim, como um escape relaxante e um momento de autocuidado para as noivas em meio a um período que é cercado por um turbilhão de emoções. 

O prazo de validade da beleza: por que as pessoas estão com medo de envelhecer?

Nas décadas de 1990 e 2000 muitos filmes de dramas adolescentes, apresentavam ao menos uma cena que retratava algum jovem desejando ser, ou ao menos aparentar ser, mais velho por algum motivo. Quem não se lembra do clássico De Repente 30 com Jennifer Garner e Mark Ruffalo? 

Imagem: Reprodução/Veja

Fosse pela autoridade, respeito, sabedoria e reverência que era concedida aos mais velhos ou simplesmente pelo fato de que “ser adulto” era associado à possibilidade de possuir mais liberdades, envelhecer era como se fosse um troféu. Um selo de experiência e competência. No entanto, o que se tem observado nos últimos anos, é uma tendência contrária, pautada no intuito de voltar no tempo com a aparência. É como se envelhecer tivesse deixado de ser o curso natural da vida e se transformado em uma doença a ser combatida. A comunidade passou a ser movida pelo desejo de ser como Benjamin Button.

Em um contexto marcado pela volatilidade, transformação constante e que preza muito a flexibilidade e a capacidade de adaptação, tudo o que é considerado antigo é associado a desatualização e, consequentemente, preterido e ignorado. A tendência pela exaltação da juventude pode ter como um de seus pilares o fato de que esta parcela da sociedade é, aparentemente, a detentora do conhecimento necessário para se compreender o mundo atual. No passado, envelhecer era o desejo, porque significava passar a saber e entender o que os mais novos não sabiam, porém, nos dias de hoje, qual seria o motivo de desejar isso sendo que são os mais jovens os conhecedores do funcionamento das tecnologias que imperam no mundo globalizado contemporâneo?

Imagem: Reprodução/Onze.com

Nesse sentido, o desejo por se manter jovem passou a nortear não apenas os comportamentos das pessoas (que tendem a ficar ligeiramente mais infantilizados com a intenção de parecer cool e descolado), mas a guiar suas escolhas em relação à sua estética também. A aparência é considerada a maior responsável por “denunciar” os anos de vivência e é o primeiro alvo de ataques quando se tenta desmoralizar e desconsiderar alguém com base na idade (prática denominada etarismo); por essa razão, à beleza passa-se a atribuir uma espécie de prazo de validade que faz com que as pessoas pensem que não serão mais aceitas, nem belas no mundo atual a partir do momento que atingirem uma idade mais “avançada”.

De acordo com a psicóloga Natália Tozo, as pessoas têm sentido tanto receio em envelhecer, porque a sociedade não valoriza o processo de envelhecimento, veem os idosos como pessoas que não são mais produtivas e não valorizam sua história e seus saber. “Com a tecnologia veio o acesso rápido ao consumismo e a ideia de padrão de beleza. A indústria veio com muitas novidades e promessas de uma imagem de que ficar mais jovem traz mais aceitação. […] Claro que se cuidar é importante e faz bem para o ser humano, mais nada em excesso é saudável nem para a mente, nem para o físico.”, ressalta a profissional.

Sendo assim, inicia-se uma busca intensa por maneiras que mantenham a imagem livre de rugas, linhas de expressão ou qualquer tipo de marca que possa “entregar a idade”. O investimento cada vez mais intenso na busca pelo corpo perfeito e a vontade de se inserir em um dos muitos padrões sociais, comportamentos esses que representam a manifestação do angústia em envelhecer: “o medo também vem acompanhado de sintomas de ansiedade com alteração do humor, intercalando dias mais eufóricos com dias mais deprimidos, excesso de cobrança pessoal, tensão e uma sensação de que ‘se eu não der conta, sou um fracasso”.

Seguindo esse ritmo, procedimentos invasivos e não invasivos, suplementos e até mesmo medicações para impedir que o corpo externe os sinais começam a ser frequentes nos planejamentos das pessoas. No entanto, é importante entender quais são, de fato, esses sinais e como tratá-los corretamente e dentro do necessário. A médica dermatologista, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), Dra. Amanda Vilela destaca que os primeiros sinais que indicam a chegada da idade se manifestam a partir dos 30 anos, quando a produção de colágeno começa a diminuir: “A partir dos 30 anos, diminuímos nossa produção intrínseca de colágeno e iniciamos o processo de degradação dos fibroblastos. […] Começamos a observar uma diminuição leve da espessura da pele, e as marcas de expressão também já se iniciam.”.

Todavia, o processo de envelhecimento, apesar de natural, pode ser feito com mais qualidade que, a dermatologista explica ser envelhecer com as suas características, mantendo os seus padrões e de uma forma natural, “É as pessoas te observarem e falarem: “Você está tão bem, igual a quando te conheci! O tempo só te faz bem!”. Dessa forma, alguns cuidados podem ser tomados para que o avanço da idade torne-se mais leve: “Primeiramente, ter um dermatologista de confiança, um especialista com olhos treinados, técnica e know-how para saber o que indicar é fundamental. Deve-se investir em procedimentos que estimulem colágeno como Ultraformer3, Bioestimuladores, fios de PDO e pontos de preenchimento com ácido hialurônico e a toxina botulínica!”, recomenda Dra. Amanda Vilela.

Imagem: Reprodução/Hypeness

É válido destacar que, apesar de existirem meios que permitam que o envelhecimento ocorra com mais qualidade e menos impacto, ele ainda assim é um acontecimento orgânico, inato, por isso, todo receio exagerado em relação a ele precisa ser questionada e observada com atenção. De acordo com a psicóloga Natalia, o tratamento dessas questões deve vir, especialmente, por meio da sociedade, que precisa mudar a mentalidade de que a felicidade é um sentimento próprio da juventude: “envelhecer é um processo natural e precisa começar a ser aceito e respeitado, principalmente por quem está nessa fase. A aceitação e o compromisso começam com o sujeito e o olhar dele para consigo mesmo, para que ele não deixe que o olhar do outro o defina […] Sua saúde mental precisa estar em equilíbrio com seu corpo”.

Por fim, é importante ressaltar que valorizar os mais velhos não significa desmerecer o conhecimento da juventude dos dias de hoje, apenas não deixar que as inseguranças fundamentadas em padrões distorcidos impeçam a sociedade de apreciar o avanço da idade e todas as experiências e aprendizados que cada etapa pode trazer. A beleza não possui um prazo de validade, mas sim estágios de maturidade que são resultado da constante transformação natural.

Old Money: Fascínio entre a riqueza geracional

Em 2021, entre os vídeos verticais em nossas timelines um estilo de vida – e de roupas – foi popularizado entre a geração Z. Uma saia plissada clássica de tenistas, que foi resgatada dos guarda-roupas dos anos 90, foi uma das primeiras peças a serem popularizadas em massa entre a juventude, uma porta de entrada para que meses depois a estética “Old Money” estava em um dos estilos mais procurados no mundo digital. O estilo pode ser resumido em um mix entre o preppy – abreviado de “preparative school” – faz referência aos uniformes de internatos e colégios particulares, como representado nas séries Gilmore Girls, Elite, Gossip Girl, etc – Também como o esporte chique, muito associado aos country clubs, exalando luxo e sofisticação através de tecidos limpos e peças de modelagem casual, mas que exalam qualidade. Como os suéteres, coletes de tricot e as tradicionais camisas de gola polo, quais foram criados por René Lacoste, em meados dos anos 20, em uma união entre estilo e conforto, com o intuito de melhorar sua performance no tênis, que logo se popularizou, estabelecendo firmemente os fundamentos da marca. 

Além de Lacoste, Tommy Hilfiger e Ralph Lauren são alguns dos nomes que ajudaram o estilo a se estabelecer no imaginário popular, conseguiram principalmente,  transformá-lo em um estilo clássico sem perder o ar esportivo, mesmo em suas composições mais formais, inspirado principalmente pelo tênis, golfe e hipismo – esportes praticados exclusivamente pela elite – A popularidade também pode ser associada às Olimpíadas de 2020 em Tóquio (2021), que nesta edição, contou com um maior alcance do público jovem.

Campanha publicitária da Lacoste [Imagem: Reprodução / Pinterest]

O estilo aparentemente despretensioso, camufla o preconceito de classes que há por trás dele. O conservadorismo é mascarado pela “simplicidade” em suas produções, apesar de compostas por peças de luxo. Relacionada à burguesia majoritariamente branca, a estética constrói uma fiel representação da sigla WASP – Branco, Anglo-Saxão e Protestante. O termo “Old Money” refere-se aos membros das elites norte-americanas e europeias, cujo poder e prestígio social são passados entre seus descendentes. 

O “dinheiro antigo” é associado a riqueza geracional, mantida e protegida  por múltiplas gerações da família com grandes patrimônios financeiros, mas principalmente uma instituição social por trás do sobrenome que trás, um termômetro de poder social dentro dessas famílias da alta sociedade. São códigos de riqueza conhecidos por um grupo pequeno de pessoas que os entendem, grande parte do fascínio entre os estilos dessas pessoas vêm de entender como eles se reconhecem entre si, como um grupo fechado.

Campanha publicitária da Ralph Lauren – Abril 1989 [Imagem: Reprodução / Vanity Fair]

Old Money X New Money

Um produto de luxo é caracterizado não apenas pelo seu aspecto físico, mas pelo conjunto de sensações e conceitos que o envolvem, como mencionado por Gilles Lipovetsky e Elyette Roux no livro “O Luxo Eterno”, além de um objeto ou serviço, o consumidor se dispõe a pagar um valor mais elevado, pelo poder que este representa. Para os que alcançaram a ascensão social, a posse desses bens está atrelada à conquista e reconhecimento, por isso, fazem questão de exibi-los; enquanto os ricos “de berço” buscam a privacidade, sem necessidade de autoafirmação, mas ainda assim, procurando se distinguir dos demais. 

Um popular ditado que foi colocado a tona em conjunto com a popularidade do estilo, revivendo é que “o dinheiro fala, mas a riqueza sussurra”, nisso se baseia o estilo de vida conservador, caracterizado pela aversão à ostentação, sensualidade e extravagância dos novos ricos, sendo estes, em sua maioria, latinos, negros e asiáticos, que conquistaram a ascensão, principalmente por meio da arte (rappers, cantores, atores, modelos), escancarando assim, a segregação social, o racismo e a xenofobia. 

Curiosamente, a estética Old Money vem sendo consumida tanto pela classe média, quanto pelos ricos emergentes, o que pode indicar uma necessidade de apropriação e ocupação deste contexto que lhes foi negado, mas que hoje possuem condição de usufruir, mesmo que apenas visualmente, ou porque acreditam que assim, serão aceitos mais facilmente neste cenário social, seguindo o lema “fake it until you make it”.

Estética Old Money X Estética New Money – Street Style  [Imagens: Reprodução / Pinterest]
Estética Old Money X Estética New Money – Street Style  [Imagens: Reprodução / Pinterest]

Análise Social

O acúmulo de capital é um dos principais fatores contribuintes para a desigualdade social e a taxação das grandes fortunas vem sendo discutida, como uma possível solução para esse problema; neste contexto de pandemia e crise socioeconômica, é inaceitável a exaltação de uma estética tão contrastante com a realidade atual da maioria, além de estar associada a um grupo elitista, cercado por privilégios e que flerta com a extrema direita. 

O luxo velado durante épocas de crise – econômica, ambiental, guerras, epidemias, entre outras – é mais comum do que se pode imaginar; em entrevista concedida à Frenezi, Gabriel Fusari (@fvsari), jornalista de moda especializado em ramificações político-sociais na indústria da moda. Ele associou a valorização do Old Money, que ocorre no contexto atual, ao período pós Segunda Guerra Mundial, que contou com aquecimento no mercado financeiro, e indaga: “Pode ser que essa estética de ostentação, dentro de um sistema de competição, seja pra ver quem está melhor depois do furacão, sabe?” Mas afirma que o apreço ao luxo em situações de instabilidade é algo constante na sociedade: “Essa supervalorização do luxo é apenas o rico vivendo seu injusto cotidiano, a classe média aspirando um dia viver aquilo, e os pobres percebendo que é incabível. Mas pra estética como um todo, isso não faz muita diferença. Desde sempre ela esteve na Zara e na Tommy Hilfiger”, ele complementa. 

Campanha Publicitária Tommy Hilfiger – Primavera 2011 [Imagem: Reprodução / Pinterest]

Quando questionado sobre qual o principal fator que pode ter desencadeado o interesse da Gen Z pela estética Old Money, Fusari argumenta que trata-se de uma situação complexa, com forte influência midiática e política: 

A moda é uma forma de reflexo de gostos e comportamentos dentro de nossa sociedade. Há alguns anos, com os avanços das discussões sobre acúmulo de riqueza, inclusão e segregação social e principalmente com o avanço do conservadorismo e políticas neoliberais, de alguma maneira, propôs um protagonismo midiático para esses personagens. A gente vê séries como Gossip Girl, The Royals, Sucession… que colocam esses personagens ricos, que vivem de suas heranças e dividendos, em holofotes, isso de alguma maneira acaba incentivando. Esses produtos midiáticos são carismáticos, eles acabam apresentando essa estética que é parte de um universo que dá dinheiro. A indústria da moda acaba aderindo a essas tendências e assim, fica mais fácil de encontrar essas roupas.  E se a gente parar pra pensar onde foi o estopim, acho que é tudo sobre o algoritmo, sabe? Uma coisa leva a outra dentro das redes, fazendo com que as coisas fiquem maiores. A gente via a Lana Del Rey com essa estética, de alguma forma usando para crítica a um comportamento que nos EUA estava crescendo muito. Essa cultura conservadora que é originária do rico, branco, cristão e conservador. Inclusive, muito atrelado à ascensão política de Donald Trump, né? ”.

Os chamados aesthetics, consistem num conjunto de símbolos, cores, estilos, músicas, etc. que refletem desejos e sonhos, mas além de apenas um moodboard, representam e comunicam um estilo de vida que se deseja alcançar ou manter; entender o contexto atrelado a eles, é essencial para evitar frustrações ou a disseminação de princípios conflitantes; neste caso, com o enaltecimento de um aesthetic que remete à riqueza centralizada numa parcela elitista da sociedade, em tempos de insegurança financeira, podemos afirmar que “a crise também é estética”

Gabriel Fusari reitera que a utilização de uma estética pode ter diversos significados, a depender da compreensão de cada indivíduo: “Tem gente que veste aquelas roupas e tem total comportamento conservador, elitista e versado a pautas de austeridade. Mas também tem aqueles que só reproduzem a estética por onda, por apreço a estética (muitas vezes, construído por um elitismo social estrutural em algum grau). Tem quem segue essa trend só como a “trend de Gossip Girl no TikTok”, tem quem sabe que é Old Money, tem quem (como eu, até alguns dias atrás) conhecia ela como Preppy ou WASP mesmo, tem quem também acha que é só o estilo que aprendeu na família”.

Outra discussão levantada a partir do polêmico Old Money, é acerca do consumo consciente, visto que é caracterizado por um estilo atemporal, prezando pela qualidade das peças e seus materiais, mas que acaba invalidando a desigualdade social, seja pela estética segregacionista em si, ou mesmo pela fragilidade econômica que abrange grande parte da população, que acaba recorrendo ao fast fashion como única saída. Gabriel Fusari rebate:

 “Qual a certeza que esse estilo tem origem de brechó ou de “herança”, que seja? O estilo pode ter uma estética sustentável, mas quem consome isso como estilo de vida é uma quantidade muito pequena de pessoas, que tem isso desde sempre, passado de mãe pra filha e por aí em diante. As pessoas que hoje fazem a estética Old Money acontecer, são da classe média, que se acha rica e usa do Old Money como um certificado de autenticidade de riqueza, ou a classe média que compra na Zara e faz disso apenas uma estética do momento, futuramente comprando outro estilo, outra estética, e por aí vai. A classe média muda de estilo visual como se troca de roupa (rs). O deslumbre dela faz com que ela consuma o mercado. Ela não vai seguir aquele estilo pra sempre e vai manter essas peças… Se hoje elas são Old Money, amanhã podem ser Hipster futurista, Gótico trevoso…”.

Moodboard Old Money Aesthetic [Imagens para a colagem retiradas do Pinterest]

Apesar de viver um momento em que se tem liberdade de passear por diversos estilos, é necessário entender como estes foram criados, para qual finalidade e o que eles expressam; em geral, essa percepção pode nos auxiliar na compreensão da sociedade como um todo, de forma a assimilar como somos influenciados e como podemos influenciar, nos diversos aspectos; desvendando assim, o porquê dos nossos desejos de consumo e o que há por trás deles.  

A moda é um ótimo recurso para a comunicação visual, mas quando descontextualizada, pode reproduzir uma ideia extremamente contrária aos nossos princípios, como é o caso dessa geração, que desenvolveu apreço acerca de um contexto social, que ela mesma critica; ignorou o Old Money como uma problemática socioeconômica, sem relacioná-lo com uma cultura conservadora e segregacionista, conflitando com seu discurso.

A transição da estética Tom Ford da moda para o cinema

Tom Ford começou a construir sua estética nos anos de 1970. Nascido em 1961, no Texas (EUA), o estilista e diretor se mudou para Nova Iorque em 1979 para estudar história da arte na NYU. Durante essa época, Ford participava ativamente do cenário social nova-iorquino — basicamente estava na localidade certa e no momento certo para conhecer a vida noturna que se tornou histórica quando se trata de festas.

Mais precisamente, o artista frequentava o icônico Studio 54; clube que ficou conhecido por seus convidados extremamente famosos. Todo mundo que era alguém nos anos de 1970 e 1980 frequentou a boate. Tom se encontrava com os mais conhecidos nomes do momento: Andy Warhol, Bianca Jagger, Halston e Jerry Hall. Foi ali, sob as luzes pulsantes, o chão suado, a multidão da pista de dança e a névoa de fumaça dos cigarros dos convidados que surgiu a base da estética Tom Ford: algo sexy, ousado, com silhuetas dos anos de 1960, 1970 e até mesmo 1980 (vide sua coleção mais recente de Primavera/Verão 2022).

Mas ele nunca foi apenas um designer. Em 1980 Ford largou a faculdade em Nova Iorque para focar na sua carreira como ator em Los Angeles. Seus anos atuando em comerciais fizeram com que sua paixão por cinematografia se desenvolvesse.

GUCCI DE TOM FORD

Campanha publicitária da coleção Primavera/Verão 2003 da Gucci. [Imagem: Mario Testino/ Reprodução]

Os aficionados por moda sabem que foi Tom Ford que reviveu a grande casa Gucci. Nos anos de 1990 a marca passava por crises: o nome estava manchado pelos dramas familiares, o assassinato de Maurizio Gucci, e o desmantelamento da dinastia ao passo que os integrantes da família vendiam suas partes da empresa.

Ford assumiu o volante com pouquíssima experiência. Foi chamado para sua primeira coleção de moda feminina na maison em 1990, e antes disso havia atuado apenas como assistente de design para a estilista norte-americana Cathy Hardwick. Parte do motivo por trás de sua contratação foi, sem dúvidas, que ninguém queria trabalhar na marca. Até 1994 já tinha quase todo o controle criativo em mãos — desde a criação das roupas até o marketing e o design de lojas (ele cursou arquitetura por alguns anos na Parsons School of Design em Nova Iorque).

Tom Ford revolucionou não só a grife como também a moda da década. Deixa clara a sua visão criativa na coleção de Outono/Inverno 1995 com silhuetas acentuadas, diferentes das sem forma comuns na época; decotes fundos; cortes que remetem aos anos de 1970; cores ousadas e ricas; texturas e veludo — isso sem esquecer a identidade da marca. Basicamente: a sensualidade dominava a passarela. As modelos usavam olhos esfumados, cabelos selvagens à la pós sexo e até o caminhar era sexy e provocativo.

Sem surpresa alguma, a coleção levou ao apoio de um dos maiores sex symbols da década (e talvez da história): Madonna. A cantora usou a camisa de seda azul, peça icônica trajada por Kate Moss no desfile, para o VMAs daquele ano.

Esquerda: Madonna usando Gucci no VMAs, 1995. Direita: Kate Moss desfilando para a Gucci FW95. [Imagens: Reprodução/ Pinterest]

O sucesso da Gucci de Tom Ford se deu justamente no apelo sexual, algo extremamente ousado e pouco visto no cenário da moda até então. Tudo em sua era gritava “sexo”, desde as roupas até a trilha sonora dos desfiles e as campanhas publicitárias — afinal, foi ele quem colocou modelos na passarela com calcinhas e cuecas fio dentais na coleção de Primavera/Verão 1997.

As campanhas de marketing carregam tanto peso quanto suas coleções e são até hoje lembradas por profissionais e amantes da moda como uma das melhores da história da casa. Em sua maioria carregam, novamente, o teor sexual pesado e marcante da época. Mas além disso, carregam um fator que se repete também em inúmeras coleções do designer: uma coloração azulada, saturada e escura. Uma paleta que remete o consumidor instantaneamente a algo selvagem.

Campanhas publicitárias da Gucci na era Tom Ford. [Imagens: Reprodução/ Pinterest]

Seu estilo ficou marcado pelo seu tempo de festa no Studio 54 e todas as coisas que vieram com ele. A estética hipersexualizada, no entanto, é hoje questionada por profissionais e amantes de moda ao mesmo tempo que sua importância é reconhecida para o crescimento e estabelecimento da marca e do designer no mercado. Os questionamentos vêm em uma perspectiva da mensagem passada pelas roupas e campanhas: a hiperssexualização sem fundamento e sem mensagem é o jeito mais prudente de vender roupas, principalmente quando o objeto de desejo em tais campanhas são, em sua maioria, mulheres?

O assunto de hiperssexualidade vem crescendo com a pandemia: depois de anos trancados em casa, o retorno das estética ligadas à exposição e glorificação do corpo se mostrou forte na temporada de Primavera/Verão 2022 no hemisfério norte. A conversa levanta também o ponto de inclusão de diferentes tipos de corpos na criação da fantasia, coisa que jamais seria pensada nos anos de 1990 quando Tom Ford estava na Gucci.

TOM FORD NA YSL

Looks de desfiles da Saint Laurent assinados por Tom Ford. [Imagem: Arquivos Vogue]

Durante seu tempo na gigante italiana, o Gucci Group adquiriu a maison francesa Yves Saint Laurent (atualmente apenas Saint Laurent). Em 1999, nomeou Tom Ford como diretor criativo da casa. A posição se deu, em grande parte, por motivos financeiros já que entre 1995 e 1996 Gucci, sob a direção criativa do designer, aumentou suas vendas em 90%. A esperança para YSL era a mesma.

No entanto, com seu fundador ainda vivo e parte da empresa, a meta se tornou um pouco mais complicada. Ford levou a sensualidade para a maison francesa, um toque risqué tendo em vista o estilo parisiense e o antigo trabalho de Saint Laurent para a marca.

Seu legado, porém, prevaleceu e mudou o rumo da estética YSL para sempre. As peças com transparência, decotes profundos e campanhas provocadoras não foram esquecidas ou ignoradas por seus sucessores Hedi Slimane ou Anthony Vaccarello que hoje a interpretam (junto ao próprio DNA estabelecido pelo fundador) a partir de suas próprias perspectivas.

O romantismo da casa nunca foi esquecido pelo estilista. Ford tinha a capacidade incontestável de mesclar a sua própria visão com elementos típicos da marca, e apesar do seu tempo (ele atuou como diretor criativo até 2004) na maison ser por vezes esquecido, também colaborou na formação e estabelecimento da sua forte estética.

TOM FORD, A MARCA AUTORAL

Campanha publicitária para Tom Ford. [Imagem: Reprodução/ Pinterest]

De toda forma, essa estética sexual e ousada foi levada para sua marca homônima, fundada em 2005. O designer deixou a gigante italiana em 2004 por conta de supostas desavenças como conglomerado Kering (antiga PPR) que possuía uma quantidade de ações significativa do Gucci Group.

Sua primeira coleção, Primavera/Verão 2011, carregou muitos dos elementos já vistos na Gucci, mas desta vez ainda mais fortes: as silhuetas, o glamour e estilo dos anos de 1970, as cores ricas, as estampas sensuais — tudo que faz parte do esperado DNA Tom Ford.

Nos 16 anos de marca, o sex appeal se manteve presente em cada corte, textura, cor, decote, tecido, acessório, maquiagem e até fragrância. O designer fez com que ao ser ouvido o nome “Tom Ford”, “sensualidade” seja a primeira coisa que vem à mente. Construiu uma identidade forte que liga suas criações com essa estética particular que o define.

Desfiles da marca Tom Ford. [Imagens: Vogue Runway]

Seu tempo em festas no Studio 54 junto à todas as suas outras paixões inevitavelmente resultaram em algo brilhante, particular e identificável. Não são apenas as roupas sensuais com traços dos anos de 1970 que remetem à festa. É Tom Ford.

Mais uma vez leva essa característica marcante para o lado publicitário da marca, ainda flertando com o estilo de paleta apresentado em seu tempo na Gucci: o azul, o saturado, o escuro. Por conta da década, as insinuações sexuais não tão explícitas ou pesadas, mas continuam presente. 

Campanhas publicitárias para Tom Ford. [Imagens: Reprodução/ Pinterest]

TOM FORD NO CINEMA: DIREITO DE AMAR

Sua saída da marca italiana significou o começo de grandes coisas, inclusive a sua concretização da sua paixão pelo audiovisual. Em 2005 anunciou o lançamento da sua produtora, a ‘Fade to Black’.

Não levou muito tempo até a estreia de seu primeiro filme Direito de Amar (2009) que conta com os nomes de Colin Firth, Julianne Moore e Nicholas Hoult. O primeiro longa de Ford obteve certo sucesso entre críticos e o público em geral. No Rotten Tomatoes — site de avaliação de cinema —, a produção recebe 86% dos críticos e 81% da audiência.

Não surpreendentemente, muitas das críticas (boas ou ruins) giram em torno do visual do filme. Seja a avaliação de Matthew Lucas do site The Dispatch, que diz “Pode muito bem marcar o debut de um ótimo stylist visual, mesmo que o filme, no final das contas, não alcance as expectativas” até a crítica de Simon Miraudo, que afirma que “O filme debut de Tom Ford como diretor, Direito de Amar, é simplesmente deslumbrante. Desde a gloriosa cinematografia até os atores e atrizes incrivelmente belos; nenhuma cena é gasta em nada remotamente feio”.

A cinematografia encantadora logo evidencia o talento do diretor para as artes visuais, no entanto sua estética típica não é tão marcante. Ford apresenta um filme com uma coloração apaixonante e romântica, cores quentes, suaves e delicadas que refletem a melancolia marcada pelo roteiro. Não há nada menos do que o belo na tela de Tom Ford.

Direito de Amar carrega uma fotografia digna de pastas no Pinterest e publicações virais em redes sociais — coisa que de fato ocorre com certa frequência. O fato é que a beleza no cinema Tom Ford não é vazia: tudo em tela (ângulos, colorações, luzes, ambientes, roupas, atores) reforça a história passada. A melancolia é transmitida não só por palavras e expressões como também por enquadramentos e cores.

Cenas de Direito de Amar. [Imagens: Reprodução]

O SUCESSO DE ANIMAIS NOTURNOS

Depois de quase uma década, Tom Ford retorna às telonas com um filme de também grande sucesso: Animais Noturnos (2016). A trama segue o mesmo ar de melancolia e drama do primeiro, com visuais que complementam a narrativa estabelecida pelo roteiro de forma envolvente.

Um dos elementos chaves do filme que marcou a estética Tom Ford no cinema foram as cores, tons que marcaram seu tempo na Gucci e marcam até hoje sua marca autoral: tons ricos e profundos de verde, azul, vermelho e branco. 

A intimidade em Animais Noturnos, no entanto, não vem por meio da sexualidade presente tão constantemente nas campanhas publicitárias do diretor, mas por um jogo de coloração e iluminação capaz de transparecer os sentimentos dos personagens. O filme é, sem dúvidas, belo — desde os atores até os figurinos e a cinematografia.

Mais uma vez, ao observar as críticas do longa no Rotten Tomatoes, o visual é unanimemente elogiado, seja a avaliação boa ou ruim. O que certifica, mais uma vez, Ford como um diretor fundamentalmente visual, acompanhado de ótimas performances e roteiro igualmente envolvente, mas marcado pelas cores e luzes.

Cenas de Animais Noturnos. [Imagens: Reprodução]

Diferente de seus contemporâneos como Wes Anderson, que tem seu estilo marcado por cores alegres e vibrantes, Ford é lembrado pelos tons fechados, íntimos, ainda vibrantes mas de forma mais profunda, cores capazes de contar toda a narrativa sem nenhuma outra palavra.

A capacidade de narrar a história pelo visual marca Tom Ford como um verdadeiro artista. Seu trabalho na moda, sua paixão pelo cinema e seu passado em publicidade se combinam em uma receita formidável que resulta nos fins comerciais e artísticos de tudo criado por Ford.